Paris 2024 Reforça Saúde Mental Como Tema Olímpico 20/08/2024

Paris-2024 reforça saúde mental como tema olímpico – 20/08/2024 – Esporte

Esporte

Simone Biles chocou o mundo esportivo nos Jogos de Tóquio, em 2021, ao desistir de várias finais da ginástica artística por questões de saúde mental. A craque maior da modalidade se afastou das competições por dois anos e voltou ao palco olímpico em 2024, com três medalhas de ouro e uma de prata. Em Paris, encontrou um cenário dissemelhante.

Muitos atletas, medalhistas ou não, trataram francamente a questão ao longo das competições na capital francesa. Se antes era um tabu para os esportistas de superior rendimento exibir fragilidades e instabilidade, essa barreira parece ter sido quebrada por boa segmento da comunidade olímpica a partir do gesto da ginasta norte-americana.

Quando um dos maiores nomes da história do desporto demonstra sua fraqueza e pede ajuda, fica mais fácil para os demais fazerem o mesmo. Assim, a edição mais recente das Olimpíadas teve uma porção de competidores que relataram o desvelo que tiveram com a cabeça, não exclusivamente com o corpo, na procura pelo pódio.

Um deles, simples, foi a própria Simone Biles, 27, surpresa consigo mesma. “Três anos detrás, eu não imaginaria que colocaria meus pés em uma redondel de ginástica de novo, por tudo o que aconteceu”, disse, referindo-se aos “twisties”, que ocorrem quando um ginasta perde a noção espacial no ar, alguma coisa muito perigoso.

Para retornar, ela contou com uma rede de suporte que incluiu a mãe, o marido e profissionais de saúde. Antes de cada competição, uma vez que na que lhe rendeu o ouro na disputa individual universal em Paris, conversou com sua terapeuta. “Falo religiosamente com ela todas as quintas. Agradeço muito. Estou mentalmente muito!”

Também estava muito a única desportista capaz de desafiá-la. A brasileira Rebeca Andrade, 25, foi outra a transpor de Paris com quatro medalhas. Bronze na disputa por equipes e prata no campeonato individual universal e no salto, derrotou Biles no solo para chegar a seis pódios olímpicos na curso e se tornar recordista entre atletas brasileiros. Logo, fez um congratulação à sua psicóloga Aline Wolff.

Wolff foi uma das quatro profissionais da superfície levadas à França pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil), e outros seis foram cedidos por diferentes confederações. A base da delegação brasileira, montada na cidade de Saint-Ouen, nos periferia de Paris, tinha também um psiquiatra à disposição dos atletas.

De conciliação com o gerente de superior rendimento do comitê, Sebastian Pereira, ainda há os que relutam em receber esse tipo de auxílio, mas a confirmação cresceu. “A gente trabalha bastante no dia a dia para que eles possam se afazer com a teoria. Muitos eram resistentes em relação a essa preparação, à psicologia”, afirmou.

Decisiva para que Rebeca chegasse a seis medalhas olímpicas, a força mental também foi importante para Isaquias Queiroz, 30, buscar sua quinta. Prata na prova C1 1.000 m da canoagem de velocidade, ele se mostrou revigorado posteriormente um ano quase sabatino em 2023, com poucas competições e um retiro em sua Bahia.

“Eu estava muito sobrecarregado, mentalmente, psicologicamente, muito estresse mental. Eu não conseguia raciocinar recta, explodia em mansão por qualquer coisa, com o Sebastian. Falei: ‘Não sei o que está acontecendo, estou descontando no meu rebento, não tem zero a ver’”, contou o canoísta, que resolveu a questão com ajuda psiquiátrica e remédios.

Há vários outros exemplos. Campeãs no vôlei de praia, Ana Patrícia, 26, e Duda, 26, também mencionaram o auxílio de uma psicóloga. As duas haviam sido muito criticadas pelos resultados obtidos nos Jogos Olímpicos de Tóquio, à quadra com parceiras diferentes, e se apoiaram na ajuda profissional no caminho ao ouro.

Já Ana Marcela Cunha não saiu criticada do Japão, onde esteve no topo do pódio na maratona aquática. Sua dificuldade foi manter a motivação posteriormente a glória maior e uma lesão mais séria no ombro. Há um ano, procurou uma psicóloga e relatou que não tinha mais vontade de praticar seu esporte.

“É importante a quebra do tabu, mostrar que o desportista é um ser humano também. Não somos máquinas, em que você bota óleo para funcionar e pronto. A gente precisa do auxílio de muita gente para permanecer no superior rendimento”, disse a nadadora. Segundo ela, o quarto lugar no rio Sena não teria sido verosímil sem essa ajuda: “Olharam para mim uma vez que ser humano”.

A baiana de 32 anos celebrou a recuperação que a deixou perto da medalha. Já a judoca Mayra Aguiar, 33, ficou longe de repetir seu desempenho nas três edições anteriores dos Jogos Olímpicos, nas quais levou o bronze. Em Paris, foi eliminada na primeira luta e relatou a luta de seu corpo com sua mente.

“Eu já passei do meu limite. Já tem um tempo que eu venho mentindo até para o meu corpo, mentindo que está tudo muito. Eu tenho oito cirurgias no corpo, a primeira com 16 ou 17 anos. Eu sinto essa cirurgia até hoje. E sinto a outra. E sinto a última. Aprendi a treinar assim, a lutar assim, mas nos últimos anos tem sido mais difícil”, afirmou, entre lágrimas.

A gaúcha, portanto, pediu desculpa por ter ficado reclusa antes da competição, sem conceder entrevistas. “O pessoal estava enlouquecido: ‘Está tudo muito, Mayra?’. Não, não estava, mas, para não permanecer reafirmando isso, talvez para ser mais fácil, eu menti para mim mesmo. Talvez eu tenha me fechado mais por conta disso também.”

Introduzido justamente em Paris, há centena anos, nos Jogos de 1924, o lema olímpico ainda é “citius, altius, fortius”. Mas, está cada vez mais simples para os atletas, o corpo só é “mais rápido, mais superior mais poderoso” impulsionado pela mente.

Folha

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *