Antes de inaugurar o filme, um senhor aparece na tela e agradece a presença de todos. Quem seria? Um tempo depois, reconheço Tom Cruise. Mas há um pouco dissemelhante nesse rosto em primeiro projecto —está envelhecido. Esta é a primeira e quase a última surpresa da projeção de “Missão Impossível – O Acerto Final”.
Desta vez não há organizações secretas, nem países, nem zero. A humanidade inteira está ameaçada por um pouco que se labareda a Entidade. O agente Ethan Hunt —Cruise, justamente— é chamado a ser o nosso salvador. Mas antes é bom o pessoal na tela e na plateia saber de que inimigo se trata.
Em linhas gerais dá para depreender que ela é a web, a internet, uma lucidez sintético. Se a Entidade vencer, ela controlará tudo, dirá o que é real ou não, definirá o que é verdade ou peta. Se a humanidade não se puser de joelhos, ela vai explodir o mundo. E a única pessoa capaz de nos salvar é Ethan, com a colaboração de sua equipe, simples.
A Entidade é abstrata, mas, por trás dela, podemos ver os rostos de Elon Musk e mais alguns magnatas do mundo do dedo. A menção é evidente demais para ser ignorada. Não são caras logo que se lixam caso a humanidade acabe, desde que sobre uma novidade Boceta de Noé, em outro planeta ou na Lua, onde eles sobrevivam?
A Entidade tem ideias mais ou menos parecidas. E tem uma face visível na pessoa de Gabriel, papel de Esai Morales, vetusto desafeto de Ethan.
O que vem a seguir é um trajectória montanhoso e longo, onde um “MacGuffin” –porquê dizia Hitchcock, é um pouco que funciona porquê pretexto da ação num filme– substitui outro “MacGuffin”. Podemos estar em correria automobilística, em túneis prestes a explodir, em celas que parecem saídas de um romance de Alexandre Dumas, onde for, parece que Ethan e sua turma, a cada vez, precisam encontrar, desenvolver ou utilizar qualquer talento mirabolante antes que o indefectível relógio marque a hora inevitável.
Até aí estamos dentro das regras dos seriados de façanha. O entediado no filme são os exaustivos diálogos para explicar cada coisa, cada ação, cada novo risco ou cada sigilo mirabolante que se esconde em um submarino submerso há mais de dezena. É uma burocracia da explicação de coisas que não chegamos a entender ou, de todo modo, não conseguiremos lembrar.
A sonolência de vez em quando vai embora, substituída por momentos em que bons efeitos dão o tom. A ação, eventualmente, desperta o interesse, porquê aquela em que Ethan precisa submergir nas águas gélidas do Ártico a término de, com uma chave, conseguir furar um pouco que o leva ao próximo “MacGuffin”.
Ethan leva os seus equipamentos, mas tem de furar mão deles para cruzar um tubo estreito. Ele fica só com uma sunga nos incontáveis graus negativos da chuva. Resiste, todavia, consegue subir e subir, mas nunca chega à luz. O filme logo permite-se uma elipse e já o encontramos em terreno, desacordado, com a sua leal Grace, vivida por Hayley Atwell, lhe aplicando respiração sintético.
Dito assim, parece coisa meio ridícula, mas não —podemos partilhar, por exemplo, a falta de ar, a angústia de prender a respiração na tentativa de chegar à superfície, o esforço descomunal da personagem para manter-se consciente. A sequência é muito armada.
Tem, no entanto, um defeito que permeia todo o filme: o heroísmo é tão heroico que Ethan já não lembra mais um herói, e sim um super-herói, um Super-Varão capaz de enfrentar as mais terríveis maquinações do vilão. É esperável que o herói passe por situações perigosas e sobreviva, mas Ethan está passando dos limites.
Há outros momentos semelhantes, porquê a sequência de duelo aeronáutico, em que Ethan se envolve com Gabriel, o vilão. Ambos usam aviões do tempo da Primeira Guerra. Pode-se perguntar por que recordar essas velharias, mas a licença poética é simpática. Nesse momento, Cruise recebe toneladas de ar no rosto e ainda assim consegue prodígios de que só o Varão-Aranha seria capaz.
Com esse espírito é que a franquia chega a seu oitavo filme. Originalmente, era um seriado de televisão para adolescentes. Os primeiros filmes deram uma recauchutada nas situações e nos personagens: havia perfídia, traição, espionagem.
Agora, zero disso. A Entidade é poderosa, com uma ameaço hiperbólica demais. Também nisso “O Acerto Final” lembra o espírito dos seriados dos anos 1930, que eram dirigidos a crianças e adolescentes. Muito, eis um pouco que a humanidade continua a produzir: crianças e adolescentes a quem esse tipo de façanha possa encantar. Nesse sentido, a boa produção ajuda.