Woody Allen: Quando Eu Morrer, Podem Queimar Meus Filmes

Woody Allen: Quando eu morrer, podem queimar meus filmes – 09/09/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

O legado de cineastas não costuma se reunir a cópias físicas. Ainda assim, para falar do matéria, Woody Allen opta por uma metáfora de quem ainda tem apego a rolos de filmes. Podem pegar sua filmografia e jogar no mar ou tacar incêndio, ele diz que não se importa. O diretor conversou com a Folha por vídeo, de seu apartamento em Novidade York.

A metrópole, palco dos filmes que consagraram o diretor, está fora de cena em “Golpe de Sorte em Paris”, sua 50ª e talvez última produção em meio às dificuldades que tem enfrentado na sua terreno natal

“Se alguém desabrochar com verba suficiente para fazer um filme, logo eu faria outro filme. Mas não vou trespassar procurando”, diz o diretor à Folha.

Se, por um lado, Paris é uma paixão declarada de Allen, por outro, filmar o longa fora dos Estados Unidos e pela primeira vez em gaulês surgiu porquê uma urgência. Mais de 30 anos posteriormente ser criminado de afronta sexual por sua filha adotiva, Dylan Farrow, a indústria americana virou as costas para ele.

Instituidor de clássicos porquê “Nubente Nevrótico, Prometida Nervosa”, associado a uma geração de cineastas que reergueram uma Hollywood em crise, ao lado de nomes porquê Martin Scorsese e Francis Ford Coppola, o cineasta afirma que sempre teve dificuldades para financiar suas produções, apesar de ter lançado praticamente um filme por ano entre 1982 e 2017.

Tudo piorou desde que o movimento MeToo recuperou a criminação de Dylan contra ele, levando estrelas porquê Timothée Chalamet, Kate Winslet e Greta Gerwig a expressaram seu remorso em trabalhar com o diretor, e posteriormente o lançamento do documentário “Allen vs Farrow”, que reconta o caso, em 2021.

Dylan, já adulta, reiterou que foi abusada por Allen em 1992, aos sete anos. Poucos meses antes, ele, logo com 57 anos, havia se separado de Farrow e anunciado o relacionamento com outra filha adotiva da atriz, Soon-Yi Previn, na quadra com 21 anos, com quem é casado até hoje. A investigação do caso de Dylan concluiu, em 1993, que não houve afronta, e Allen sempre se declarou puro.

Questionado pela Folha no lançamento de “O Festival do Paixão”, há três anos, sobre porquê se sentia diante de seu cancelamento, Allen respondeu que adorava ser um pária. “Se é para ser cancelado por uma cultura, esta é a cultura. Olhe para ela, os dois maiores partidos dos Estados Unidos são ameaças maiores para o país do que as nações com quem estivemos em guerra. A cultura é motivada pelo lucro.”

Agora, o tom é de frustração e desânimo, conforme ele se afasta de Hollywood. Mas tão muito porquê Novidade York, Paris é o novo tecido de fundo para os diálogos hilários e sombrios, ágeis e verborrágicos, com seu típico humor judeu, abordando o pânico da morte e o paixão, que coroaram o estilo do diretor.

Com estreia marcada para 19 de setembro no Brasil, “Golpe de Sorte em Paris”, menos cômico que trágico, aborda temas caros a Allen, porquê a imprevisibilidade da vida, as nuances das relações amorosas e o pior do ser humano.

Na trama, Fanny, casada com um ricaço, reencontra Alain, jornalista com quem estudou em Novidade York, e é atraída de volta para seus sonhos de juventude, quando desejava seguir a curso intelectual.

Inesperadamente, o triângulo amoroso se desdobra em um suspense tragicômico, ao som de jazz, quando o marido de Fanny decide se vingar.

Ainda que manifestantes tenham protestado contra a sua aparição no Festival de Veneza do ano pretérito, onde apresentou o filme, Allen parece pouco se importar com as críticas ou com espectadores que não concordam em separar responsável e obra. “Acho que eu nem sabia disso até você mencionar agora. Zero disso está na minha cabeça”, afirma. Mas seu pessimismo segue virgem. “Acho que estamos passando por tempos excepcionalmente terríveis.”

“Golpe de Sorte em Paris” é o seu 50º filme. Uma vez que o senhor se sente?

Estou surpreso. Parece que foi ontem que comecei. Eu era tão ingênuo quando comecei, tão inexperiente. E naquela quadra, eu estava tão feliz em fazer um filme, foi tão difícil de fazer um. Eu tive muitos problemas para juntar o verba necessário, logo se você me dissesse que eu faria 50 deles, eu não teria autorizado.

O senhor disse muitas vezes que gosta de ter todo o controle sobre seus filmes. Isso afetou sua relação com Hollywood?

Eu tenho todo o controle em todos os meus filmes. Se faço um filme ruim, a culpa é minha e de mais ninguém. Meus primeiros filmes foram muito bem-sucedidos, logo, me deixaram ter todo o controle nos seguintes. Isso foi útil, porque não precisei incomodar sempre outras pessoas que bagunçariam as coisas, atrasando o filme e complicando tudo.

