População Lgbtqia+ Denuncia Mais Casos De Violência No País

População LGBTQIA+ denuncia mais casos de violência no país

Brasil

O volume de denúncias de casos de LGBTQIA+fobia saltou nos últimos anos. Segundo dados do Disque 100, serviço do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), que documenta violações de direitos humanos, 5.741 casos foram registrados até setembro deste ano. No ano anterior, foram feitas 6.070 denúncias, 2.122 a mais que em 2022 (3.948).

Boa secção dos registros de violência foi feita por homens gays, embora pessoas transexuais e travestis tenham sido as principais vítimas de agressão. 

“Nascente não é um oferecido novo. Quando olhamos, por exemplo, a Pesquisa Pátrio de Saúde [PNS] de 2019, já tínhamos uma prevalência de violência contra a população LGBTQIA+, sobretudo contra as mulheres”, afirma o professor do Departamento de Enfermagem de Saúde Pública da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Ricardo de Mattos Russo. 

Para Russo, o aumento do número de denúncias pode ser explicado pela postura mais afirmativa das pessoas LGBTQIA+ e pelo reconhecimento das violações de direitos enfrentadas. “Estamos vivendo um momento político em que existe o confronto entre a prática de resistência de alguns grupos, com suas identidades, contra aquilo que chamamos de sociedade tradicional. Nascente é um ponto crucial, inclusive que estimula a política de ódio no Brasil.”

Quanto ao perfil dos denunciantes, homens gays e brancos entre 20 e 40 anos são responsáveis pela maioria dos registros de LGBTQIA+fobia. Na avaliação da professora do Departamento de Recta Privado da UFF Carla Appollinário de Castro, a predominância desse grupo ocorre porque são estas as pessoas compreendidas porquê sujeitos de direitos. “A maioria das vítimas de violência no Brasil, de consonância com outros relatórios, são mulheres trans e travestis, mas, normalmente, essas pessoas não se veem no lugar de cidadãs que podem reivindicar os seus direitos, porque já estão habituadas a uma vida de exclusão e vexame”, diz. 

Violências


Rio de Janeiro (RJ), 17/10/2024 - Ariela Nascimento, estudante de Ciências Sociais na UFF, ativista, assessora da vereadora de Niteroi, Benny Briolly. Vítima de LGBTQIA+fobia em maio deste ano. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Rio de Janeiro (RJ), 17/10/2024 - Ariela Nascimento, estudante de Ciências Sociais na UFF, ativista, assessora da vereadora de Niteroi, Benny Briolly. Vítima de LGBTQIA+fobia em maio deste ano. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

A estudante da Universidade Federalista Fluminense Ariela Promanação, que foi agredida em maio em Cabo Rio – Tânia Rêgo/Escritório Brasil

Em maio deste ano, a ativista e estudante de ciências sociais na Universidade Federalista Fluminense (UFF) Ariela Promanação desfrutava de um momento de afeto com o namorado, Bruno Henrique, em um bar na cidade de Cabo Indiferente, na Região dos Lagos, quando escutou de um cliente a frase: “Olha lá, o rostro com um traveco”. “Questionei o indumentária dessa fala ser uma frase muito transfóbica. Imediatamente ele pagou a conta e se retirou do bar”, recorda a também assessora parlamentar da vereadora Benny Briolly (PSOL), uma das 26 pessoas transexuais eleitas no pleito municipal deste ano.

Pouco tempo depois, Ariela e o namorado, também uma pessoa trans, decidiram trespassar do bar. No entanto, a alguns quilômetros de intervalo, encontraram a pessoa responsável pela ofensa, que aguardava com mais quatro homens, todos portando pedaços de madeira. “Começaram a me agredir. Eu não conseguia enxergar zero, só conseguia escutar eles falando: ‘vamos pegar, é isso, dá mais’”, relembra. Embora não fosse o níveo da agressão por não ter sido interpretado porquê uma pessoa transexual naquele momento, Bruno também foi atacado. Somente quando os agressores voltaram a atenção novamente para Ariela é que o rapaz encontrou uma brecha para decorrer até a moto do par. 

