Algumas das tendências que se firmaram nas passarelas da última edição da São Paulo Fashion Week têm tudo para dividir opiniões, e são do tipo ame ou odeie. Entre elas, está a transparência e a escassez de sutiãs por insignificante de vestidos, camisas e saídas de banho. Ou as inúmeras opções de saias para homens —rodadas, usadas por cima da calça, em comprimento longo e até mini. E ainda a escolha de motivos infantis, uma vez que personagens da Disney, para exarar roupas adultas.
As propostas das principais grifes nacionais podem toar disruptivas e controversas ao mesmo tempo, dentro e fora das passarelas. A aderência a elas nas ruas uma vez que uma possibilidade real é uma incerteza. Ao menos sete marcas dentre as 41 da última SPFW, que encerrou seus desfiles neste domingo, apresentaram peças nas quais os seios das modelos ficaram à mostra.
Uma delas foi Weider Silveiro. Inspirado por festas tradicionais do Nordeste, o estilista mostrou evolução nesta coleção com volumes arredondados, recortes e assimetrias. Há algumas temporadas o instituidor piauiense mostra um lado nostálgico. Todas as suas últimas coleções partiram de lembranças antigas. A atual não foi dissemelhante.
Suas principais referências são elementos de manifestações culturais uma vez que o reizado, o maracatu, o pau-de-fitas e o São João. Daí vêm os xadrezes que encerraram a apresentação e as tiras, que lembravam bandeirinhas decorativas. Já seus vestidos rendados e sem revestimento, sobre os corpos das modelos, mais revelavam do que escondiam
Outra marca que incorporou as peças vazadas à coleção foi a cearense Catarina Mina, que também buscou inspiração nas origens da estilista Celina Hissa para inventar seus looks. No desfile “Herdeiras do Porvir”, a grife trouxe de volta o trabalho manual uma vez que o crochê, o macramê, o bordado e a renda de bilro e ainda adicionou a borracha da Amazônia à mistura. O material, feito em parceria com a marca Da Tribu, apareceu em franjas aplicadas a tops, bolsas e vestidos de malha estruturada. A etiqueta explorou suas blusas e vestidos vazados sem top ou sutiã por insignificante.
“As ruas talvez ainda não estejam preparadas, mas o ponto principal é que não precisamos da aprovação das ruas —ou de qualquer outra pessoa. A gente também indaga e se questiona sobre nosso papel em questionar e gerar mudanças naquilo que as ruas querem ou não ver. É nosso papel questionar para que novos paradigmas e formas de se vestir surjam”, afirma Hissa.
Se na Europa e nos Estados Unidos, o movimento “free the nipple”, ou liberte o mamilo, por exemplo, ressoa e tem entre seus nomes mais proeminentes a protótipo americana Kendall Jenner, por cá o conservadorismo o rechaça.
A atriz Bruna Marquezine foi uma das vítimas. “Fui muito muito tratada a noite inteira por todos que cruzaram meu caminho. Não se preocupe comigo e nem com os meu peitos. E eu estou na Europa, cá é normal. Não é essa cafonice do Brasil que só aceita ver teta em coche emblemático no Carnaval”, disse ela, depois de tolerar ataques nas redes sociais por usar um vestido transparente em Paris.
Outras marcas que também apresentaram esses looks controversos nesta SPFW foram Lilly Sarti, Handred, Apartamento 03, À La Garçonne e Another Place.
Já a introdução de outra tendência polêmica, a de saias para os homens, ficou por conta de etiquetas uma vez que João Pimenta, Dendezeiro, Lino Villaventura e Martins.
João Pimenta construiu um drama com capas, laços e franjas. Suas versões masculinas de minissaias reforçaram a veia subversiva do designer. A alfaiataria, seu carro-chefe, seguiu em posição de destaque. Ela apareceu com materiais acetinados ou transparentes, em texturas tipo tweed e com motivos geométricos e oversized.
“Nordeste está na lar, portanto deixa que eu me apresento.” O verso, do rapper alagoano Jonas Miguel, ecoou na passarela da Dendezeiro. Nesta temporada, a marca baiana resgatou a história do sertão brasiliano. O tema, que até pode ser um velho publicado na tendência, fugiu do caricato desta vez.
As tradições do artesanato da região estavam lá em forma de saias trançadas de palha e blusas de miçanga de madeira. Nas peças de tapeçaria, havia referências às selas de cavalo. E, na cartela de cores, os tons terrosos da grife surgiram em uma versão mais quente, uma vez que o sol escaldante e alaranjado das áreas semiáridas. Um dos maiores destaques foi uma enorme saia masculina estruturada, num look constituído só com um chapéu uma vez que inferior.
Se por um lado marcas buscaram no Brasil profundo suas inspirações de trabalho, outras se renderam ao universo das crianças. A tomada de personagens infantis na tendência marcou esta edição da São Paulo Fashion Week, que apresentou roupas desnecessárias e com faceta de merchandising, uma vez que os vestidos com a Mônica e o Cebolinha estampados de Walério Araújo e a coleção temática sobre Pato Donald da The Paradise, marca que botou até a Margarida na passarela.
Os estilistas Thomaz Azulay e Patrick Doering defenderam sua coleção. “A The Paradise é uma marca que acredita na fantasia, e ela não é exclusiva do universo infantil. A Disney é um universo de arte e geração, que há mais de século anos cria uma grande interseção entre adultos e crianças através da dificuldade artística e de uma construção muito concreta de marca”, afirmam. “Silhuetas sinuosas, detalhes utilitários, camisaria desconstruída, e o flerte com a praia são nossos códigos para nos discursar com o nosso público, que é definitivamente adulto. Não precisa ser moço para se divertir!”
O contraste também marcou o retorno aos desfiles da Salinas, grife veterana de tendência praia. Materiais uma vez que palha, ráfia e renda feitas de maneira artesanal se alternavam com texturas mais sofisticadas e versáteis, uma vez que jacquard e lycra misturada com lurex. Aplicações de cristais Swarovski e penas de boá nas peças de banho em looks compostos com brincos gigantes, cintos, braceletes chamativos, muito uma vez que os saltos de plataforma altíssimos, demonstram a expectativa da marca de se solidificar também no envolvente urbano.
Outro desfile digno de nota foi o da Artemisi, da estilista Mayari Jubini, que levou 26 looks. As superproduções iam de longos de sarau a um visual motorizado, com um enorme inferior de ferro rotatório nas costas. O ponto de partida da coleção foi o movimento de arte cinética, que nasceu na dez de 1950. Dele, vem a preocupação pelo futurismo da designer.
No desfile de fecho da SPFW, um dos mais bonitos do evento, Fernanda Yamamoto levou o público para a dimensão externa do Pavilhão Nipónico, no parque Ibirapuera. Os modelos —de todas as idades e tipos de corpos— desfilaram sorrindo, ao som de um conjunto de tambores orientais escoltado de coro.
Seus tradicionais plissados apareceram num vestido azul roial com capuz e num prática masculino em off-white. Mas o que roubou a atenção foi um conjunto de peças em preto com com detalhes ou porções inteiras em dourado, tanto sólido quanto desgastado, que casava com as joias de formas esculturais de Carlos Penna.
Os atrasos marcaram mais uma edição da SPFW, que contou com desfiles começando até duas horas depois do previsto, com um público que disputava assentos em salas muito quentes. Um ponto positivo desta edição foi o retorno do evento ao Ibirapuera, no Pavilhão das Culturas Brasileiras, depois algumas edições realizadas em shoppings de luxo da cidade.
