“Os Colonos”, longa de estreia do chileno Felipe Gálvez, facilmente remete ao filme “Assassinos da Lua das Flores”, de Martin Scorsese. Não só porque aborda o sinistro do progressão de homens brancos sobre os povos originários, mas pela maneira fria, quase casual, com que retrata a brutalidade do processo de colonização branca na América do Sul no início do século 20.
Dividida em quatro episódios, a história começa em 1901 na herdade de ovelhas de José Menéndez, papel de Alfredo Castro. É um lugar, a cena de lhaneza avisa, onde a vida de um varão vale menos que a de um bicho.
Menéndez é o rei do “ouro branco” —uma vez que é conhecida a pelo produzida por seu imenso rebanho de ovelhas—, a quem foram concedidas terras pelo governo chileno. Ele precisa terebrar caminho até o oceano Atlântico, atravessando uma terreno já ocupada pelos Selk’nam —também conhecidos uma vez que Onas—, que já estavam por ali antes que o quinteiro chegasse.
O rei decide que os nativos devem ser exterminados para que seus negócios possam prosperar. Para executar a tarefa, recruta o tenente e ex-soldado britânico Alexander McLennan, vivido por Mark Stanley e também sabido uma vez que “o porco vermelho”, e Bill, papel de Benjamin Westfall, americano com experiência em expelir nativos e que sente “cheiro de índio” à intervalo. McLennan leva com eles o jovem Segundo, “o mestiço”, papel do ator Camilo Arancibia, possessor de óptimo pontaria.
Eles avançam pelas paisagens da Terreno do Queimada, apresentadas num impecável trabalho de retrato e música, de Simone D’Arcangelo e Harry Allouche, respectivamente. Logo se envolvem em embates com outros colonos e nativos que invariavelmente terminam de forma trágica, revelando o quão moralmente indiferentes são esses saqueadores.
Cândido do racismo casual e mortal de Bill, Segundo é, presumimos, a coisa mais próxima que temos de uma bússola moral nesta paisagem sem lei. Arancibia é uma presença suasivo num papel predominantemente tristonho e reativo.
Gálvez é particularmente feliz em explorar no filme o conflito das masculinidades e a luta de egos dos personagens. O inglês e o americano podem disputar para saber quem manda, mas também são secção subjugada pelo dominante verdadeiro, que é o possessor das terras. Eles também são propriedade. O mestiço é uma propriedade que vale menos.
Vários confrontos entre o trio principal, e do trio com suas vítimas, resumem-se a quem detém quanto poder e qual poder na missão e no território. No encontro com o maligno Coronel Martin —Sam Spruell, em estupenda atuação—, um superior britânico, revela-se o regime subalterno de McLennan na jerarquia imperialista e ele se torna vítima da mesma maldade que cometeu anteriormente ao dizimar uma povoado indígena.
Embora o filme não esclareça completamente, tanto Menéndez uma vez que MacLennan existiram. A crueldade de ambos contra os nativos foram documentadas, nunca punidas, e mesmo o seu legado ainda é lembrado e comemorado.
O historiador espanhol José Luis Alonso Marchante afirma no livro “Menéndez, Rey de la Patagonia”, sem tradução em português, que a extinção do povo Selk’nam na Patagônia foi um extermínio planejado e ordenado por Menéndez, a cuja família se atribui o desenvolvimento econômico de Punta Arenas, no extremo sul do Chile.
Ainda hoje o Museu Regional de Magalhães, antes palácio Braun-Menéndez, homenageia a riqueza da pecuária e das tradições rurais da região.
Nos 20 minutos finais, o filme entra em outro ritmo e deixa de lado as cenas brutais para mostrar o que aconteceu sete anos posteriormente a investida de McLennan e seus pares. Atenção, a partir daqui o texto tem spoilers.
Um funcionário do governo chamado Vicuña, vivido por Marcelo Alonso, chega à extensa propriedade Menéndez, querendo falar com o barão da terreno sobre sua reputação que não é das melhores nas regiões metropolitanas do Chile, onde há rumores sobre o tratamento terrível que ele dispensou às populações nativas da Patagônia.
Menéndez e sua família ficam horrorizados ao serem confrontados com o genocídio, principalmente quando isso beneficiou não só a eles mas também à sua pátria, e a tentativa de Vicuña de increver as atrocidades cometidas por esses senhores não vai passar de um esforço tímido, uma ligeiro dor de consciência que terminará enterrada num registro sem nenhuma repercussão, uma vez que em tantos outros países também colonizados.
O estreante Felipe Gálvez mostra habilidade em simbolizar na tela esses eventos e memórias históricas que confrontam a cultura e suas tendências desumanas. Raras estreias na direção começam com o nível de crédito e zelo que o cineasta demonstra ter com seu tema: os fantasmas da colonização branca do Chile.
Eles assombram. Perturbam. Nos levam a refletir sobre o tema da responsabilidade coletiva.