Enquanto tomava um moca e passeava pelas páginas do jornal francesismo Le Monde na varanda do casarão onde logo funcionava o já clássico restaurante da família, Gero Fasano, ainda em seus 32 anos, teve, de súbito, os olhos roubados da leitura.
A vista de um imóvel do outro lado da rua Haddock Lobo, nos Jardins, foi porquê um facho de luz em uma noite escura. O prédio muito poderia ser transformado em um bistrô à côté, versão mais informal de um restaurante estrelado, novidade que começava a despontar em Paris, porquê acabava de ler.
O prédio cobiçado por ele abrigava uma espécie de cozinha secundária da antológica boate Gallery, ponto mais badalado da metrópole entre os anos 1980 e segmento dos 1990. Corria a bocas largas na região que estava prestes a virar uma charutaria.
Bisneto de Vittorio, neto de Ruggero e rebento de Fabrizio Fasano, personagens que marcaram a cena e a história da subida gastronomia italiana em São Paulo, Gero não titubeou: a construção de número 1.629 haveria de homiziar uma versão mais informal do Fasano, nem que, para convencer o proprietário, tivesse de postular e até entornar lágrimas. E assim foi, segundo o relato do próprio Gero Fasano, ao lembrar o promanação, 30 anos detrás, do bistrô à côté que levaria o seu nome.
Imóvel alugado, o momento seguinte era o de transformá-lo em um restaurante.
Gero convidou para tocar o projeto o mexicano Aurélio Martinez Flores (1929-2015), possuinte de uma arquitetura de linhas puras e simples, sem ser simplista, com poucos elementos, mas rica em qualidade e detalhamento.
Os dois embarcaram, na sequência, para Novidade York. Lá, visitaram galerias de arte no Soho, o bairro industrial de Manhattan que já era hipster naquela era, de onde saiu a inspiração para o projeto inovador do restaurante.
De volta a São Paulo, compraram um lote de tijolos gigantescos, de 150 anos, oriundos de uma demolição de uma antiga fábrica Matarazzo, uma das famílias precursoras da industrialização vernáculo.
De vista moderno e arrojado até hoje, a obra levou muro de oito meses para permanecer pronta. Toda a ambientação, a iluminação e o layout, por exemplo, são criações do próprio Gero. “Eu meto a mão em tudo. Não há zero que não passe pela minha aprovação.”
Desde a sua inauguração, em 1994, o Gero é um marco gastronômico de São Paulo. Não havia, até aquele momento, uma moradia que representasse a culinária da região setentrião italiana, a não ser a executada em restaurantes clássicos.
Assim, desde a estreia, conquistou uma clientela que se tornaria cativa, passando a frequentar a “elegante trattoria milanesa”, na definição do possuinte e restaurateur.
Com mesas do lado de fora, o restaurante sem pilar aparente pode ser descrito porquê uma espécie de versão cantina do “irmão” formal —no caso, o Fasano.
No cardápio, as massas frescas sempre mesclaram fórmulas tradicionais com outras mais inovadoras. Dois ou três anos depois a inauguração, o restaurante passou a ter “o menu mais copiado de São Paulo”, nas palavras de Gero.
“Os risotos foram os mais copiados”, diz ele. Segue: “O Fasano ganha por superioridade, já o Gero, por superioridade, por astral e por ser eclético”.
O salão de clima intimista e bar ingénuo costuma ser prestigiado por um público que vai dos 18 aos 90 anos. Com uma equipe afiada de 75 funcionários, também é lugar para ver e ser visto. Vive lotado. No almoço ou no jantar, é geral se deparar com executivos fechando negócios à mesa.
O Gero é o restaurante mais movimentado do Grupo Fasano. São quase 200 couverts servidos ao dia. Só de abobrinha, que vem em pratos e porquê chips de ingressão, o restaurante consome 4.000 kg/ano.
Sob a supervisão quase obcecada do restaurateur, há clássicos porquê o ossobuco ao lado de risoto de açafrão (R$ 226), o ravioloni de muçarela de búfala ao molho de tomate (R$ 145), a cotoletta alla milanese (costeleta de vitela à milanesa, R$ 227). Risotos? São nove. Só de pensar no de jerimum e camarão (R$ 232), a boca fica enxurrada d’chuva.
Alguns itens seguem no menu desde a fenda, porquê é o caso da salada caprese (R$ 99) e do ravióli de vitelo com creme de cogumelos (R$ 186).
Independentemente da escolha, vale a pena passar antes por entradas porquê a salada virente com aspargos e lulas grelhadas (R$ 99). Para harmonizar, há uma epístola generosa de 200 rótulos de vinho, sobretudo de grandes châteaux e produtores italianos.
De segunda a sexta (exceto feriados), o “mezzogiorno” (menu-executivo) sai por R$ 195, com ingressão, prato principal e sobremesa, todos eles com sugestões clássicas. Em média, são servidos 750 deles por mês. Ao contrário do que a gente costuma ver em outros restaurantes badalados da cidade, as opções são fiéis à tradição e à origem do restaurante.
Não existe alho na cozinha. “Se eu encontrar um cabeça de alho dentro do restaurante, o chef é exonerado”, avisa.
Possuinte de suas próprias regras e referto de ideias fixas, Gero relembra que não aceitou uma sugestão do arquiteto nascido em Puebla e radicado no Brasil que queria pintar de branco o interno do restaurante —ou seja, passar o pincel sobre os antigos e históricos tijolões. “Não cedi, assim porquê não cedo a arquiteto nenhum”, afirma.
Resultado: nos 48 minutos do segundo tempo, Aurélio Martinez Flores desistiu de ir à inauguração, conta o restaurateur, para quem o Gero “é atemporal e elegante hoje porquê será daqui a 50 anos”. Faz uma breve pausa e complementa com um ligeiro gostinho de vitória: “Se tivesse pintado de branco, não teria durado dez anos”.
Gero
R. Haddock Lobo, 1.629, Jardins, região oeste, @fasano