Quem é Jasmin Ramos, Que Irá Interpretar Erika Hilton

Quem é Jasmin Ramos, que irá interpretar Erika Hilton – 10/02/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Selecionada para atuar em uma cinebiografia de Erika Hilton, Jasmin Ramos, de 18 anos, impressionou a produção do filme por ser muito parecida com a deputada federalista pelo PSOL. As semelhanças não são só físicas: moradora da periferia de São Paulo, ela também é de família evangélica, foi criada na igreja e se revelou transexual na juvenilidade.

O desfecho, porém, foi dissemelhante: enquanto Hilton foi expulsa de vivenda aos 15 anos e teve que recorrer à prostituição para sobreviver, Ramos teve a compreensão dos familiares, que hoje já a chamam pelo nome feminino, ainda que às vezes confundam os pronomes.

Recém-saída do ensino médio em uma escola estadual, Ramos fazia bicos em um salão de venustidade quando foi convencida por um colega a tentar o papel em “House of Hilton”. Com lançamento previsto para o início de 2026, o longa é majoritariamente documental, mas ficcionaliza cenas da puerícia e da juvenilidade da deputada, com um elenco que inclui as atrizes Adriana Lessa, Pepita e Verônica Valenttino —primeira transexual a receber o prêmio Shell de melhor atriz.

A diretora, Chica Andrade, conta que já havia concluído o “casting” para selecionar a protagonista, posteriormente receber mais de 400 candidaturas de todo o Brasil, quando uma funcionária do set, que conhecia um colega de Ramos, falou sobre a pequena.

“Olhei a foto e falei: manda ela cá”, afirma. “Ela chegou tímida, com uma bolsa da [ativista americana] Angela Davis, dizendo que tinha o sonho de ser jornalista. Me pareceu uma moça muito inteligente, madura para a idade, com muita consciência de mundo. Eu tinha encerrado os testes três dias antes e já tinha três pré-selecionadas, mas falei: ‘Para tudo.’”

A timidez de Ramos, que nunca tinha atuado antes, deixou a equipe ressabiada. Mas a pequena surpreendeu nos testes com o preparador de elenco, diz Andrade. “Impressionou todo mundo. Decorava os textos, mas também improvisava, menos querendo imitar a Erika que tentando entender o que tinha de transmitir em cada cena.”

Naquele momento, Ramos tinha 17 anos e a produção não estava conseguindo a autorização judicial para que menores de idade trabalhem com projetos audiovisuais. Decidiram esperar os 18, completos em 24 de dezembro, e as gravações aconteceram em janeiro.

Para a jovem, as cenas mais difíceis foram as envolvendo a religião —uma vez que quando Hilton passa por um exorcismo. “Eu me falei: ‘Será que vou conseguir fazer?’ Porque eu já fui evangélica. Eu cantava em louvores, pregava. Muitas coisas me pegavam”, diz.

Segundo Ramos, o indumento de a equipe ter majoritariamente profissionais negros e trans trouxe a ela uma sensação de pertencimento. “O set foi muito hospitaleiro. A diretora é trans, o preparador de elenco é um varão trans, é tudo muito inclusivo. Era um espaço onde se preocupavam comigo.”

O primeiro encontro de Ramos com Hilton aconteceu no final do mês pretérito, quando a deputada visitou o set. “Eu já tinha estudado muito as entrevistas dela, mas foi muito bom ver uma vez que ela agia, uma vez que ela sorria e falava ali na minha frente. Ela foi um paixão”, diz a jovem.

Ramos também gostou de conviver com as atrizes mais experientes, uma vez que Lessa, mãe de Erika no longa, Pepita e Valenttino, que interpretam suas amigas da estação de prostituição. “Eram cenas difíceis, mas foi incrível trabalhar com elas. É muito importante ver que uma travesti pode montar uma família e ter rebento, uma vez que a Pepita, ou ter uma trajetória grandiosa no teatro, uma vez que a Verônica. Para alguém que está começando a transição agora, foi muito enriquecedor”, diz.

Moradora da região de Interlagos, na zona sul de São Paulo, Ramos nunca tinha tido contato com uma pessoa trans até fazer um curso de jornalismo comunitário, onde teve uma colega travesti. Ali, caiu a ficha de que ela também queria passar pela transição.

Isso foi em 2024, mas a falta de identificação com o gênero masculino é muito anterior. “A gente sempre sabe [que é trans]. Sempre tive questões com meu corpo: eu queria ser uma gatinha, ter peitão. Mas tentava me convencer de que ‘ai, eu não sou isso’. Por eu ser da igreja, por fundamentalismo e por transfobia mesmo.”

O processo de se assumir a deixou com “a cabeça a milénio”. “Eu não conseguia mais me ver da forma uma vez que eu me via. Estava cansada de performar de uma forma que eu não queria, que eu não era. Precisava renascer”, diz. Escolheu para esse renascimento o nome de uma flor, que pudesse “crescer em um solo rico, onde fosse valorizada”.

Ramos não pensa em passar pela cirurgia de redesignação sexual, mas aguarda uma consulta do SUS onde solicitará terapia hormonal. Por enquanto, mudou a forma de se vestir e o cabelo. “Uma das primeiras coisas que fiz foi colocar uma trança até a bunda, belíssima. Tudo o que dava para mudar rapidamente foi importante para eu me sentir muito me olhando no espelho.”

Ela não se considera mais evangélica, mas acredita fielmente em Deus, nas suas palavras. “Precisei desvencilhar o Deus da religião do Deus que de indumento é, que é meu colega, que não me odeia por ser quem eu sou. Deus é meu lugar de conforto.”

A atriz, que mora com uma tia que é pastora, diz que a família inicialmente estranhou da mudança, mas se acostumou. “Minha tia já me labareda pelo nome Jasmin. Ela ainda troca os pronomes masculino e feminino, mas sinto que a gente está caminhando”, diz.

Na escola, a amizade com outros amigos LGBTQIA+ a protegia de atos explícitos de discriminação. Na rua, ela percebe olhares tanto de ódio quanto de fetiche. “Hoje em dia escolho muito os lugares aonde eu vou.”

E onde ela quer estar profissionalmente a partir de agora? Ainda pensa em cursar jornalismo e aguarda o resultado de uma seleção para um cursinho popular. Mas diz que foi atingida pelo “foguinho do audiovisual” e também tenta conseguir bolsa para qualquer curso de teatro.

As questões práticas, porém, são inescapáveis. “Não vou mentir, eu sou um corpo periférico e a gente precisa sobreviver. Preciso ter um trabalho fixo. Tenho o sonho de ter minha própria casinha, meu espaço”, diz. “Quero tentar conseguir um trabalho que não me deixe tão exausta, que também dê para eu estudar e passar detrás de novos projetos.”

Para Chica Andrade, Ramos tem tudo para ser um novo talento do cinema vernáculo. A diretora, que cresceu em uma favela da Baixada Santista e também tem um histórico de repudiação familiar por ser trans, começou no set de cinema uma vez que cabeleireira e se formou em direção teatral e cinematográfica. Sua curso deslanchou com o curta “Estamos Todos Cá”, premiado em 42 festivais e ficou elegível ao Oscar em 2018.

Para “House of Hilton”, ela acompanha a parlamentar desde sua campanha para deputada, em 2021. No ano pretérito, passou uma temporada em Hollywood por um programa da Universidade da Califórnia, recebendo mentoria para finalizar o roteiro. O filme não utiliza moeda público e é financiado por investidores internacionais.

Andrade diz que quer “furar a bolha” e atingir um perfil grande de audiência. “Estou batalhando muito para que não seja um filme só para a minha comunidade. Quero que seja um bom entretenimento para todos, uma história emocionante”, diz.

Folha

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