A internet pode ser um milagre, mas também uma maldição. É logo que a diretora Celine Song define a tecnologia, que toma o papel de protagonista em seu longa-metragem de estreia, “Vidas Passadas”.
Mesmo com pouca experiência, a diretora vem colhendo louros aos montes pelo filme, que chega nesta semana aos cinemas brasileiros. Lá fora, além dos elogios de público e sátira, colecionou também cinco indicações ao Mundo de Ouro e mais cinco ao Spirit, devotado ao cinema independente.
“Relacionamentos a intervalo são muito dolorosos, porque com o passar do tempo, seu libido de tocar e estar com a pessoa cresce, mas a tecnologia continua a mesma”, diz Song em conversa por vídeo, improvisando um gráfico com as mãos –enquanto a esquerda, que simboliza a vontade de estar fisicamente com alguém, aponta para cima, a direita, que representa as possibilidades do mundo virtual, fica estagnada na nivelado.
“O que começou uma vez que um milagre, que nos fazia nos sentir num incidente de ‘Star Trek’, vira uma frustração. Sentimentos de raiva surgem –mas pelas limitações ou pela outra pessoa? Hoje a gente nem dá valor para essa tecnologia, mas quando ela surgiu era alguma coisa muito privativo.”
Sem a internet, o triângulo amoroso que move “Vidas Passadas” não existiria, assim uma vez que milhões de outras conexões ao volta do mundo, em privativo depois da invenção do Facebook, que reuniu uma infinidade de coleguinhas de escola que já passavam dos 30, 40, 50 anos de idade.
Um tanto semelhante aconteceu com a própria Song, que nos primórdios da rede social de Mark Zuckerberg, hoje decadente, reencontrou seu namoradinho de puerícia. Nascida na Coreia do Sul, a diretora se mudou com os pais para o Canadá quando tinha 12 anos, deixando para trás família, escola e amigos –muitos dos quais, ela conta, a reencontraram virtualmente para falar que viram seu filme.
É uma trajetória semelhante à da protagonista de “Vidas Passadas”, concebida à sua imagem. Nora, papel de Greta Lee, deixou o mesmo país quando tinha a mesma idade, rumo a Toronto. Por anos, ficou sem falar com Hae Sung, seu crush de puerícia, interpretado por Teo Yoo.
Agora uma mulher que vive sozinha em Novidade York, tentando uma curso uma vez que dramaturga –de novo, espelhando a trajetória de Song–, Nora descobre as maravilhas do Facebook quando Hae Sung pede para ser seu companheiro na rede social. A frivolidade do chat por texto se transforma em longas e frequentes conversas por Skype, até que, pela rotina corrida de ambos, as ligações acabam rareando.
Nesse meio tempo, ela conhece Arthur, personagem de John Magaro, por quem se apaixona e, eventualmente, com quem se vivenda. Mas eis que Hae Sung volta a falar com a amiga de puerícia, e a labareda reacende. Ele decide visitá-la em Novidade York e a tal vida passada que batiza o filme volta a ocupar a mente da protagonista.
Porquê seria sua vida se tivesse ficado na Coreia? Nora e Hae Sung estariam juntos? E agora, com o reencontro, seria sua relação com o sul-coreano mais poderoso que aquela que tem com o atencioso Arthur?
“Vidas Passadas” faz o testemunha se questionar a toda hora, uma vez que se estivesse na pele da protagonista, também perturbada pelo turbilhão de dúvidas. A confusão fica maior quando as diferenças idiomáticas entram em cena. Unicamente Nora domina o coreano e o inglês, e é uma vez que se pudesse intervalar entre uma e outra versão de si, dependendo da companhia.
“A natureza bilíngue do filme é muito importante. Muitos de nós, hoje, somos bilíngues, e todos temos partes que escondemos ou revelamos, dependendo da situação. Essa veras é secção fundamental do que significa ser um cidadão moderno e global”, diz Song.
“Leste filme começou com um momento biográfico da minha vida, quando eu e meu marido, americano, nos encontramos com o meu namorado de puerícia, coreano. Eu me lembro de estar sentada no bar, traduzindo o que um dizia para o outro. Eu não estava traduzindo somente idiomas diferentes, mas partes diferentes de mim. Foi um sentimento muito poderoso.”
Nem linguagem, nem tecnologia são, no entanto, os vilões de seu filme. Tampouco Arthur ou Hae Sung –o primeiro poderia facilmente ser ciumento a ponto de ser tóxico, e o segundo, o forasteiro que quer roubar a pequena. O tempo e o espaço são os verdadeiros vilões, diz a diretora –os 24 anos e o oceano Pacífico que separaram Nora e Hae Sung.
Para frisar essa percepção, Song confinou seus protagonistas em quartos diferentes enquanto filmavam o primeiro ato, virtual, do triângulo amoroso. Seus diálogos realmente aconteciam por videoconferência e, para reproduzir as limitações da tecnologia à quadra, a equipe manipulava os cabos de conexão à internet, deixando o som e a imagem nos computadores instáveis.
Não é só por tomar da trajetória de sua diretora que “Vidas Passadas” soa verdadeiro, portanto. O momento do reencontro dos namoradinhos de escola é, também, um registro da primeira vez que os atores Greta Lee e Teo Yoo estiveram frente a frente. O mesmo fator-surpresa foi usado para gravar o momento em que o último conhece o personagem de John Magaro.
As relações foram delicadamente construídas, tanto em cena, quanto no texto. Questionada se considera “Vidas Passadas” um romance, Song diz que sim e não. O filme fala de paixão, mas de um paixão dissemelhante, que vai muito além de querer ser o namorado ou namorada de alguém, e das pessoas que entram e saem das nossas vidas.
“É uma história sobre um paixão que não tem nome, sobre sentir alguma coisa e não saber o que é.”