Quando se pensa em engenharia, uma obra de qualidade é aquela estruturalmente potente e firme, capaz de resistir aos efeitos do tempo. Esse critério bastaria para qualificar o engenheiro preto André Rebouças (1838-1898) porquê um dos nomes mais importantes do país.
Mas a obra dele vai além de pontes, docas, estradas de ferro e sistemas hídricos. Ele se destacou porquê um intelectual crítico, libertador, que viajou pelo mundo colhendo experiências em sociedades segregadas e projetou um Brasil onde todos pudessem ser iguais, sem distinções raciais.
O currículo credenciou André Rebouças a ser reconhecido oficialmente nesta semana porquê um “herói da pátria”, o que lhe garantirá um espaço no livro que reúne as principais personalidades do país.
Historiadores ouvidos pela reportagem da Sucursal Brasil celebraram a inclusão de Rebouças no documento. Em primeiro lugar, por entenderem que o engenheiro precisa ser mais espargido no Brasil. Em segundo, por um resgate e revisão de sua memória, escopo de críticas por ter bravo Dom Pedro II.
“Embora seja um reconhecimento tardio, essa inclusão no livro de heróis vem emendar a imagem de André Rebouças porquê um monarquista que desistiu do país e fez um autoexílio, ao transpor junto com a família imperial no termo do Segundo Reinado. Ele sai por entender que a República nasce de um movimento revanchista, de uma escol escravocrata, que não aceitou o termo da escravidão sem indenização no Brasil. E a gente teve desdobramentos muito ruins para a projeção dessa figura histórica. Tenho certeza que ajuda, em segmento a emendar isso. Existe ainda todo um trabalho a ser feito de recuperação dessa memória”, avalia Antonio Carlos Higino da Silva, historiador e responsável dos livros André Rebouças no Divã de Frantz Fanon.
“A inclusão dele no livro é um traje muito importante, porque durante muito tempo o documento só tinha a presença de heróis brancos e excluía outros grupos sociais, porquê negros, indígenas e mulheres. E é um passo importante nesse processo de revisão histórica, em que aqueles antes excluídos ou apresentados porquê passivos ou coadjuvantes da história do Brasil, agora são vistos porquê protagonistas e agentes históricos potentes de transformação dos 500 anos de história do nosso país”, diz o historiador Jorge Santana, professor do Instituto Federalista do Paraná.
Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria
O primeiro passo é entender do que se trata o Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. Ele foi criado em 1992 e reúne personalidades do tidas porquê “protagonistas da liberdade e da democracia”, por terem devotado segmento da vida ao país. A obra também é conhecida com Livro de Aço, por ser feita com páginas desse material, e fica no Panteão da Pátria, na Rossio dos Três Poderes, em Brasília.
A matrícula de um novo personagem depende de lei aprovada no Congresso. Entre os heróis e heroínas brasileiros, estão Tiradentes, Anita Garibaldi, Chico Mendes, Zumbi dos Palmares, Machado de Assis, Santos Dumont, Luís Gama e Joaquim Nabuco.
A Lei nº 15.003 , que oficializa a homenagem a André Rebouças, foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e publicada nesta quinta-feira, 17 de outubro, no Quotidiano Solene da União. As ministras Macaé Evaristo (Direitos Humanos) e Anielle Franco (Paridade Racial), além do ministro Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) também assinam a medida.
Biografia de Rebouças
André Pinto Rebouças nasceu no município de Cascata, na Bahia, em 3 de janeiro de 1838. Era fruto de Antônio Pereira Rebouças e Carolina Pinto Rebouças. O pai, fruto de ex-escravizada e de um varão branco, foi um jurisconsulto autodidata, deputado pela província da Bahia e mentor do imperador Dom Pedro I.
A família Rebouças veio para o Rio de Janeiro em 1846. André e o irmão Antônio, aos 15 e 16 anos, ingressaram na Escola Militar (precursora da Escola Politécnica) e formaram-se engenheiros militares em 1860. Depois de uma viagem pela Europa, (1861-1862) voltaram ao Brasil em 1863 e ficaram responsáveis por reformas nas fortalezas de Santos até Santa Catarina. Em 1864, André projetou o novo porto do Maranhão.
