Quase 10% dos museus brasileiros estão de portas fechadas

Quase 10% dos museus brasileiros estão de portas fechadas – 04/06/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Mofo, térmita, insetos e toda sorte de agressões naturais que recaem sobre qualquer tipo de pilha físico. Para mourejar com isso tudo, museus precisam de recursos.

Porquê nem o preço do ingresso e nem o poder público têm conseguido remunerar a conta, muitas instituições não têm visto outra escolha senão fechar as portas.

De tratado com a plataforma do Cadastro Pátrio de Museus, acessado nesta quarta (4), atualmente são 385 museus fechados no país, de um totalidade de 4.010 museus cadastrados no banco de dados. Isso equivale a 9,6% dos museus do país listados.

A plataforma é hospedada no site do Instituto Brasiliano de Museus, o Ibram, vinculado ao Ministério da Cultura.

A maioria pertence ao poder público —ao todo são 263 museus públicos fechados.

Destes, 167 são administrados pelos municípios brasileiros, enquanto 64 são pertencentes aos estados ou Província Federalista. Sob a esfera federalista, são 32 museus públicos fechados atualmente.

Na privada, são 112 museus fechados, entre empresas, associações, fundações e entidades religiosas.

Há ainda três de economia mista. Dos museus fechados, sete não informaram a que esfera pertencem no cadastro.

A maioria dos museus fechados está em São Paulo, com 76. Em seguida vêm Minas Gerais, com 52, e Rio Grande do Sul, com 36. Em quarto lugar vem o Rio de Janeiro, que tem 32 instituições paralisadas.

Isso significa que São Paulo e Minas têm 11% de seus museus fechados, o Rio Grande do Sul tem 7,3% e o Rio de Janeiro tem 9,6%.

Para Diego Vaz Bevilaqua, presidente do Icom Brasil, o Parecer Internacional de Museus, esse número de museus fechados deve ser analisado com critério.

Segundo Bevilaqua, é verosímil que, entre os museus fechados, estejam aqueles em reforma —o que um pouco de se esperar para instituições sediadas muitas vezes em casarões históricos. O Ministério da Cultura, porém, afirma que não tem detalhamento sobre os motivos dos fechamentos caso a caso.

Independente disso, ter um museu fechado por falta de recursos, que seja, já é muito chocante, diz o presidente do Icom.

Um deles é o museu do tradicional grupo de teatro de bonecos Giramundo, em Belo Horizonte. O grupo, que já adaptou Mozart, Prokofiev, Carlos Gomes e já ganhou até o prêmio Molière de teatro, não conseguiu manter seu museu de bonecos funcionando.

O diretor do grupo, Marcos Figueiredo, conta que a moradia está fechada desde o auge da pandemia, e aponta uma vez que motivo os custos de manutenção, infraestrutura, atendimento e conservação do pilha.

“Esses custos fixos não são cobertos pelo valor do ingresso”, diz Figueiredo.

“Nas leis de incentivo, a gente vem encontrando uma dificuldade crescente de aprovação de projetos”, diz o diretor do Giramundo, uma vez que os recursos ao nosso ver estão limitados e o volume de proponentes só cresce [nas leis de incentivo]. “O recurso é o mesmo para um número maior de projetos inscritos.”

“A gente viveu um período de represamento”, diz Figueiredo, sobre os anos do governo Jair Bolsonaro (PL), marcado pelo desmonte do setor cultural. “Quando esse represamento deixou de viver, a gente percebe uma inundação de projetos. A demanda reprimida ficou muito subida. Mas pelo menos existem vários canais de diálogo [com o governo]. O que está acontecendo é um trabalho de formiga”, diz, sobre a retomada do MInC, em seguida ter sido rebaixado a secretaria no governo anterior.

A situação de projetos que abrigam coleções, acervos e memória é ainda pior porque demandam o fluxo de recursos permanente. “Quando esse fluxo não vem, o que acontece rapidamente é ruína de acervos, perda de memória. No nosso caso por exemplo o que a gente luta cá é para que a gente não perdida o objeto físico”, diz Figueiredo “É muito angustiante. A gente se sente impotente para dar conta da proporção desse pilha.”

No momento, ele trabalha formatando um projeto de reabertura do Museu Giramundo, e espera que consiga reabri-lo em 2026,

Há ainda novas questões a serem enfrentadas neste contexto pós-Bolsonaro. Uma delas advém da forma uma vez que estão sendo postas em prática a Lei Paulo Gustavo e a Política Pátrio Aldir Blanc, que transferem recursos da União para que os estados e municípios os executem.

O presidente do Parecer Internacional de Museus aponta um tiro que saiu pela culatra Brasil afora. Muitos municípios, ao receberem os recursos federais, deixaram de investir recursos próprios na cultura. “Em muitos casos, ao invés de se verificar um aumento de investimentos em museus, houve subtracção ou até estagnação”, diz.

Há ainda museus fechados por falta de pessoal no país inteiro, diz Beviláqua. Nessa seara, muitos museus públicos se encontram numa encruzilhada. Por um lado, o governo federalista não faz muitos concursos públicos para contratar mais gente. Por outro, aqueles que optam por terceirizar segmento de seu pessoal, há o golpe de orçamento do MinC, que dificulta contratações.

“Na minha percepção enquanto servidora do Ibram, eu vejo que isso é, em segmento, consequência do inferior investimento a nível federalista”, diz Ruth Vaz, educadora museal concursada e membro da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federalista.

“O Ibram foi criado em 2009, com servidores do Iphan, e no início de 2010 foi realizado o único concurso até agora. O próximo preenchimento de vagas deverá ser esse ano no Concurso Público Pátrio Unificado. Porém das 285 vagas que precisamos repor, foram liberadas 28”, diz a servidora.

“Nós já atuamos no Ibram com o mínimo de orçamento e com pouquíssimas pessoas, em relação a demanda real das estruturas de museus”, diz Vaz. “A veras nos estados e município, salvo raras exceções, é invariavelmente pior que em nível federalista, e com menos estrutura ainda de pessoal para estruturar, por exemplo, a distribuição de investimentos uma vez que o da PNAB para os museus.”

“Os museus não são lugares para vigiar coisas velhas. São para refletir o pretérito e pensar o porvir”, diz Figueiredo, do Giramundo.

“Quando os museus são destruídos, constrói-se uma identidade vazia, de terreno destruída”, diz. “É um sinal muito grave de adoecimento social e político.”

A reportagem entrou em contato com o MinC, questionando o porquê do cenário de falta de recursos mesmo em seguida as leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc terem irrigado o setor cultural brasiliano, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.

Folha

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *