Reginaldo faria, 87, vence a timidez com disco ao violão

Reginaldo Faria, 87, vence a timidez com disco ao violão – 13/05/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

É deleitável conversar com um violonista e perceber que ele tem muito a expor sobre seu instrumento. Se ele cita uma vez que influências alguns gênios do violão clássico dos últimos dois séculos, uma vez que o italiano Matteo Carcassi e o espanhol Emilio Pujol, isso é mais surpreendente ainda quando o entrevistado tem um rosto publicado de novelas que fizeram a história da TV brasileira e filmes incontornáveis do cinema pátrio.

Aos 87 anos, Reginaldo Faria vence uma timidez quase patológica em relação ao seu lado de violonista e compositor. Chega agora ao mercado o álbum autoral “Violão”, pelo selo Kuarup. Entre as 13 faixas instrumentais, uma que foi criada quando o ator tinha 13 anos, “Trânsito Maluco”.

Faria teve chance de iniciar curso no violão antes de ir para a atuação. Mas foi impedido por um bloqueio psicológico. Ele estudava com Antonio Rabello, em Friburgo, onde nasceu, e um dia ouviu do professor que estaria pronto para fazer um recital na Sala Cecília Meireles, no Rio de Janeiro. “Quando ele disse isso, travei de tal maneira que nunca mais toquei para ninguém”, conta, rindo.

Mesmo sem coragem de mostrar sua música aos outros, ele continuou compondo. Há mais de dez anos —”ou mais, talvez uns 20″—, Faria gravou as faixas de “Violão” com Ricardo Leão. “Fizemos no estúdio dele, que cria músicas para novelas e programas de televisão. Ele fez comigo a trilha sonora para o último filme que eu dirigi, chamado ‘O Carteiro’, lançado em 2010.”

O planeta —nas telinhas com a reprise da romance “Tieta” no Vale a Pena Ver de Novo, em sua última semana— guardou as gravações uma vez que recordações, mas os filhos começaram a pressionar para que mostrasse às pessoas.

Desse material “escondido” saiu “Violão”, de peças curtas e criativas. É curioso que quase ninguém acertaria qual delas é a música escrita quando ele tinha unicamente 13 anos, porque “Trânsito Maluco” é uma das mais complexas, com pegada jazzística que ali aparece mais intensa do que no resto do álbum.

“Eu ia muito ao cinema, e em Friburgo não tinha repreensão. Qualquer garoto entrava, até no pescoço da mãe, para ver filmes violentos ou não. E eu fiquei impressionado com o jazz e o blues, com aquelas coisas americanas. Aí um dia comecei a fazer esse ritmo no meu violão, fui me entusiasmando, e acabei terminando a música.”

O material de “Violão” não é a estreia fonográfica de Faria. Em 1971, ele dirigiu o filme “Para Quem Fica, Tchau”, e escreveu para a trilha sonora “A Estrada Azul” e “Tema de Maria”, com letras de Paulo Mendonça. Elas foram gravadas por um iniciante Ney Matogrosso e lançadas em compacto. Foi a estreia de Ney nos estúdios.

Faria acredita ter um bom ouvido músico. “Cresci circunvalado de amigos de Friburgo que tocavam violão. A gente saía para fazer serenatas, aquelas serenatas nas quais você podia levar um penico de mijo na cabeça”, lembra, rindo muito. E foi numa rossio da cidade que teve seu primeiro encontro com Nara Leão.

Ela estava com o pai, sentada num banco. “Era uma era em que a gente podia permanecer nos bancos das praças à noite sem ser agredido ou assaltado. Era um sossego. A gente podia ouvir o fragor do sujeito varrendo o pavimento, lá do outro lado da rossio”, brinca. Um colega apresentou Faria a eles, contando que era um violonista.

“Nara estendeu o violão dela para mim, eu toquei uma música clássica, e o pai dela… Muito, ele ainda não tinha a percepção totalidade do que a Nara fazia e poderia fazer. Logo ele ficou empolgado com aquele outro lado, do clássico. ‘Isso é que é música, minha filha!’. Ela não gostou, ela queria a bossa novidade.” E Faria ganhou uma amiga e uma professora.

“A Nara me deu o telefone dela e, quando fui morar no Rio, passei a ir tocar na lar dela. Ela começou a me dar aulas de bossa novidade, e eu não aprendi zero! Eu não conseguia, minha música era outra, baseada numa escola clássica espanhola. Eu fazia violão solo, não sabia fazer a batida e trovar ao mesmo tempo. Mas eu e Nara ficamos grandes amigos.”

Faria acredita que não romperá a barreira da timidez para tocar diante do público, mas deseja deixar suas músicas para quem quiser tocá-las. “Tenho um caderno com 60 músicas já em partitura, que pretendo lançar em livro.” Falando em publicações, ele pegou dez roteiros de cinema que escreveu nos últimos anos e, sem chance de fazer os filmes, tratou de transformá-los em romances. “Estou à procura de um editor!”

Ele acaba de atuar em dois filmes, ainda inéditos. “Velhos Bandidos” é uma comédia com Fernanda Montenegro, dirigida por Claudio Torres. E participou de “A Lista”, de José Alvarenga, também uma comédia dramática, com Lilia Cabral e Tony Ramos.

Folha

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