André participou da Guerra do Paraguai, entre 1865 e 1866, no batalhão dos engenheiros e retornou ao Rio de Janeiro por motivo de saúde. Participou das obras do porto da cidade, foi diretor das obras das novas Docas da Alfândega (na atual terreiro XV) e responsável pela construção das Docas de Pedro II (ao lado do Cais do Valongo).
“Esse arrecadação é uma grande manancial de inspiração e deve ser pensado porquê referência de resistência negra. O projeto é todo pensado pelo André Rebouças, em que ele se esforçou em não ter mão de obra escravizada, em constituir proteção social para os seus trabalhadores. Rebouças foi ao encontro de um projeto moderno, de um porto industrial, trazendo referências de um engajamento político e social importante”, diz o historiador Antonio Carlos Higino.
Rebouças nunca foi escravizado, pertencia a uma classe média negra e era protegido por uma rede de amigos poderosos, porquê a própria família imperial. Talvez isso explique um pouco o porquê de ter demorado a se colocar publicamente porquê um varão preto e libertador. Isso começou a mudar a partir da dez de 1870. As viagens para a Europa e para os Estados Unidos, onde presenciou exemplos mais visíveis de discriminação e apartheid racial, foram fundamentais para impactar os projetos políticos e a subjetividade de Rebouças.
Na dez de 1880, passa a atuar ativamente no Brasil em projetos contra a escravidão. Foi um dos criadores da Sociedade Brasileira contra a Escravidão, junto com Joaquim Nabuco e José do Patrocínio, em 1880. E participou da Confederação Libertador (1883) e da Sociedade Médio de Imigração (1883).
“Os mais sanhudos escravocratas confessam hoje publicamente: — a escravidão é um cancro. Já não há mais quem ouse negar que a escravidão é a gangrena vernáculo; que é a motivo primária de todas as misérias e vergonhas que afligem levante poderio; que é o tropeço supremo à imigração, ao progresso da agricultora, da indústria e do negócio no Brasil”, escreveu Rebouças no texto de exórdio do panfleto “Supressão immediata e sem indemnisação”, publicado em 1883.
Monarquista, por considerar que o republicanismo brasílio era liderado por antigos senhores de escravizados, Rebouças partiu para o exílio em 1889 junto com a família imperial. Depois da morte de Dom Pedro II em 1891, partiu para a África, para trabalhar e ajudar no desenvolvimento do continente. Foi nesse período que Rebouças passou a ver a África porquê “terreno de origem” e a se declarar porquê varão preto, meio brasílio e meio africano. Mas decepcionou-se com as dificuldades encontradas, porquê a pobreza decorrente da exploração de nações europeias. Morreu em Funchal, Portugal, em 9 de maio de 1898, em circunstâncias incertas, tendo sido encontrado no pé de um precipício, aos 60 anos.
Porquê legado para a veras social dos negros pelo mundo, deixou textos e análises críticas, focados na construção de um país mais igualitário.
“O André Rebouças apontava porquê principal preocupação o 14 de Maio, ou seja, o dia seguinte à extinção. O que teria de ser feito, porquê a distribuição de terras, uma reforma agrária, para que os ex-escravizados pudessem ter um meio de sustento, de sobrevivência, e pudessem ser integrados à vida econômica do país”, diz o historiador Jorge Santana.
“Ao termo movimento libertador e a libertação dos escravizados, André Rebouças propôs para o orçamento do ano de 1890 um aporte, segmento dos recursos de orçamento, para investimento nas pessoas libertas. Ele pensou o Brasil do horizonte, da proteção social, escolarização, estradas, portos, tudo que poderia esse país um lugar moderno e melhor. Ele é uma grande referência para os que querem um Brasil melhor e mais unificado”, diz o historiador Antonio Carlos Higino.