“Não consigo entender o que levou esse varão a ter um ódio tão grande, a ponto de me violentar”, lembra a ativista, em entrevista à Escritório Brasil. “Com muita força, consegui me levantar, mas eles continuaram me batendo, e eu criando forças para me levantar e encontrar o Bruno. Tentei furar os olhos, e, mesmo enxergando tudo embaçado, consegui ver que tinha uma moto ali. Tentei ir na direção dela, mas eles continuaram me batendo, e eu caí de novo. Não sei qual força estava me protegendo naquele momento para eu trespassar dali viva, mas consegui me levantar mais uma vez e subir na moto do Bruno.”

Com ajuda da jornalista e pesquisadora Sara Wagner York, o par seguiu para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Cabo Indiferente, na Avenida Vítor Rocha, mas a situação de violência não terminou na agressão física. “Posteriormente esse incidente horroroso, fui ao hospital em procura de ajuda e suporte com Sara Wagner York, que me recolheu do sítio onde eu havia sido agredida e me deu suporte inicialmente, mas, de manhã, fui confrontada com mais transfobia”, publicou Ariela em seu perfil no Instagram na estação. “Angel [amiga de Ariela], que veio me dar suporte em conjunto com o núcleo de cidadania e a superintendência do município, foi tratada com desrespeito e negligência pela equipe médica, que se recusou a fornecer as informações necessárias para que ela pudesse prestar queixa juntamente a mim e denunciar o ocorrido, e ainda foi agredida junto ao meu namorado por um segurança do hospital enquanto tentava encontrar meios de me ajudar a conseguir justiça para a situação toda.”

Números 

Segundo o Observatório Pátrio dos Direitos Humanos (ObservaDH), também do MDHC, 11.120 pessoas LGBTQIA+ foram vítimas de qualquer tipo de agressão em função da orientação sexual ou da identidade de gênero em 2022. Pessoas transexuais e travestis correspondem à maioria dos casos (38,5%). Casos de violências física (7.792), psicológica (3.402) e sexual (3.669) lideram as estatísticas. 

Agressões porquê essas são motivadas, principalmente, por situações de intolerância, discriminação e ignorância, sendo os homens os principais agressores apontados pelos processos judiciais em casos de LGBTQIA+fobia. “O que diz reverência à vida íntima das pessoas não deveria nos incomodar, mas muitos tomam isso porquê referência constitutiva da pessoa; daí vem a discriminação”, afirma a pesquisadora Carla Appollinário de Castro. “Às vezes, identificamos também aspectos religiosos incidindo sobre a vivência e a convívio das pessoas LGBTQIA+, o que acaba agravando o quadro de exclusão social.”

Para a professora, outra informação relevante é que, em muitos casos, as agressões partem de membros da família ou de pessoas próximas. Conforme o ObservaDH, o invasor é alguém divulgado da vítima, porquê ex-companheiros ou namorados, em 30% dos casos, enquanto amigos ou conhecidos são responsáveis por 17,7% das situações de violência. “Assim porquê as mulheres, as pessoas LGBTQIA+ são vistas porquê indivíduos que não detêm autonomia. Portanto, a sociedade acha que tem o poder de vida e de norma sobre nós e nossos corpos. É do entendimento que não somos autônomas e que essas pessoas podem mandar porquê pensamos, porquê nos constituímos porquê indivíduos e o que fazemos. Daí vem a violência no envolvente familiar.”

No ano pretérito, o Dossiê Assassinatos e Violências contra Travestis e Transexuais Brasileiras, elaborado pela Associação Pátrio de Travestis e Transexuais (Antra), revelou que 145 pessoas morreram vítimas de transfobia no Brasil. A maioria (93,7%) foram mulheres trans, negras (78,7%), com até 35 anos (79%), e moradoras das periferias dos grandes centros urbanos. O uso de armas de queima foi identificado em 46% dos registros, mas também é generalidade que as mortes sejam resultado de espancamento, apedrejamento, estrangulamento, pauladas, degola ou ateamento de queima (30%). De consonância com o documento, muitos dos casos aconteceram com uso excessivo de violência e requintes de crueldade.

