Desde outubro, uma vaga de protestos toma conta de Moçambique, posteriormente a divulgação dos resultados provisórios das eleições gerais. A Percentagem Vernáculo de Eleições divulgou resultado, que deu a vitória ao candidato da situação, Daniel Chapo, com 70% dos votos. Ele é o representante do partido Frelimo, que comanda o país desde 1975.
O resultado da eleição ainda precisa ser proclamado pelo Recomendação Constitucional de Moçambique. Mas não há um prazo para que isso aconteça, uma vez que explica o mensageiro do Brasil em Moçambique, Ademar Seabra, que há dois anos comanda a representação do Brasil na capital do país africano. Para ele, a situação em Moçambique ainda é tensa e imprevisível.
Enquanto isso, o candidato Venâncio Mondlane, do Partido Podemos, que ficou em segundo lugar na apuração solene, com 20% dos votos, vêm conclamando a população para uma série de protestos contestando o resultado provisório.
Ademar Seabra afirma que Moçambique não tem essa tradição de protestos entre a população, o que mostra um ineditismo. Pelas contas da oposição, mais de 40 pessoas já morreram nos embates com a polícia.
Confira os principais trechos da entrevista feita pela Rádio Vernáculo com o mensageiro.
Rádio Vernáculo: Moçambique vem vivendo nos últimos dias diversos protestos, com um pouco de violência. Uma vez que está sendo esse conflito?
Ademar Seabra: Nós temos evidências muito positivas e muito contundentes de que tenha havido já pelo menos 40 mortos nos confrontos entre a polícia e os manifestantes. Entre esses mortos constam alguns representantes da polícia também, da Polícia Vernáculo do país, embora a maioria sejam civis. Portanto é um quadro, eu diria, que é de violência, é difícil qualificar que é uma violência alastrada, uma violência incontrolada, mas por ocasião das manifestações já houve sim diversos episódios, diversos lugares do país, diversas intensidades, digamos assim, de seriedade.
Portanto é um confronto que tem nos preocupado muito, nós temos escoltado isso com muita mortificação, com muita angústia, desde essencialmente o dia 18 de outubro, quando essas manifestações de violência graves tiveram lugar, e a partir daí nós temos tido um contínuo, nós não sabemos uma vez que isso vai chegar, uma vez que isso vai aportar.
Rádio Vernáculo: Qual é a posição do Brasil em relação às eleições em Moçambique? A oposição critica o resultado do comitê eleitoral do Estado, do resultado que deu a vitória ao candidato Daniel Chapo, com mais de 70% dos votos. O Brasil acompanhou o processo eleitoral, foi convidado para ser observador? Uma vez que a própria diplomacia brasileira vê esse processo?
Seabra: O Brasil tem escoltado com lupa, com grande interesse, com grande participação, nós temos escoltado de perto e em tempo real. Na verdade, é um processo eleitoral, um processo doméstico, é um processo político, eleitoral e partidário. que nós naturalmente acompanhamos com interesse justamente por conta da centralidade que Moçambique ocupa nas relações bilaterais, mas nós participamos do processo eleitoral em si de maneira indireta através da missão de reparo eleitoral da CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa].
Essas eleições tiveram um um número de observadores importante, em termos quantitativos, numéricos, a maior missão foi da União Europeia. mas teve também da comunidade dos países da África Meridional, da própria União Africana e da CPLP, que foi também integrada por um diplomata, por um representante brasílico, na missão da CPLP. Todas elas atravessaram todo o processo eleitoral, produziram seus relatórios, indicaram nos relatórios tanto os pontos positivos quanto os pontos negativos desse processo.
O processo é um tanto que contrasta muito com a nossa verdade no Brasil. O cidadão brasílico, mormente o jovem brasílico, aqueles que nasceram nos anos 80, 90, que sempre tiveram processos eleitorais com base nas nossas urnas eletrônicas ou portanto na divulgação imediata de resultados e proclamação dos resultados também idem. Cá, ao contrário, o processo é lento. É um processo que teve início muito antes, com os recenseamentos, recadastramentos eleitorais de muitos meses anteriores, mas desde as eleições, que foram realizadas em 9 de outubro até agora, não há resultado.
Portanto o que há, sim, é a participação dessas missões, que acompanharam, verificaram, tomaram nota, fizeram recomendações, fizeram indicações do que aconteceu durante o processo. Isso foi manifestado através de relatórios, que foram naturalmente submetidos cá ao governo moçambicano, à guisa de imposto construtiva, de esteio construtivo desses observadores para o aprimoramento da democracia do país.
Rádio Vernáculo: Esses resultados são provisórios?
Seabra: Na verdade nós não sabemos ainda exatamente quando esse processo vai terminar, o processo jurídico propriamente dito. Logo posteriormente a realização das eleições em si, no dia 9, começa um grande processo no país de enumeração de votos, é enumeração manual, é enumeração de cesta a cesta, ou caixa a caixa, isso é levantado, são produzidos alguns relatórios, é produzida uma totalização. Três dias depois, esses distritos onde acontecem as eleições começam a vulgarizar os seus resultados parciais. E esses resultados que são compilados nos distritos são submetidos às províncias, que divulgam, por sua vez, também os resultados agregados por província. Nesses resultados agregados de províncias, já tem uma teoria do que aconteceu.
