Paralamas vão tocar até o fim, até em asilos, diz

Paralamas vão tocar até o fim, até em asilos, diz Herbert – 09/05/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Quando Os Paralamas do Sucesso começaram tocar nos palcos cariocas, no início dos anos 1980, tudo era novidade para os três garotos que só ensaiavam, em Copacabana, no apartamento da avó do baixista Bi Ribeiro —a vovó Ondina, celebrada numa música com traços heroicos, enfrentando soldados para proteger o rock dos meninos.

Mesmo passadas essas quatro décadas e incontáveis shows pelo Brasil e pela América Latina, o trio agora sexagenário nem pensa em deixar os palcos. É o que afirma o guitarrista, vocalista e compositor da filarmónica, Herbert Vianna, aos 64 anos.

Pelo contrário. A sensação de estar no palco é tão intensa quanto terapia, diz o músico, que dá início à turnê de celebração desses 40 anos no Allianz Parque, em São Paulo, no próximo dia 31. Com um público estimado de 45 milénio pessoas, será o primeiro show solo dos Paralamas em um estádio —os demais foram em festivais com outras bandas.

“A aposentadoria será só quando a gente não tiver mais condições físicas de fazer os shows. Até o final da história, da nossa trajetória nessa encarnação, vamos tocar até em asilos de pessoas na terceira idade em condições extremas.”

A motivação é simples —o prazer de tocar sua guitarra ao lado de Ribeiro, de 64 anos, e do baterista João Barone, de 62. “Me faz muito muito”, diz Vianna, numa rara entrevista em que não está escoltado dos amigos. O trio se conheceu em 1981, na Universidade Rústico do Rio de Janeiro, e é uma das bandas mais longevas do rock brasiliano, ainda em sua formação original.

Ao longo das décadas, o grupo lançou 20 álbuns, incluindo as coletâneas gravadas ao vivo, que formam uma playlist de sucessos, porquê “Alagados”, “Meu Erro”, “Vital e sua Moto”, “Lanterna dos Afogados”, entre outros —todas faixas obrigatórias nas apresentações da turnê, que tem datas marcadas até novembro por várias cidades do país. A trajetória do grupo também rendeu o espetáculo “Vital: O Músico dos Paralamas”, em papeleta em São Paulo até o final do mês no Teatro Sabesp Frei Caneca.

À amizade entre eles se soma a parceria com outros músicos que acompanham a filarmónica há décadas nos shows e a fidelidade do público. Vianna atribui essa proximidade com os fãs ao “ar despretensioso das canções, que não tenta elaborar repetição de refrões”, mas que transmite sentimentos que ele labareda de reais.

“Minhas canções são vômitos emocionais. Logo, quando estou sofrendo muito, digo coisas porquê ‘às vezes te odeio por quase um segundo’”, diz Vianna, lembrando-se da estação em que entrou na universidade e achava que nenhuma pequena daria globo para ele porque usava óculos. “Acabei escrevendo uma folgança a reverência disso que se tornou um mega hit pátrio”, diz, citando a música “Óculos”.

Ao refletir sobre a passagem do tempo, Vianna se lembra de quando ouvia os Beatles e exalta a plenitude de George Harrison na música “My Sweet Lord”. “Sonho que, qualquer dia, alguma música minha represente para alguém esse tipo de estofo, de conforto e macieza de sintonia”, diz.

É uma conexão que, acrescenta, rompe barreiras geracionais, a exemplo da plateia que teve no Lollapalooza, festival que atrai um público jovem e onde os Paralamas se apresentou há dois anos. “É muito impressionante você ver pessoas, quase crianças, gritando com muito excitação, cantando coisas que elas não eram nem nascidas quando a gente lançou e quando eu escrevi.”

É um sinal de que o público se renova apesar de o último álbum de inéditas do grupo, “Sinais do Sim”, ter sido lançado em 2017, com canções que não tiveram o mesmo alcance das anteriores. Mas eles parecem não estar tão preocupados com isso —no ano pretérito, Barone disse que os Paralamas não iriam competir com os seus sucessos e seguiriam fazendo shows.

Nem mesmo o acidente com um ultraleve pilotado por ele, em 2001, que o deixou em uma cadeira de rodas e matou sua mulher, a jornalista inglesa Lucy Needham, foi capaz de frear essa vontade do trio. Mais da metade dos 42 anos de história dos Paralamas foi escrita em seguida o incidente, quando ele sofreu lesões cerebrais que, além de impor uma limitação física, afetaram sua memória recente.

Na conversa com a reportagem, por exemplo, ao ser questionado sobre seu natalício em 4 de maio —a entrevista foi feita em 25 de abril—, Vianna teve dúvidas. “É 64 mesmo?”, perguntou ao seu empresário, José Fortes, que acompanhava a conversa. Mas logo se lembrou do natalício de Lulu Santos, no mesmo dia que o seu, e do produtor Liminha, em 5 de maio.

Disse ainda que, porquê bom taurino, tem tendência a amontoar coisas. “Acumulo guitarras”, admite. Para ele, os instrumentos são vitais. Sem eles, é obrigado a transformar a melodia em gestos no ar, tocando as notas imaginárias enquanto declama suas composições. Quando está em moradia, costuma pedir ajuda a uma das filhas —Hope Izabel ou Phoebe Rita— para darem play em qualquer disco, enquanto ele toca junto.

As mãos também se ocupam de desenhos e caricaturas de amigos e integrantes do Paralamas, que se espalham por uma parede de sua moradia, e a música só é interrompida durante sua rotina de cuidados, quando um enfermeiro o acompanha em atividades porquê fisioterapia, natação na piscina de sua moradia, nas consultas médicas e na gestão de remédios.

“A medicina ainda não conseguiu sintetizar em termos químicos o muito que faz você tocar canções que você goste muito ou, eventualmente, você se dá conta de coisas que escreveu e que te ajudaram a vencer certas etapas da vida. A música é realmente uma terapia muito ampla e profunda, muito verdadeira.”

É pela arte também que ele tenta amenizar a dor da privação de Lucy, entoando versos porquê os de “Se Eu Não te Amasse Tanto Assim”, sucesso na voz de Ivete Sangalo, ou de “Aonde Quer que Eu Vá”. Para uma das filhas, porém, lamentos porquê esses atrapalham “a viagem da mãe para o mais ressaltado”.

Quando Lucy morreu, aos 36, deixou Luca com nove anos, Hope Izabel com cinco e Phoebe com pouco mais de um ano. Na ocasião, Vianna teve a ajuda de sua mãe, Teresa, para educá-los. Hoje, ele diz que os próprios filhos, já adultos, reconhecem que ele conseguiu tocar o embarcação. “Eu tento me lembrar sempre e deixar que minhas dúvidas, minhas explosões de alegria, de perplexidade, sejam completamente honestas e transfixar muito o diálogo com eles”, diz.

Com todas as experiências vividas em seguida o acidente, Vianna diz crer que não se tornou uma pessoa melhor, mas obsessiva pelo tirocínio e por ouvir mais, deixando para trás os “arroubos de puberdade”, de negar as coisas, os valores dos pais ou todos os conflitos românticos. “Atualmente eu vejo, eu sinto pelas minhas convicções existenciais que são testes que você mesmo se propôs a viver, que você tenta ter para superar.”

Folha

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