Parceiro de artistas porquê Caetano Veloso e Arnaldo Antunes, gravado por intérpretes porquê Gal Costa e Marisa Monte, vencedor de um Grammy Latino porquê compositor, o santamarense Cézar Mendes é admirado por seus colegas e tem um punhado venerável de canções. Unicamente em fevereiro deste ano, porém, ele estreou um show seu.
O espetáculo, batizado de “Depois Enfim”, já passou por Salvador, Rio de Janeiro e agora chega a São Paulo, no Bona, onde ele se apresenta nesta quinta e sexta-feira.
Perguntado sobre porque decidiu levar ele mesmo suas canções ao palco, Mendes responde meio brincando, meio a sério: “O compositor está passando miséria, meu querido. Você não subiu no palco, não ganha quantia”. Na sequência, ele avança em outros motivos para a estreia tardia. “Eu precisava ter segurança, fazer canções que eu tivesse vontade de trovar”.
Sua primeira plateia contribuiu enormemente para alongar dele qualquer instabilidade. “Quando me convidaram para fazer o show na Mansão Rosa [em Salvador], eu pedi a Caetano para me ajudar a montar o roteiro, o que ele faz melhor do que ninguém”, diz Mendes. “Uma noite ele foi no meu quarto para ouvir o que eu estava preparando. Sentou e eu comecei a tocar. Quando vi, ele estava chorando. Disse: ‘Eu nunca tinha ouvido você tocando suas músicas assim, juntas’”.
O roteiro inclui a primeira música composta por Mendes, exatamente com Caetano: “Aquele Frevo Axé”, que batizou um álbum de Gal. Mendes já tocava violão desde menino, e era espargido porquê professor do instrumento —já deu aulas para Maria Bethânia, Muito Gil e Mulato Veloso, entre outros. Mas não se via capaz de inventar. “Eu achava tão poucas notas, parecia que era tudo tão repetido”, lembra o artista.
Foi Paula Lavigne quem o sugeriu fazer uma música com Caetano, em 1997. “Falei pra mim mesmo: ‘Você tá louco, face?’ Eu nunca tinha feito zero. Mas aí entrei num ônibus pra Itapuã e quando cheguei no meio do caminho, a melodia estava pronta, inteira”.
Desde portanto, tem sido assim com Mendes. O compositor de 73 anos não tem nenhuma disciplina em seu ofício, exclusivamente recebe a inspiração quando ela chega. “O Roberto (Mendes, seu irmão) senta no cantinho dele ali todo dia e faz três, quatro músicas. Eu não consigo. A minha vem quando ela vem”, sintetiza.
Suas melodias carregam mesmo uma venustidade de apelo direto e ar de standard, porquê se estivessem por aí há muito tempo mesmo quando você as ouve pela primeira vez. Sem malabarismos, com “poucas notas”, porquê ele diz. “São primas”, brinca ele. Os letristas — além dos citados Caetano e Arnaldo, a lista inclui Ronaldo Bastos, Tom Veloso, Marisa Monte, José Carlos Capinan e Zélia Duncan, entre outros — deitam seus versos ali com um conforto que chega ao ouvinte. Não há arestas. “São melodias redondas”, resume o compositor.
“Você não pode fazer melodia se não conhece Cole Porter e Carlos Lyra. É o mínimo”, diz Mendes, apontando duas referências centrais de sua música.
Uma vez que músico, ele tem experiência e já fez turnês com Adriana Calcanhotto e Tribalistas. Mas porquê artista principal, novato, a situação é dissemelhante. A cada show, quando o nervosismo bate, ele lembra o porquê demorou tanto em se lançar na façanha de um show próprio. “Quando dá o terceiro sinal, eu passo mal, vomito…”, diz. “Na noite anterior não durmo, é uma desgraça”. Mas o prazer compensa. “Quem não gosta de aplausos?”.
No Bona, Cézar Mendes tem a companhia de Tom Veloso (violão) e Tomás Improta (piano), além de participações especiais —Arnaldo Antunes na quinta, Mart’nália na sexta. O rebento mais novo de Caetano tem sido seu parceiro mais jacente. Foi uma das parcerias da dupla, “Talvez”, lançada por Caetano e Tom, que ganhou o Grammy Latino de Gravação do Ano em 2021. A constituição também está garantida no repertório.
Outra que tem presença certa é “João”, que o violonista compôs para João Gilberto, de quem o compositor se tornou colega em seus últimos anos. A letra de Arnaldo celebra o baiano de Juazeiro: “Quando uma só pessoa/ O silêncio aperfeiçoa/ Toda a poviléu/ Escuta o coração/ E se torna cultura”.
Agora que se assumiu porquê cantor, Mendes já tem novos planos na curso. Atualmente, pensa em seu segundo disco, desta vez dando sua voz às composições —em seu primeiro álbum, de 2018, elas foram interpretadas por convidados porquê Djavan, Carminho e Fernanda Montenegro. Ele quer que a atriz marque presença também no novo disco, ao lado de artistas da novidade geração. “Eu quero muito trabalhar com uma turma que tá chegando aí. Dora Morelenbaum, Zé Ibarra”, diz.
O músico conta que a coragem para trovar também veio de olhar para o cenário contemporâneo da música. “Estou vendo tanta gente cantando mal aí mesmo com ‘autotune’. Eu não desafino”, afirma. “E tem outra coisa: quando o compositor canta a música dele, você enxerga a música, a verdade dela”.
Diagnosticado com Parkinson, Mendes diz que a doença tem prejudicado sua locomoção e seu estabilidade. “Mas você sabe que pra quem tem música na psique, tudo fica ligeiro, né?”, diz. “O meu neurologista me falou: ‘A música vai te salvar’. E é verdade”.