“vamos Continuar Existindo”, Diz Demógrafa Sobre Futuro Indígena

“Vamos continuar existindo”, diz demógrafa sobre futuro indígena

Brasil

O número de brasileiros que se identificam porquê indígenas cresceu quase seis vezes nos últimos 30 anos. Em 1991, eles eram pouco mais de 294 milénio, conforme revelou o Recenseamento Demográfico feito à idade. Em 2022, chegavam a 1,694 milhão, de negócio com o Instituto Brasiliano de Geografia e Estatística (IBGE).

O instituto atribui secção considerável deste aumento a mudanças na forma porquê o levantamento é feito a cada dez anos. Inovações que vêm sendo implementadas desde 1991, quando foi introduzida a opção “indígena” na pergunta sobre raça e cor do entrevistado. Para muitos pesquisadores e instituições governamentais e não governamentais, 1991 é porquê um marco da presença do indígena no Recenseamento Demográfico, pois é quando passam a ser recenseados sem serem alocados em outras categorias, porquê, por exemplo, os pardos. O próprio IBGE, todavia, também destaca que “alguns povos indígenas vêm revelando aumento [populacional] significativo em função de altas taxas de fertilidade”.

“A principal peroração é que vamos continuar existindo”, sentencia a demógrafa Rosa Colman. Graduada em geografia e doutora em demografia, a professora da Faculdade Intercultural Indígena da Universidade da Grande Dourados (UFGD) é a primeira e, possivelmente, a única técnico em estudos populacionais a se autodeclarar indígena no Brasil. Hipótese confirmada pela Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep).

“Acho que, em breve, devem nascer outros por aí”, aposta Rosa, para quem as políticas de cotas “têm motivado as pessoas, encorajando-as a se autodeclarem indígenas”, contribuindo com as estratégias de autoafirmação dos povos originários.

Nascida em Sanga Puitã, província de Ponta Porã (MS), na fronteira com o Paraguai, Rosa, que é da etnia aché (também conhecida pelo termo pejorativo guayaki), já foi intuito da discriminação e do mesmo descaso que ainda hoje levam muitos indígenas a negarem suas identidades. “O preconceito era muito poderoso e eu, na puerícia, fui muito chamada de bugrinha e ridicularizada por falar mal o português”, relembra a professora que, nos primeiros anos de vida, só se comunicava com os pais e com pessoas próximas em guarani. Hoje, ela se revela otimista. “Apesar de tudo, a situação vem melhorando […] e as pessoas querem se reafirmar porquê povo, porquê um grupo étnico.”

Leia, a seguir, trechos da entrevista que Rosa Colman concedeu para a série privativo sobre o porvir dos povos indígenas que a Escritório Brasil publica a partir desta terça-feira (16), por ocasião do Dia dos Povos Indígenas, lembrado na sexta-feira (19). Nos próximos dias, a Escritório Brasil publicará as entrevistas com a escritora Eliane Potiguara, o filósofo Daniel Munduruku e a ministra Sonia Guajajara.

Escritório Brasil: Desde o recenseamento demográfico de 1991, o número de pessoas que se declaram indígenas vem aumentando. Para a senhora, o que explica esse aumento?
Rosa Colman: Além do desenvolvimento proveniente da população indígena, houve uma melhora na metodologia de coleta dos dados sociodemográficos. Isso é alguma coisa muito evidente.

Escritório Brasil: E o que esse aumento sugere sobre o porvir dos povos indígenas?
Rosa: Prevejo que a presença indígena nos centros urbanos, já bastante perceptível, vai continuar aumentando. Principalmente pela procura de estudo e trabalho. Da mesma forma, a questão da mobilidade, ou melhor, da múltipla localidade, de pessoas que vivem entre a cidade e a lugarejo. A autoafirmação também tende a continuar aumentando conforme o contexto melhora. Acho que a principal peroração é que vamos continuar existindo.

Escritório Brasil: Por quais motivos mais pessoas passaram a se autodeclarar indígenas nas últimas três décadas e por que a senhora acredita que a autoafirmação tende a continuar aumentando?
Rosa: Apesar de tudo, a situação indígena vem melhorando em verificação a algumas décadas. Isso aparece nos dados e se torna mais poderoso a partir dos anos 2000. No universal, houve alguma melhora nas condições de saúde, de alimento. As políticas de cotas, por exemplo, têm motivado as pessoas, encorajando-as a se autodeclararem indígenas. Cá mesmo, na UFGD, só considerando indivíduos kaiowá e guarani, identificamos em torno de 50 pessoas cursando a pós-graduação. Isto já é um fenômeno. Embora ainda haja muito pavor e preconceitos, principalmente em contextos de disputas por terras, no qual muitos preferem se esconder.

