O bairro Oswaldo Cruz, na zona setentrião do Rio de Janeiro, recebeu neste sábado (7) sambistas que fizeram a história do gênero músico não somente no Rio, mas em todo o país.
O tradicional Trem do Samba, que está na 29º edição, reuniu velhas guardas, rodas de samba e reis momos, em uma sarau para comemorar o Dia Pátrio do Samba, comemorado em 2 de dezembro.
A sarau começou na estação Mediano do Brasil, onde um palco foi montado para diversos sambistas se apresentarem durante a tarde. A partir das 18h04, o samba foi transferido para os vagões dos trens que levaram um público de cariocas, turistas, amantes do samba e curiosos para o bairro que, ao lado de Madureira, é o causa da Portela e do Predomínio Serrano, duas agremiações com poderoso história ligada ao samba.
Ícone do gênero músico, pastora da Velha Guarda e presidente de honra da Portela, Iranette Ferreira Barcellos, conhecida porquê Tia Surica, foi uma das sambistas que ocupou o palco da Mediano do Brasil.
“É o encontro dos sambistas. Portanto isso para a gente, que já é veterano, é fundamental”, disse e citando Dorival Caymmi falou da valia do ritmo.
“Pra mim, o samba é tudo, sem o samba eu não sou ninguém. Você vê, né, quem não gosta de samba, bom sujeito não é”, sorriu.
Tia Surica tem uma longa história no samba. Em 2003 começou a preparar a tradicional feijoada, na própria morada, para reunir sambistas que participaram da gravação de seu primeiro CD. Hoje, a Feijoada da Tia Surica é Patrimônio Histórico e Cultural do Estado do Rio de Janeiro.
Ela conta que tem um samba que pelo qual guarda uma predileção: Memórias de um Sargento de Milícias. Em 1966, ela foi uma das puxadoras desse samba-enredo, de autoria de Paulinho da Viola, que levou a Portela a ser campeã do carnaval do Rio de Janeiro naquele ano: “eu nasci no samba e vou morrer no samba.”
Além de integrantes das velhas guardas das escolas de samba, o palco recebeu também figuras simbólicas do carnaval: os Reis Momos. “Se tem samba, tem que ter Rei Momo”, disse o presidente da Associação dos Reis Momos, Alex de Oliveira, que convidou Reis Momos de todo o país para estarem presentes no evento.
O Rei Momo é uma figura milenar da mitologia greco-romana, cultuava os banquetes e as festas. Desde a dez de 1930, passa a simbolizar o carnaval. Para Oliveira, ele representa também um pouco muito mais poderoso:
“A inversão de valores. Mostrar que todos aqueles que têm muitas dificuldades, no carnaval, se tornam reis. Essa é a valia maior. Todo mundo perceber que a magia do samba é esse poder de transformar nossas realidades”.
Essa transformação está nas letras. Em um dos vagões do Trem do Samba, a Velha Guarda da escola Predomínio Serrano, evoca o grupo Fundo de Quintal: “O show tem que continuar”.
Trem das 18h04
O Trem do Samba é inspirado na viagem de trem que Paulo da Portela, fundador da escola de samba que viveu entre 1901 e 1949, e outros sambistas, faziam no início do século 20, para fugir da repressão da polícia ao gênero músico.
Exatamente no mesmo horário que eles seguiam para Oswaldo Cruz, às 18h04, partiu da Mediano o primeiro trem, levando as velhas guardas das escolas de samba e convidados até o término do trajeto. Em cada vagão, uma roda de samba.
O samba é resistência, surgiu em comunidades afro-brasileiras e é frase músico propriedade dos bairros pobres. Não foi somente na quadra de Paulo da Portela que era atacado. Ao longo da história, o gênero que hoje é Patrimônio Cultural Impalpável brasílio já teve muitos de seus integrantes perseguidos.
Durante os anos do regime militar, por exemplo, a repressão e a repreensão se impuseram às atividades dos sambistas. Até aquele momento as batidas policiais que sofriam eram por discriminação porque os sambistas eram considerados uma categoria marginalizada da sociedade. Com a ditadura, a situação se agravou.
“Os nossos bens todos são imateriais, cá é uma espécie de um museu dos bens imateriais. O Trem do Samba é uma espécie de restaurador dessas obras de arte porque faz com que a gente não esqueça. Essa para mim é a valia maior”, diz o anfitrião do Trem do Samba, Marquinhos de Oswaldo Cruz.
Samba é raiz
A comentador judiciária Isabel Cristina de Souza, 49 anos, e o marido, torneiro mecânico Samuel de Souza, 58 anos, reuniram um grupo de Campo Grande, na Zona Oeste da cidade, para saber o evento. Vestindo abadás customizados, eles aprovaram a sarau.
“Particularmente eu sou roqueira, mas paladar de samba, até porque ele entra na nossa raiz, né? A gente queria saber queria saber porquê é que é”, disse Isabel. “A gente está amando”.
Para os veteranos na sarau, a contadora Marcelle Liberato, 37 anos e o marido, o mecânico industrial Renato Liberato, 37 anos, samba é família.
“Esse evento cá pra gente é tradicional. Todos os anos a gente vem. A gente gosta muito do Trem do Samba. A gente gosta de pegar um trem, descer cá e participar da bagunça, de trovar um pagode. Cá é a nossa cultura, faz secção. O samba representa minha família, a gente cresceu no samba, logo samba é a mesma coisa que família”, contou Marcelle.
A amiga do parelha, a servidora pública Fernanda Arcanjo, 34 anos Beatriz levou também a filha, Beatriz, 8 anos, que perguntada se gosta de samba, é categórica: “Sim”.