Thiago Amud Anda Para Frente Ao Mover águas Passadas No

Thiago Amud anda para frente ao mover águas passadas no caudaloso mar de canções do álbum ‘Enseada perdida’

Celebridades Cultura

Caetano Veloso e Chico Buarque participam do disco em que o grande compositor e arranjador carioca se situa entre a tradição e a vanguarda da MPB. Capote do álbum ‘Enseada perdida’, de Thiago Amud
Luisa Dörr
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Enseada perdida
Artista: Thiago Amud
Cotação: ★ ★ ★ ★ 1/2
♪ Quando Zeca Veloso disse a Thiago Amud que Caetano Veloso gravaria a Cantiga de ninar o mar e que Chico Buarque tinha se interessado em pôr voz no frevo Cidade possessa, o rebento de Caetano detonou em Amud a disposição de gravar o quinto álbum de discografia solo iniciada há 15 anos com o álbum Sacradança (2010).
Quem revela o mecha é o próprio Amud no texto que escreveu para a contracapa da edição em LP do álbum Enseada perdida, no mundo desde ontem, 29 de janeiro, em edição da gravadora Rocinante.
A questão é saber se as presenças de Caetano e Chico terão o poder de ampliar junto ao público o alcance da obra deste cantor, instrumentista, arranjador e (magnífico) compositor carioca. Há quatro anos, o artista pediu passagem com o enredo iluminado do quarto álbum, São (2021), mas foi pouco ouvido.
Disco gravado com produção músico de Alê Siqueira, sob direção músico do próprio Thiago Amud, também instituidor dos arranjos, Enseada perdida se mostra também majestoso ao perfurar alas para o Carnaval com músicas uma vez que o frevo folião cantado por Amud com Chico – e cabe ressaltar que Cidade possessa é elaboração de arquitetura tão engenhosa quanto o cancioneiro do convidado da filete.
Além do frevo com Chico, outro destaque do repertório é o superabundante samba-enredo Baía de Janeiro, tema que parece mergulhado em águas já revolvidas em outros Carnavais pelo bamba João Bosco sem diluir a assinatura própria de Amud.
O samba Baía de Janeiro foi formado para o enredo de A baleia, (ainda inédito) filme de Felipe Bragança e Marina Meliande, mas reflete movimento do próprio Amud, que se achou perdido no Rio de Janeiro (RJ) ao voltar para a cidade em seguida viver em Belo Horizonte (MG) durante a pandemia de covid-19.
Entre achados e perdidos, as águas se acalmam nas profundezas da Cantiga para ninar o mar, cantiga imersa entre a tradição – e nessa maré pode-se identificar até o mar desbravado por Dorival Caymmi (1914 – 2008) na Bahia a partir dos anos 1930 – e a vanguarda que pontua o álbum Enseada perdida. Cantiga para ninar o mar fecha de forma sublime o trajectória de um disco que corre o risco de tanger hermético ao longo de 11 faixas.
Em safra autoral de geração quase solitária, Reza à serpente grande tem letra de poética sofisticada, escrita por Amud com narrativa amazônida a partir de melodia de Luiza Brina caracterizada pelo artista uma vez que “mântrica”. A inventividade do conserto engrandece a filete e sinaliza que, na obra de Amud, a forma potencializa a força do teor.
Tal sensação é reiterada pela orquestração noise da música Se você pensasse – cuja forma progressista faz paradoxal conexão com a cabeça pensante de Walter Franco (1945 – 2019) nos idos de 1972 – e pelo conserto que faz a cantiga Planta-múndi saltar no ar, sem rede de proteção.
No conjunto da obra, o álbum Enseada perdida é disco de digestão mais difícil do que o predecessor São. Nos requebros de Dela ou no clima dionisíaco de Penteu, cuja melodia foi criada por Sylvio Penedia (creditado com diretor artístico do disco ao lado do próprio Amud) a partir dos versos escritos por Amud com inspiração no texto da peça grega As bacantes (450 a.C.), o artista muitas vezes se distancia propositadamente do formato convencional da cantiga nas 11 faixas do álbum Enseada perdida.
Criados em dois meses e meio, com a intenção de “radicalizar contrastes”, uma vez que ressalta Amud no texto da contracapa do LP, os complexos arranjos fazem de Enseada perdida um álbum que será exaltado pela sátira ao mesmo tempo em que será degustado somente em reduzidos nichos de músicos e consumidores com ouvidos mais abertos para a invenção.
O viço das orquestrações – executadas por time de instrumentistas formado por ases uma vez que Alexandre Caldi (flauta e saxofone), Elisio Freitas (guitarra e violão), Luizinho do Jêje (percussão), Marcelo Galter (piano e clavinet), Marlon Sette (trombone) e Sérgio Krakowski (pandeiro), entre outros virtuoses – valoriza músicas uma vez que Dinamismo (com luxuriante base percussiva) e a toada O relâmpago.
É nesse traço generalidade entre as faixas que reside a “unidade insuspeitada” mencionada por Thiago Amud ao termo do texto da contracapa em que revela conceitos que servem uma vez que bússola para que o ouvinte não afunde no caudaloso mar de canções do álbum Enseada perdida.
Thiago Amud canta o frevo ‘Cidade possessa’ com Chico Buarque e a ‘Cantiga para ninar o mar’ com Caetano Veloso
Luisa Dörr / Divulgação

Fonte G1

Tagged

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *