'o Skate é Espiritual, é Expressão', Diz Bob Burnquist

‘O skate é espiritual, é expressão’, diz Bob Burnquist – 19/10/2024 – Esporte

Esporte

Depois a conquista da medalha de bronze na modalidade street do skate nos Jogos Olímpicos de Paris, a brasileira Rayssa Leal expressou o libido de explorar a capital francesa para se divertir em procura de obstáculos não convencionais, diferentes daqueles milimetricamente pensados e espalhados pela pista montada para o evento esportivo.

A jovem da pequena cidade de Imperatriz, no Maranhão, dava ali uma clara prova da origem da cultura do skateboarding.

Se hoje é uma das modalidades mais badaladas das Olimpíadas, o skate carrega desde sua origem aspectos mais tradicionais relacionados à prática uma vez que a transgressão, a forma de se vestir, o estilo músico e a camaradagem.

Para Bob Burnquist, 48, maior ícone do skate no Brasil, mais do que as competições e o estrelato, há uma relação com o esporte que chega ao nível místico.

“Quando você sai do holofote e vai para a cultura do skate, é um estilo de vida, é uma evolução. Pelo menos a minha visão é muito mais místico, artística, do que competitiva”, disse Burnquist à Folha.

Nascido no Rio de Janeiro e criado em São Paulo, ele ganhou recentemente uma série documental da HBO na plataforma Max, dividida em quatro episódios, que traça um quadro de sua vida desde as primeiras descidas em uma pista de skate perto da morada da família na zona setentrião da capital paulista até o sucesso estrondoso obtido no exterior com performances que entraram na história e o fizeram personagem de videogame.

Burnquist afirma que as competições e as vitórias tiveram um papel importante para a curso que construiu, mas enfatiza que elas representam uma secção menor dentro de sua vida em cima do skate. Para ele, antes de tudo, trata-se de uma forma de sentença.

Você vivenciou o skate desde a tempo em que era reprimido pela polícia em São Paulo, tornou-se um dos grandes nomes do esporte e o viu chegar até os Jogos Olímpicos. Porquê foi seguir toda essa trajetória da modalidade nas últimas décadas? Eu vejo o tamanho que o skate alcançou agora e penso: “Eu já sabia, é permitido mesmo, eu sempre soube, vocês é que estavam demorando para desenredar” [risos]. É óbvio que dá orgulho ver aonde o skate chegou. E, ao mesmo tempo, de certa maneira, a gente continua tendo que percorrer da polícia, se vai andejar em um lugar em que não pode.

Ver chegar a levante ponto é bom porque traz oportunidade. Pistas são construídas, o mercado cresce, patrocinadores entram. Em paralelo a isso, penso que também é importante manter a origem do skate, continuarem os eventos culturais, as interações que são nossas, os formatos de competições diferentes do olímpico. Temos que pensar no que mais tem para fazer no lado cultural, no progresso técnico do skate, acho que é isso que é bacana de percorrer detrás.

Tivemos nos Jogos de Paris o Andy Macdonald competindo pela Grã-Bretanha no skate park aos 51 anos, que será sua idade em Los Angeles-2028. Você nutre qualquer libido de participar de uma edição olímpica? Enquanto presidente da CBSk [Confederação Brasileira de Skateboarding, entre 2017 e 2019], tentei ajudar detrás das câmeras para a galera poder competir e o investimento ir para a confederação correta. Enxergo dessa forma minha participação olímpica. Quando vejo os brasileiros competindo e ganhando medalhas, sinto que eu estou lá, porque sei o quanto de trabalho foi realizado para chegarmos aonde estamos.

Agora, se eu fosse para uma Olimpíada, manteria uma intenção competitiva, não iria unicamente para participar. Se for, vou para lucrar, e daí entro em outro modo. Mas eu não tenho essa vontade, essa anseio de falar: “Queria tanto, é um sonho de rapaz poder competir na Olimpíada”. Não é. Se eu fosse do atletismo ou da ginástica, provavelmente gostaria de participar. Se eu estivesse nesse mundo, a Olimpíada seria um setentrião. Mas, no skate, a Olimpíada nunca foi um setentrião. Era quase um sul [risos].

Entendo que, no skate, não é o meu país contra o seu país. Nunca foi. Vejo o skate uma vez que o meu jeito de andejar contra o seu jeito de andejar. É quase uma vez que você pintar em uma competição. Não tem uma vez que falar que um quadro é mais bonito. Quando você sai ali do holofote e vai para a cultura do skate, é um estilo de vida, é uma evolução. Pelo menos a minha visão é muito mais místico, artística, do que competitiva. Apesar de eu já ter ganhado muitos eventos, nunca senti que a competição era a razão de fazer o que eu faço.

Porquê você classificaria sua relação com o skate? O skate é místico para mim, é uma forma de sentença artística, dentro de uma trajetória de um ser humano que está aprendendo, e com a escolha do skate para ter uma forma de sentença. Quando consigo atingir uma manobra novidade, se é alguma coisa que ninguém nunca fez, é uma forma de sintoma, e sei quanto isso é permitido, quanto é importante e inspirador, quanto me faz querer aprender mais. Nos eventos em que entrava, participava pela glória e por ser a sintoma de uma habilidade humana, de poder falar: “É provável fazer isto”. Para mim, é mais pela inspiração, pelo que você é capaz de fazer e uma vez que pode tocar as pessoas do que para lucrar moeda.

Porquê conciliava esse lado mais místico com as competições e os eventos com patrocinadores? Quando estava em qualquer compromisso profissional, era: “Agora estou colocando um terno e vou andejar de skate porque tenho que andejar, está no meu contrato, e vou lá e faço o que tenho que fazer dando o sumo da minha pujança”. Mas o que me move é o depois, é no quintal de morada sozinho, filmando, pensando em manobras, construindo obstáculos.

A série aborda um momento em sua curso na qual você opta por não assinar um contrato com uma grande marca dos Estados Unidos. Houve qualquer remorso? Muito pelo contrário. Quando você gasta seu moeda e compra um negócio ruim, está demandando uma indústria ruim. Mas, se começa a fazer um consumo consciente, você demanda mercado, direciona e mais pessoas conseguem consumir conscientemente. É importante que os skatistas prestem atenção no mercado do skate e comprem e deem esteio a lojas e marcas que são, de vestimenta, do meio. Isso foi o primórdio desse mundo de fora entrando, com uma galera que não tinha zero a ver com a gente, uns grafites neons nas pistas, tudo falso [risos]. E a gente não se identificava. Logo, tinha a responsabilidade de proteger o que era nosso.

Porquê você acompanha os brasileiros bastante jovens se destacando em competições internacionais, incluindo as Olimpíadas? Acho muito permitido, é demais. Mas acho que tem uma pressão muito maior do que na minha estação, que não sei quanto é saudável, sendo atletas tão jovens. Eu mesmo me tornei profissional aos 14 anos e, depois de lucrar um campeonato, fiquei superconfiante. No seguinte, terminei em oitavo, tanta a pressão. Imagina se fosse hoje, a atenção seria trocentas vezes maior, e acho que essa interação via rede social cria um contato mais direto, que, às vezes, pode não ser tão saudável, é um bombardeio.

Isso traz um propagação da mentalidade de que é preciso vencer. E é preciso entender que vencer não é tudo. Que também é preciso se manifestar da sua maneira, dar sequência à cultura do skate, à tradição de andejar na rua, mesmo tendo pista para andejar. Não é só sobre um ciclo competitivo, é uma sintoma artística.


Relâmpago-X

Bob Burnquist, 48

Proveniente do Rio de Janeiro e criado em São Paulo, é um nome histórico do skate mundial. Profissional na modalidade vertical, é o maior vencedor dos tradicionais X-Games, nos Estados Unidos, com 30 medalhas. Foi presidente da CBSk (Confederação Brasileira de Skate) de 2017 a 2019

Folha

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