O dossiê também identificou que as vítimas de 57% dos assassinatos eram profissionais do sexo. Para Ricardo Russo, nascente é um oferecido que leva diretamente à reflexão sobre a privação de oportunidades para as mulheres transexuais e travestis. “Essas são pessoas que, em universal, foram expulsas de moradia, sofreram violência no envolvente escolar e foram excluídas de um conjunto de oportunidades. Uma secção dessas pessoas acaba atuando porquê profissionais do sexo, não necessariamente por libido, mas porque nascente acaba sendo um nicho de oportunidades”, observa. “Isso também explica porque secção expressiva dessa violência é produzida por parceiros íntimos, seja em relacionamentos, seja por parceiros ocasionais. Os próprios parceiros também as assassinam.”


O superintendente de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos, Cláudio Nascimento, durante a posse dos novos integrantes do Grupo de Trabalho de Enfrentamento à Intolerância Religiosa no Rio.
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil/Arquivo
O superintendente de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos, Cláudio Nascimento, durante a posse dos novos integrantes do Grupo de Trabalho de Enfrentamento à Intolerância Religiosa no Rio.
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil/Arquivo

Cláudio Promanação destaca que cor e classe também contribuem para a exclusão de pessoas LGBTQIA+ – Tomaz Silva/Registro/Escritório Brasil

Diretor da Coligação Pátrio LGBTI+ e presidente do Grupo Roda-Íris de Cidadania LGBT+, Cláudio Promanação Silva ressalta a relevância de pensar elementos porquê raça, origem e situação socioeconômica ao determinar as diferentes violências enfrentadas pela população LGBTQIA+, fatores fundamentais tanto na estudo dos dados de discriminação quanto no enfrentamento à discriminação. “Quando pensamos a violência contra a comunidade LGBTQIA+, temos que trazer um elemento importante para essa conversa que é a interseccionalidade, ou seja, porquê olhamos para os indivíduos e percebemos que, além da orientação sexual e da identidade de gênero, existem recortes que contribuem ainda mais para a exclusão dessas pessoas, que são os marcadores de cor, de classe social e de território. Tudo isso interfere, porque quanto mais se somam esses marcadores de exclusão, mais a pessoa sofre preconceito e discriminação.”

Lei

Apesar de ter sido a primeira vez que enfrentou uma situação de agressão física, o ataque sofrido em maio não foi o primeiro incidente de violência que Ariela viveu. “Com muita honestidade, acho que nós, enquanto pessoas trans, sofremos violência em todos os espaços, mas posso manifestar com muita firmeza que foi a primeira em que sofri ao ponto de encontrar que perderia a vida.” Ao denunciar a situação, Ariela conta que foi chamada para uma série de procedimentos, incluindo um reconhecimento fotográfico, mas que não conseguiu identificar o culpado e depois não foi mais informada sobre o curso do caso. 

“Digo até que nascente é outro tipo de violência. Sei que há um tempo de vagar da Justiça, mas acredito que isso tem se oferecido pelo indumentária de o caso não estar mais sendo levado com tanta seriedade, até mesmo pelo tempo que passou”, reflete. “Aí tem a minha responsabilidade e o meu compromisso com aquilo que busco diariamente para tutorar a população LGBTQIA+, que é não deixar que esse caso morra, que deixe de viver, porque existiu, aconteceu. Portanto, precisamos dar uma resposta, não só para o que aconteceu comigo, mas para mostrar de novo sobre o país em que vivemos, que ainda é o que mais mata a população LGBTQIA+.”

Diante das situações de violação de direitos, em 2019, o Supremo Tribunal Federalista (STF) equiparou a LGBTQIA+fobia ao racismo, criminalizando a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero. No mesmo julgamento, foi disposto que crimes motivados por homofobia ou transfobia seriam considerados hediondos. Já em caso de homicídio doloso — quando é comprovado que o invasor teve a intenção de matar —, o violação passa a ser qualificado por configurar motivo torpe. A decisão tem validade até que o Congresso Pátrio edite legislação específica para punir crimes associados à LGBTQIA+fobia. 

