Antes do sol nascer, algumas famílias já estavam na porta da Penitenciária Feminina da Capital, na zona setentrião paulistana, esperando uma das muro de 500 detentas beneficiadas com a saída temporária na unidade.
No estado de São Paulo, as pessoas presas no regime semiaberto que receberam autorização da Justiça para a saída temporária, deixam as prisões nesta terça-feira (11) e devem retornar na próxima segunda-feira (17). A saidinha é a primeira desde que o Congresso Pátrio aprovou em abril a lei que acaba com o favor facultado quatro vezes ao ano a pessoas em regime semiaberto. A legislação, entretanto, não afeta os direitos de quem foi sentenciado antes da mudança.
As liberações das presas só começaram a ocorrer por volta das 8h. Mães, filhas, irmãs, irmãos e companheiros aguardavam com sofreguidão, aglomerados em frente a porta da penitenciária. Os reencontros misturavam abraços, lágrimas e sorrisos. “Muito emocionante, dá vontade de chorar. Quando a gente se vê, não tem momento melhor”, diz Vilma* de 59 anos, que aguardava a filha de 34 anos de idade, que cumpre pena há 7 anos. Vinda de Sorocaba, esperava poder passar os próximos dias em vivenda, curtindo a filha com os três netos. “O menino [mais novo, de sete anos] teve febre essa noite, de esperar”, conta sobre o nível de expectativa da família com o encontro.
Moca, absorventes e panfletos
Organizações não governamentais oferecem moca, bolo, absorventes e roupas para que as mulheres não precisem voltar para vivenda com as vestimentas brancas, características do presídio. A coordenadora da Associação de amigos e familiares de presos/as (Amparar), Railda Alves, levou também um pouco de informação, que ela considera necessária mormente depois a aprovação, pelo Congresso Pátrio, da lei que acabou com as saídas temporárias no país.
Entre os esclarecimentos que Railda julga importantes está a ênfase de que as pessoas que já têm o recta não poderão perdê-lo pela novidade lei. Ela teme que, por desinformação, algumas pessoas não retornem depois o termo do período de saída temporária, prejudicando o cumprimento da pena. “Conversar um pouco para que elas voltem para a calabouço, que não serão afetadas por essa lei, para que elas cumpram isso e não fiquem mais tempo dentro da calabouço”, diz a coordenadora da associação que elaborou junto com a Frente pelo Desencarceramento de São Paulo um panfleto explicativo.
Desde 1998, Railda acompanha o sofrimento do rebento, que à estação cumpria medida dentro da antiga Febem, substituída pela atual Instalação Moradia. “Nós [Amparar] nascemos na porta da Febem, fazendo a panfletagem para os familiares, mas acreditando em albergar esse familiar, no fortalecimento desse familiar, para que ele não fique só. Porque é um momento que você fica muito sozinha, quando seu rebento está enclausurado, sua filha está aprisionada. E a pena também estende para nós. A família toda adoece”, diz a coordenadora da entidade, que depois a ação em frente a penitenciária, pretendia buscar na rodoviária, o rebento também liberado na saída temporária.
Grandes distâncias
O termo das chamadas “saidinhas” deve, segundo Railda, enfraquecer os vínculos entre as pessoas presas afetadas e as famílias. “Imagina uma garoto que às vezes não vê seu pai por questão econômica, sua mãe por questão econômica. E na saidinha pode estar presente com a sua mãe no parque. A mãe buscar na escola. Isso faz segmento de todo um processo na vida das pessoas”, discutir ao lembrar que muitas pessoas cumprem pena em cidades distantes dos parentes, o que dificulta as visitas regulares.
Marcela* disse que ainda hoje embarcaria em um ônibus com direcção a Buri, no interno paulista, 260 quilômetros distante da capital. “Eu deixei três filhos pequenos na rua: uma bebê de 11 meses, uma rapariga de 9 e um menino de 5 anos. Graças a Deus, hoje posso sentir o ar da liberdade e poder ver minha família, meus filhos perto de mim”, disse, com uma sentença que misturava um sorriso com olhos marejados.
Na rodoviária, Marcela esperava ser buscada pelo marido, para em seguida passar bons momentos em família. “Hoje é o natalício da minha sobrinha. A Lara tá fazendo 12 anos”, contou animada. Posteriormente satisfazer o resto da pena, que se encerra em 2026, pensa em dar um outro rumo para a vida. “Penso em ter o meu próprio negócio, perfurar um salão [de beleza]. Fazer uns cursos, uma faculdade, poder subir na vida”.
Com 54 anos de idade, Marisa* conta que só conseguiu controlar a sofreguidão em relação as notícias sobre o termo das saídas temporárias confiando na fé. “Eu escutei tudo, mas mantive a paciência. Vem a sofreguidão e tudo. Mas não provém de Deus a sofreguidão. Logo, a gente ora, entrega nas mãos de Deus e Ele faz a obra”, conta a idosa que estava contente por poder ver as netas, de 16 e 20 anos.
Dúvidas e erros
Uma percentagem de advogados da Ordem de Advogados do Brasil (OAB) em São Paulo aproveitava a saída para tirar dúvidas, colher denúncias e orientar as presas sobre os processos. “A gente pega o processo da pessoa, analisa na hora. Se tem qualquer erro na realização, por exemplo, falta pedido de remissão, o cômputo de pena está incorrecto, o prazo do regime é desobstruído e o protector ou jurisperito ainda não peticionou pedindo. A gente pega todos esses dados e encaminha para a Defensoria Pública”, detalha a coordenadora do Núcleo de Mulheres e Sistema de Justiça Criminal da OAB, Larissa de Melo Itri.
Erros que prejudicam as presas na progressão de regime, no tamanho das penas ou para conseguir benefícios são comuns, de harmonia com a advogada. “Se o cartorário não olha com muito desvelo o cômputo de pena, vai incorrecto. Porque não é o juiz que faz o cômputo de pena, é o cartorário. E o cartorário muitas vezes não tem informação jurídica para fazer o cômputo de pena. Muitas vezes está completamente incorrecto. É muito importante que tenha alguém ali vendo tudo certinho”, enfatiza sobre a prestígio do séquito processual para prometer os direitos das pessoas presas.
*Os nomes foram alterados para preservar a identidade das pessoas.