Ótimo, 'megalópolis' Tira Cinema Americano Da Mediocridade 28/10/2024

Ótimo, ‘Megalópolis’ tira cinema americano da mediocridade – 28/10/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

“Megalópolis” é metade Roma, metade Hollywood e metade Novidade York. Epa! Está sobrando uma metade. Sim, mas porque com Francis Ford Coppola tudo é excessivo. Estamos em Roma, na Roma, no poderio por vantagem, num momento em que tudo sugere a degeneração, o caos e o término próximo.

Estamos também em Hollywood, capital mundial do espetáculo e, não por possibilidade, coração dos Estados Unidos. E estamos em Novidade York, não só pela cenografia porquê pelo caráter de capital do poderio —ali os valores se estabelecem, mas também entram em estado de plena entropia.

Existe um conflito entre inventor Cesar Catilina (Adam Driver) e o prefeito Cicero (Giancarlo Esposito). De faceta somos remetidos a Roma, ao enfrentamento entre Cicero e Catilina. Não importa quem corresponde a que, importa a remissão a Roma, à iminência da tragédia (Catilina parece viver dentro de tragédias shakespearianas).

Catilina pretende mudar o mundo com sua novidade substância e sua megalópole. Para tento precisa desmanchar as habitações onde vivem os pobres. O prefeito não quer saber disso. Odeiam-se. Existe também a filha do prefeito, Julia (Nathalie Emmanuel) que começa a se interessar por Catilina.

Aos poucos veremos, na intriga, formar-se um triângulo amoroso similar ao de “Metrópolis”, de Fritz Lang, que é a mais evidente remissão cinematográfica na serra delas que Coppola se permite e não vasqueiro se diverte em fazer.

Mas a intriga é o que menos importa. Menos do que a corrida de bigas e as lutas a que os poderosos da cidade assistem enquanto mostram ao mundo o tanto de numerário que têm. Ou do que Wow Platinum (Audrey Plaza), que anuncia os números de Wall Street e anuncia a si mesma, enquanto é por um tempo amante de Catilina, antes de se matrimoniar com o banqueiro Crassus (Jon Voight), que esbanja a vaidade que vem da serra de numerário que tem.

Tudo isso, não se pode olvidar, faz segmento do espetáculo, tanto quanto os trapezistas ou os andaimes que servem de cenário aos sonhos de Cesar Catilina —e lembram por momentos a montagem de “As Criadas”, de Jean Genet, por Victor Garcia, em São Paulo.

É entre grandeza e ruinoso que se desenvolve a trama, mas a trama interessa menos que as ruínas. E neles residem as subtramas onde se ostenta poder e avidez em tempo quase integral.

Vendo o filme, lembrei de um observação muito importante sobre a relação de Coppola com seus diretores de retrato. Ele viveu às turras com Gordon Willis, mas foi com ele que fez os seus filmes mais bem-sucedidos —a saga “O Poderoso Chefão”. Com Vittorio Storaro, ao contrário, ele se dava muito, mas mesmo os filmes mais felizes que fizeram juntos fracassaram.

Por quê? Alguém levantou uma hipótese interessante: Willis era um tipo pé na terreno, e trazia para a Terreno o sonhador Francis Ford. Storaro era um sonhador porquê Coppola e com isso os filmes voavam cimeira, nunca tocavam o solo.

Pode ser. Aliás, um dos momentos mais belos do filme vem de uma trucagem (ou efeito próprio, tanto faz) à maneira de Méliès, em que vemos a Lua enxurrada encantadora e, perto dela, uma nuvem simpática, da qual sai um braço que leva a lua embora. Era um sonho.

Enquanto esses espetáculos, fragmentos e remissões se impõem, o filme é invenção o tempo inteiro, e essa invenção é por vezes genial, porquê o momento em que Coppola divide sua tela em três e, na aba medial, introduz um Elvis Presley que parece saído do filme de sua filha Sofia e canta o hino dos EUA.

Chega, porém, o momento em que é preciso desenvolver o “plot”, o conflito medial, e encaminhá-lo para o final. Ele diz reverência ao paixão entre Catilina e Julia e à absoluta repulsa que Cícero, o prefeito e pai dela, tem pela teoria de vê-los juntos.

É o momento em que o filme mais deve ao “Metrópolis”. Mas, o que é problema, quando mais perde o interesse. À força de colocar o espetáculo —ou seja, Hollywood— avante de tudo, Coppola deixou muito em segundo projecto a população, os miseráveis da cidade —ao contrário de Fritz Lang— para permanecer no triangulo amoroso —que leva a um final meio chuva com açúcar.

Apesar disso, o principal dessa empreitada tão grandiosa quanto megalomaníaca é o libido de tirar o cinema americano da miserável rotina padronizada em que caiu no século 21. A megalomania não é deslocada. Basta ver o projecto inicial, quando explode na tela —tem uma força incomum, de rabino inventor e desvairado. Uma vez que seu Cesar Catilina.

Estamos diante de uma produção enorme e ambiciosa que, quase visível, vai dar um prejuízo infernal. Imaginamos se no horizonte era obra grandiosa será lembrada pela sua magia ou esquecida por fragilidade. Coppola não parece se importar com isso.

Uma vez que Marco Aurélio, o imperador romano, ele acredita que sob nossos pés abre-se o decadência infinito do pretérito e outro decadência, o do horizonte, onde tudo some. Em definitivo, aquele cenário de andaimes incertos onde Cesar Catilina pisa, enquanto sonha com a cidade que projetou, não está lá por possibilidade.

Folha

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