Escritório Brasil: Na sua tese de doutorado, de 2015, a senhora já aponta que a subida taxa de desenvolvimento populacional registrada entre os guarani, nos 70 anos anteriores, é resultado de uma “política populacional étnica voltada para prometer a sobrevivência física e cultural”. Que estratégia é ou era essa?
Rosa: São políticas mais internas, de desenvolvimento físico e cultural. As pessoas querem se reafirmar porquê povo, porquê um grupo étnico. Portanto, eles falam que também é importante ter filhos para continuarem existindo e resistindo.

Escritório Brasil: Essa percepção de que os guarani e, eventualmente, outros povos, compreendem que ter filhos é alguma coisa importante para a sobrevivência cultural de seu povo é objeto de estudos acadêmicos?
Rosa: Pesquisa acadêmica eu desconheço, mas é o que percebemos a partir das nossas experiências no convívio e contato com os guarani, que reclamam quando alguém, ou mesmo o Estado, sugere que, sendo pobres, eles não deveriam ter tantos filhos. A gente escuta muitos relatos desse tipo. Inclusive de jovens estudantes indígenas que se sentem incomodados. Em termos acadêmicos, essa percepção é reforçada pela taxa de fertilidade indígena, maior que as registradas entre não indígenas. No Recenseamento 2010, enquanto a taxa de fertilidade entre a população não indígena era de 1,5 rebento por mulher, entre indígenas chegava a 3,8. O que ajuda a explicar, em secção, o desenvolvimento populacional.

Escritório Brasil: Na sua tese, a senhora também afirmou que o país não estava prestes para responder adequadamente a esse aumento populacional. De lá para cá, isso mudou?
Rosa: Ainda há muitas demandas por uma ensino e uma saúde indígena de mais qualidade. Ou por outra, a falta de estrutura, de condições básicas, ainda motiva muitas reclamações – e muitas dessas queixas estão relacionadas a casos de preconceito e discriminação nos serviços públicos.

Escritório Brasil: Porquê o IBGE é responsável por realizar o Recenseamento Demográfico, consultamos o instituto para saber se há, entre os colaboradores, qualquer geógrafo ou demógrafo indígena e não há. A Abep também nos informou que desconhece outro profissional autodeclarado indígena além da senhora. A senhora conhece qualquer outro indígena que atue nesta superfície?
Rosa: Não. Indígena, só uma, mas ela é do México. Estudou na Unicamp, mas atua no México. E há um colega, da etnia guarani, que atua bastante nesse campo, mas com estatísticas e que vem de outra superfície de formação.

Escritório Brasil: Porquê a senhora mesmo lembrou, há cada vez mais estudantes indígenas nos cursos de graduação e pós-graduação e esse campo em que a senhora atua é tão custoso para as comunidades indígenas e sempre presente nos debates acerca dos problemas que os povos originários enfrentam. Por que a senhora escolheu primeiro a geografia e, depois, decidiu se individualizar em demografia?
Rosa: Eu gostava de geografia. Acho que porque tive professores muito carismáticos que me incentivaram a fazer esse curso. Algumas colegas chegaram a sugerir que eu fizesse letras, já que falo guarani, mas, na idade, só havia turmas diurnas e eu acabei optando por geografia também porque havia a opção de estudar à noite. Já no mestrado, conheci a professora [e ex-presidenta da Funai] Marta [Maria do Amaral] Azevedo, minha orientadora, e a invitação dela fui fazer demografia na Universidade Estadual de Campinas [Unicamp]. Acho que há poucos indígenas atuando nessa superfície porque, até recentemente, só havia cursos de demografia nos grandes centros urbanos; em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais… Mas acho que agora já há estudantes indígenas na graduação, de repente, na pós-graduação, e, futuramente, devem nascer outros profissionais indígenas.

Escritório Brasil: Para finalizar, levando em conta a heterogeneidade étnica e cultural das mais de 300 etnias que coabitam o território brasílico, porquê a senhora imagina o porvir das comunidades indígenas?
Rosa: Acho que vamos seguir muito mais diversos e firmes. Muitos estarão morando em cidades, mas muitos seguirão vivendo em terras indígenas. Acredito que vamos conseguir demarcar mais terras e, assim, proporcionar segurança territorial a essas comunidades. E acho que, qualquer que seja o contexto, teremos muito mais entrada e domínio das inovações tecnológicas, pois, hoje, já observamos muitos jovens indígenas que as dominam.

Fonte EBC

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