Satyros Atualizam Lorca E Questionam Mundo Binário Em Peça

Satyros atualizam Lorca e questionam mundo binário em peça – 25/07/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Longe da vizinhança, mas nem tanto. A estreia da peça “A Mansão de Bernarda Alba”, nesta sexta-feira (26), no Sesc 14 Bis, marca uma novidade temporada da companhia Os Satyros posteriormente uma dezena trabalhando em dramaturgias próprias, construídas e apresentadas coletivamente a partir de histórias do entorno de sua sede, na rossio Roosevelt, um trecho movimentado, boêmio e teatral da região medial de São Paulo.

Geograficamente, a intervalo entre a Roosevelt e o Sesc 14 Bis é de unicamente 1,5 km, 20 minutos a pé, 11 de carruagem. Fica logo ali. Na concepção da montagem, a transformação também não chega a ser radical. A trupe escolheu um clássico de Federico García Lorca, porém, irá apresentá-lo ao público com seu jeito transgressor e provocativo.

A tragédia chega ao palco do Sesc a partir do olhar experimental da companhia e com uma linguagem estética coloquial proposta pela direção. São três elencos que encenam três versões diferentes da peça.

Um dos elencos é feminino, outro é masculino e o terceiro, misto, é escalado ao vivo, com a participação do público a partir de um jogo colaborativo. Cada versão oferece perspectivas diferentes dos temas abordados.

E, segundo Rodolfo García-Vázquez, diretor do espetáculo, a “jam” teatral faz com que as possibilidades se multipliquem. São várias peças em uma só, com centenas de combinações cênicas, de gênero e raça. É um espetáculo múltiplo e questionador.

O caldeirão de tensões da lar de Bernarda Alba fervilha a partir de uma matriarca dominadora, que mantém as cinco filhas sob uma vigilância cruel e as silencia. É uma história de vexame às mulheres na segunda metade da dezena de 1930, às vésperas da ditadura franquista (1939-1975) na Espanha.

Ao gerar uma versão em que o drama é protagonizado por corpos masculinos, os Satyros fazem com que homens vivam situações tradicionalmente associadas à requisito feminina, mas que, de forma mais abrangente, simbolizam a violência institucional e social.

“O mundo é estruturado de forma binária e os papéis do varão e da mulher são socialmente construídos. O que queremos é mostrar as contradições desses papéis e porquê elas nos afetam”, afirma García-Vazquez. “A peça procura a provocação de tirar o público do binarismo de gênero”.

As questões de gênero e sexualidade fazem secção da trajetória da companhia desde a instalação, em 1989, com montagens de autores porquê Marquês de Sade ou baseadas na vida e obra de Oscar Wilde e Sappho de Lesbos.

A chegada à rossio Roosevelt, no ano 2000, intensificou as pesquisas a partir da convívio diária com a comunidade trans, a prostituição, os preconceitos e a repressão policial.

A obra do poeta e dramaturgo espanhol estava no horizonte há muito tempo. Uma das razões é a origem de um de seus fundadores, García-Vázquez, progénito de imigrantes que fugiram da pobreza posteriormente a guerra espanhola.

Aliás, ele e Ivam Cabral, também fundador do grupo, destacam o indumento de a dramaturgia, escrita em 1936, ainda ser contemporânea.

“Em Bernarda Alba temos a questão do estupro, do monstro (indiretamente, com a mulher que doa um rebento) e também a guerra. E vivemos uma guerra cá. Uma guerra de classes, que não é muito dissemelhante da espanhola”, analisa Cabral, pesquisador da encenação.

A montagem celebra os 35 anos da companhia, que já montou 145 espetáculos encenados em 36 países, ganhou prêmios nacionais e internacionais, é uma dos criadoras da SP Escola de Teatro, produz o Festival Satyrianas e tem importante papel na revitalização da rossio Roosevelt, inclusive com a restauração do Cine Bijou.

Nessa temporada madura e depois de “Aurora”, peça que começou a ser criada durante a pandemia e abordou a vida de moradores de um pequeno prédio na rua de mesmo nome, os Satyros decidiram olhar para os textos clássicos e pesquisar de que forma eles dialogam com o momento do país.

Encenaram, logo, “As Bruxas de Salém”, evocando a histerismo coletiva para falar do Brasil sob Bolsonaro, e agora estreiam o novo espetáculo.

“A Mansão de Bernarda Alba” vai suceder, no mesmo espaço, Fernanda Montenegro lendo Simone de Beauvoir, em uma temporada que atraiu público de 10 milénio pessoas.

É porquê uma bênção, mas também há tensão nesse enredo em que a trupe sai do palco recíproco da Roosevelt e chega a um teatro de 513 lugares, logo posteriormente o sucesso retumbante da grande atriz de 94 anos.

O lançamento do livro “Os Satyros – Teatricidades: Experimentalismo, Arte e Política”, das Edições Sesc, faz secção das comemorações do natalício. A obra, com textos e fotos, registra de forma analítica as produções cênicas, as pedagogias e as ações urbanísticas, sociais e culturais dos artistas.

Aliás, há o “lado B”: um processo da Associação da Moral e dos Costumes Escoceses, chocada com a montagem despudorada de “A Filosofia na Alcova” no Festival de Edimburgo de 1993; as ameaças de expulsão feitas por traficantes da região medial e a resistência à gentrificação da Roosevelt.

“O grupo trouxe para dentro de sua coxia, plateia e cenário a heterogeneidade do entorno, tematizando identidades marginalizadas e questionando, entre inúmeros postulados, a normatividade dos corpos”, escreveu Danilo Santos de Miranda em agosto de 2023, dois meses antes de morrer. Diretor do Sesc SP durante quatro décadas, Miranda assina o texto de preâmbulo do livro, em uma síntese da companhia que é a rostro do núcleo da capital

Folha

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