Em 2023, a norma foi atualizada, e ofensas dirigidas à comunidade passaram a ser enquadradas porquê injúria racial. O violação passou a ser imprescritível, e o invasor não tem recta a fiança ou a limite de tempo para responder judicialmente, podendo ser recluso. “Viemos de um movimento de luta e de reconhecimento de direitos que não começa agora. Em 2019, o STF criminalizou a LGBTQIA+fobia e a equiparou ao violação de racismo. O problema é que, no campo jurídico, havia duas legislações, uma de racismo e outra de injúria racial”, lembra Carla Castro.

O racismo, explica a professora, era entendido porquê uma forma de discriminação contra um conjunto de pessoas em razão da identidade racial, enquanto a injúria racial era compreendida porquê uma forma de discriminação individual. Essa ofensa individual praticada com frequência, entretanto, não poderia ser caracterizada exclusivamente porquê um caso solitário de violência. Assim, a lei foi alterada, equiparando ambas as situações. “O racismo é um violação inafiançável, imprescritível e incorruptível de indulto ou perdão, de consonância com a Constituição Federalista de 1988. Portanto, essa é uma tentativa da sociedade de sinalizar que existem violências praticadas contra certos grupos, que, no momento pretérito, já discutimos isso social e coletivamente e dissemos que não íamos mais tolerar. Agora, estamos reivindicando a intolerância com a intolerância.”

Somente a lei, no entanto, não tem potencial para transformar a sociedade. “A medida punitiva é uma medida necessária, inclusive para podermos estabelecer normas de conduta”, afirma Russo, que também reforça a premência de edificar outras ações: “Falta um olhar mais específico para uma legislação que contenha não exclusivamente a punição, mas, sobretudo, o debate sobre orientação sexual e identidade de gênero desde o início, porque, se o gênero é uma construção social, conseguimos fazer outra construção onde possamos nos reconhecer nas múltiplas identidades.”

Elaborar diferentes ações para mourejar com a discriminação e o preconceito em relação à orientação sexual também inclui medidas para mourejar com os impactos da LGBTQIA+fobia, sobretudo da violência psicológica, porquê traz Ariela Promanação. “Ela vai gerar uma série de aspectos negativos para a saúde mental do sujeito, porquê o terror de marchar pelas ruas e de ter que se tutorar e tutorar seus direitos. A pessoa se torna muita mais vulnerável; portanto, a discriminação tem efeitos direitos na autoestima e na maneira porquê a pessoa se coloca no mundo, porque ela acaba ficando mais insegura.”

“Tenho terror, todos os dias, de trespassar de moradia e ir para o trabalho, porque não sei o que pode suceder. Isso me assusta muito e, por mais que eu tenha desvelo disso, não é fácil”, lamenta Ariela. “Mesmo assim, não quero que as pessoas olhem para mim e me vejam só pelo lugar da dor ou da violência. Quero que as pessoas entendam também o outro lado, que é ser uma travesti, estudante de uma universidade federalista e assessora parlamentar, que está na luta em resguardo dos direitos humanos e tem uma medida cautelar garantida pela Percentagem Interamericana de Direitos Humanos, responsabilizando o Estado brasiliano pela minha vida.”

Em 2022, a Percentagem Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA), emitiu a Solução 34/22, garantindo medidas cautelares em prol da vereadora Benny Briolly, incluída no Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, e aos integrantes de sua equipe. O documento destaca que “em seguida estudar as alegações de indumentária e recta fornecidas pelas partes, a percentagem considera que as informações apresentadas demonstram prima facie [à primeira vista] que a proposta beneficiária se encontra em uma situação grave e urgente, pois seus direitos à vida e integridade pessoal estão em risco de danos irreparáveis”. Com isso, por decisão da CIDH, o Brasil deve adotar medidas para proteger a vida e a integridade pessoal da parlamentar e de três membros da sua equipe de trabalho, entre os quais, Ariela.

*Estagiária sob supervisão de Vinícius Lisboa

Fonte EBC

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