Portanto, todos os resultados foram apurados, depois divulgados, eles são centralizados nessa Percentagem Vernáculo de Eleições, que fez um proclamação provisório, que deflagrou justamente todo o processo de negação, toda a mobilização social, oposicionista da sociedade social, em relação a essa divulgação. Uma vez que ele tem sofrido muitas contestações, ele ainda será estimado pelo Recomendação Constitucional, que mal comparando ele faz o papel do nosso TSE [Tribunal Superior Eleitoral] no Brasil. Mas é um processo que ele vai e volta, ele tem muitos elementos. A própria processualística interna do CNE é um tanto técnico, complicado, demorado, no sentido que tem que considerar todas as considerações que vêm de diversas partes, diversas origens, tudo tem que ser estimado, tem que ser justificado, e esse processo está em curso.
Nós não temos ainda, oficialmente transitado e julgado, embora foi proclamado o Daniel Chapo vencedor, com 71% dos votos, e em segundo lugar ficou o candidato de um partido recém-fundado em Moçambique, chamado Podemos, que é um acrônimo para Povo Otimista para o Desenvolvimento de Moçambique, que foi a legenda que deu guarida a uma importante liderança oposicionista, que é o Venâncio Mondlane, que acabou se tornando hoje o grande líder, a grande sentença da oposição moçambicana no quadro político do país.
Rádio Vernáculo: Portanto, o Brasil aguarda esse pronunciamento do Recomendação para reconhecer a eleição?
Seabra: Uma vez que é a praxe da diplomacia brasileira, nós não fazemos reconhecimentos formais de eleições. Não é uma recomendação que nós tenhamos, independentemente do que seja, de qualquer situação. Você pode sujeitar cumprimentos, cumprimento, pode mandar uma felicitação a um candidato eleito, mas não é um pronunciamento, até porque é uma questão doméstica, é uma questão puramente que diz reverência à ordem interna moçambicana e que nós não temos muito uma vez que nos pronunciar, contra ou em prol. Essas manifestações geralmente não cabem na nossa diplomacia em relação a processos eleitorais dessa natureza.
Mas nós temos que, naturalmente, esperar o desfecho do processo. Portanto, o momento agora é de séquito, muito criterioso, muito solícito. E sobretudo, muito seletivo no meio do canhoneio de notícias que nós temos, de informações, nós precisamos ter muita transparência em relação ao que está se passando para justamente a gente poder se pronunciar com qualidade e mando.
Rádio Vernáculo: O partido de Venâncio Mondlane se manifestou em relação a prisões políticas de pessoas que se manifestaram, prisões em volume, denúncias sobre a violência da polícia. Uma vez que você, uma vez que mensageiro, avalia essas denúncias que a oposição vem fazendo?
Seabra: As manifestações, geralmente, não são uma vez que nós conhecemos no Brasil. Nós tivemos manifestações populares na nossa história, tivemos incontáveis delas, desde a idade do regime militar e geralmente nós colocamos multidões nas ruas. E cá não é muito isso, o que existe é uma pulverização, existem protestos praticamente em todo o país, mas em grupos não muito grandes, grupos de algumas centenas. Alguns casos, poucos milhares se reúnem, e é evidente que nesses casos há um confronto, a polícia é preparada e ela está pronta para reprimir esse tipo de sintoma, mormente em alguns casos onde havia uma intenção de que algumas instituições-chave do Estado pudessem ser fim de protesto direto por esses grupos que estão justamente a reclamar pelo que eles dizem, pela restrição da verdade eleitoral, ou, no caso, pelo termo da violência, e também em pena, que seriam abusos em relação ao tratamento de direitos humanos em algumas relações das manifestações.
Isso é a tarifa que a oposição tem trazido para as discussões cá. Portanto, é um tanto que nós temos escoltado, procurado verificar, para saber não somente a verdade, a proveniência, mas é importante nós saibamos com transparência as circunstâncias, também para que nós não, procuramos fazer avaliações com base em juízos muito aparentes.
Mas é evidente que é uma situação que não se pode de forma nenhuma minuir, é uma situação dramática que já com certeza gerou muitos mortos, que já gerou centenas de feridos com certeza, dos dois lados, com a maioria inclusive sendo dos manifestantes certamente, mas também policiais. Foi uma caixa de Pandora que foi ocasião em qualquer momento pela primeira vez na história do país.
Rádio Vernáculo: Podemos manifestar que a solução dessa situação ainda é imprevisível
Seabra: Diria que sim. Existe hoje um debate político em Moçambique, através das instituições da sociedade social, das universidades, dos intelectuais, que é um debate de altíssimo nível, um debate com o qual eu tenho aprendido muito e tem sido aventada diversas soluções para transpor da crise. Estamos num momento de embate puro e simples de forças, e não é um embate que tenha pervertido ainda, queira Deus que não chegue a esse ponto, mas ou em guerra social ou em confrontos.
A mensagem que tem sido passada aos manifestantes é que atuem com moderação, com reverência à propriedade privada, com reverência aos negócios e ao negócio. A mensagem que eu tenho ouvido muito cá, tanto da oposição, e o governo também se manifestou já nesse sentido, de buscar algumas conciliações possíveis, de buscar diálogos, caminhos de diálogo, e de reverência até à própria polícia.
É um tanto inédito porque é uma questão que tem a ver com a disputa eleitoral e uma negação ocasião, direta e muito firme a um processo eleitoral que nunca houve antes. Mas, por outro lado, isso não quer manifestar que seja uma sociedade crispada ou com clivagens de antagonismos, de inimigos, de adversários a serem eliminados. Não, não há. Portanto há uma predisposição positiva para que uma solução pacífica prevaleça. Mas não há nenhum elemento, dificilmente poderia malparar, porque tem muitos cenários.