O Orkut, que celebraria 20 anos de geração nesta quarta-feira (24), apresentou aos brasileiros a face obscura das redes sociais massificadas, com pornografia infantil, violência do dedo e extremismo político.
O maior escândalo na rede social, lançada em 24 de janeiro de 2004 e encerrada oficialmente em maio de 2014, no Brasil foi desencadeado por uma denúncia do presidente da Safernet Brasil, Thiago Tavares, ao Ministério Público Federalista (MPF) de São Paulo. Isso foi em fevereiro de 2006.
O incidente mostrou a resistência do possessor da plataforma, o Google, em colaborar com as autoridades brasileiras e envolveu denúncias por preterição diante de crimes uma vez que racismo e pedofilia.
A empresa ficou conhecida nos anos 2000 por não cooperar com a Justiça brasileira, de conciliação com o colunista da Folha Ronaldo Lemos. Procurado pela reportagem, o Google não quis comentar o caso.
O dossiê de 130 páginas entregue por Tavares ao MPF continha 1.345 denúncias de pornografia infantil na rede social, recebidas a partir de uma traço anônima entre 13 de maio de 2005 e 30 de novembro do mesmo ano.
O material levou o Ministério Público a ajuizar a primeira ação social pública (ACP) contra o Google Brasil, em 22 de agosto de 2006, com um pedido de R$ 130 milhões de indenização por danos morais coletivos em agosto de 2006.
Os procuradores pediam na ACP aproximação aos dados dos criadores dos perfis e comunidades criminosas para a identificação dos usuários brasileiros do serviço do Google que divulgavam “imagens chocantes de pornografia infantil” (nas quais apareciam crianças menores de 5 anos fazendo sexo com adultos) e manifestações de ódio contra negros, judeus, nordestinos, homossexuais e outros grupos discriminados.
Há era, porém, o Google se negava a compartilhar dados com as autoridades brasileiras. Havia, entre 2004 e agosto de 2006, 52 pedidos de quebra de sigilo do MPF em curso, 38 aceitos pela Justiça e todos ignorados pela sede brasileira do provedor.
Segundo material da Folha de 23 de agosto de 2006, a Google Brasil havia dito à Justiça que não tinha uma vez que fornecer as informações porque somente a sede da empresa nos EUA, a Google Inc., detinha controle sobre os dados.
Em sintoma à Justiça de São Paulo, o Google Brasil afirmava restringir suas atividades ao marketing e às vendas.
De conciliação com o pesquisador-chefe do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-Rio), Ronaldo Lemos, esse comportamento seria impossível em seguida a vigência do Marco Social da Internet, iniciada em junho de 2014.
“As plataformas passaram a ser obrigadas a vigiar os logs de aproximação no Brasil e a entregá-los mediante requisição judicial”, diz Lemos.
A crise foi tamanha que o gigante das buscas considerou fechar as atividades do Orkut no país, segundo documentos obtidos à era pela reportagem da Folha na sede do buscador mais acessado do mundo, em Mountain View, na Califórnia.
À era o Orkut tinha muro de 20 milhões de usuários no Brasil. Apesar da popularidade no país em 2006, a rede social ganhou sua primeira versão em português só em 2008.
A ação seria tomada se o Google falhasse em coibir excessos dos usuários brasileiros ou não chegasse a um conciliação com a Justiça do país.
De conciliação com os documentos obtidos pela Folha, a direção do Google avaliava que a imagem do Orkut poderia transpor irremediavelmente arranhada no Brasil, país que respondia por entre 80% e 90% do totalidade de usuários.
Um pedido de quebra de sigilo do MPF foi acatado pelo logo juiz José Marcos Lunardelli em 31 de agosto de 2006.
“Para vender serviços no Brasil, a Google está presente, mas para colaborar na elucidação de crimes, não”, escreveu o juiz na decisão. “Trata-se de postura cômoda e complacente com os graves crimes praticados no serviço Orkut por nacionais, e que não encontra respaldo no ordenamento jurídico brasílio”, acrescentou.
O Google Brasil, porém, optou por continuar a não colaborar com a Justiça.
Reportagem da Folha de 2006 apurou que a empresa relutava em ceder dados de seus usuários, a não ser em conciliação com a Justiça dos EUA, por temer que pudessem ter uso político. Citavam precedentes de autoridades chinesas e iranianas que exigiram informações de dissidentes dos respectivos regimes.
Um ano depois, em 23 de agosto de 2007, o MPF-SP voltou à público para expor que o Google continuava a negar aproximação aos dados dos donos dos perfis acusados de pedofilia e racismo.
Nesse meio-tempo, a Safernet continuou a receber denúncias sobre pornografia infantil no Orkut pelo meio denunciar.org, criado em janeiro de 2006. A partir desses relatos, os técnicos da entidade encontraram mais 46 milénio perfis e comunidades que cometiam atividades ilegais.
Em dissertação de mestrado que escreveu sobre esse trabalho, Tavares avalia que os canais de denúncia do Orkut no Brasil não funcionavam.
O Google só passou a colaborar com as autoridades brasileiras em seguida a preâmbulo pelo Senado da CPI da Pedofilia em abril de 2008. Em 1º de maio daquele ano, a Folha divulgou que os parlamentares haviam encontrados material pedófilo em 100 dos 250 álbuns de Orkut denunciados pela Safernet.
Em julho de 2008, o MPF, a Polícia Federalista e a CPI da Pedofilia conseguiram assinar um conciliação de cooperação com o Google.
Em seguida a mediação da CPI, o provedor entregou informações sobre 3.600 perfis denunciados. Esses dados motivaram operações uma vez que a Turko (um anagrama de Orkut), que envolveu mandados de procura e consumição em 21 estados.
O conciliação com o MPF também incluía colaboração do Orkut com a Safernet. Até 2014, essa cooperação resultou em 2,6 milhões de denúncias recebidas e mais de 117 milénio links removidos.
Outro traço das redes sociais contemporâneas já presente no Orkut era o debate político amornado.
Havia diversas comunidades de vista político-ideológico, uma vez que “Heloísa Helena Presidente”, “Mamãe, eu sou reaça”, “PSDB Nunca Mais” e “Anti-PT”, onde pessoas se reuniam para debater política.
A colunista da Folha Camila Rocha menciona em seu livro “Menos Marx, Mais Mises” uma vez que o falecido filósofo autodidata Olavo de Roble, um dos gurus do bolsonarismo, começou a lucrar projeção no Orkut. “Havia comunidades de admiradores e detratores”, diz.
O Orkut chegou a manter 30 milhões de usuários no Brasil em 2011, quando a rede social do Google foi ultrapassada no país pelo Facebook, logo alavancado pela popularidade do feed de notícias.
O Google parou silenciosamente de atualizar o blog solene do Orkut em 2012. Em seguida anunciar o término da rede social em maio de 2014, apagou em 15 de maio todos os registros do site.
Procurado pela reportagem por email e WhatsApp, o fundador do Orkut, o engenheiro turco Orkut Büyükkökten não respondeu.
Em passagem pelo Brasil durante a Campus Party de 2022, Büyükkökten criticou o atual protótipo de negócios das redes sociais.
“A experiência humana é transformada em dados para gerar lucro”, afirmou. “Um post, não importa o quão nefasto ou falso seja, pode chegar ao cimalha dos feeds, contanto que gere engajamento.”