O senhor fala muito sobre a dificuldade de encontrar financiadores nos Estados Unidos. O senhor sente que precisou se autoexilar para continuar fazendo filmes?

Não só nos Estados Unidos, tenho dificuldade em financiar meus filmes em todos os lugares. Tive sorte por alguns anos com financiamentos dos estúdios. Mas sempre tive esse problema.

Seus filmes sempre têm reflexões existencialistas sobre o significado da vida, e o senhor costumava expor que vivíamos em tempos terríveis. Ainda acredita nisso?

Acho que estamos passando por tempos excepcionalmente terríveis. Eles sempre são terríveis, mas, no momento, estão muito terríveis. Estão piores do que o habitual. Há guerras acontecendo por todos os lados, líderes autoritários surgiram em vários países nos últimos anos. Não é um bom momento, mas isso não significa que vai perseverar. Quero expor, a história vai e vem, mantém sempre um nível inabalável e não muito deleitável.

Quais diretores franceses inspiraram “Golpe de Sorte em Paris”?

Me inspirei no cinema europeu desde que comecei a levar a sério a teoria de fazer cinema, e, pela minha idade, foi uma coincidência, porque quando eu estava no final da mocidade e início dos meus 20 anos, os mestres europeus porquê [Vittorio] De Sica, [Federico] Fellini, Ingmar Bergman, [Jean-Luc] Godard, [François] Truffaut se tornaram muito importantes e proeminentes nos Estados Unidos, particularmente em Novidade York. Muitos de nós assistimos aos filmes deles e involuntariamente fomos influenciados por eles sem pensar sobre isso. Unicamente absorvemos.

O senhor afirmou recentemente que o romance da produção cinematográfica acabou. Por que acha isso?

Quando eu estava crescendo, e até na minha idade adulta, os filmes eram uma coisa dissemelhante. Havia belos cinemas por toda a cidade, as pessoas iam ao cinema, era emocionante, porquê um evento. O filme passava na tela grande e centenas de pessoas o viam juntas e falavam sobre ele. Se eu fizesse um filme que as pessoas gostassem, ele ficaria no cinema por um ano.

Em qualquer lugar de Novidade York, sempre havia qualquer cinema que estava passando “Nubente Nevrótico, Prometida Nervosa” ou “Manhattan”, era muito emocionante. Você terminava o seu filme, o lançava e tinha uma sensação de celebração. E logo você seguia em frente. Mas agora, a maioria dos cinemas desapareceram em Novidade York. Os cinemas [que sobraram] deixam o filme em edital quase por obrigação, por duas semanas, talvez três e, quase imediatamente, ele está na televisão [streaming].

Todo o ritual de trabalhar em um filme e lançá-lo para que depois ele tenha uma relação romântica com o público acabou. Se eu lançar um filme porquê “Golpe de Sorte em Paris”, você não precisa ir ao cinema para vê-lo. Você pode assisti-lo no seu quarto, pela televisão. Isso não é muito emocionante para mim.

O senhor disse algumas vezes que tem muitas ideias em uma gaveta. Qual fado imagina para esses projetos?

Tenho ideias que dariam bons filmes. Não sei se seriam facilmente transferidas para outro meio. Não sei se dariam um bom livro ou uma boa peça. Escrevi algumas peças recentemente, que estão sendo encenadas no teatro. E estou tentando redigir um livro. Acho muito difícil, mas estou tentando. E se alguém desabrochar com verba suficiente para fazer um filme, logo eu faria outro filme. Mas não vou trespassar procurando. É tedioso financiar um filme, você precisa ir a muitos almoços e reuniões e falar com pessoas. Eu fiz isso muitas vezes, e não quero fazer mais. Se alguém surgir de qualquer lugar e disser, ‘nós amamos seus filmes, queremos patrocinar outro filme seu’, eu poderia fazer outro, mas fora isso, ficaria muito feliz unicamente escrevendo para o teatro ou tentando redigir prosa.

As pessoas criticaram sua aparição no Festival de Veneza, mormente a mídia americana. Isso te incomoda?

Eu não penso sobre isso. Quero expor, acho que eu nem sabia disso até você mencionar agora. Zero disso está na minha cabeça. Quando lanço um filme, por obrigação, devo fazer um pouco de promoção para ele, apesar de não gostar. Não sabor de sentar e expor, ‘fiz um filme maravilhoso’, e toda essa bobagem. Unicamente lanço o filme, e se você gostar, você assiste. Se não gostar, não assiste.

Mas tenho que promovê-lo porque as pessoas investiram nele e esperam que eu ajude um pouco com o marketing do filme. Ou seja, eu vou para onde me enviam. Se me enviam para Veneza, eu vou para lá. Se tivessem me enviado para Cannes, eu teria ido para Cannes. Se querem que eu apareça na TV, faça uma entrevista, eu faço. E sempre foi assim por muitos, muitos anos.

Aos 88 anos, o senhor está satisfeito com o seu legado no cinema?

Eu não sou uma pessoa muito ligada a legados. Sempre que faço um filme, nunca mais o vejo novamente. Fiz meu primeiro filme em 1968 e desde logo, nunca mais o vi. Depois que termino meus filmes, não me importo mais com eles. E tenho 88 anos, logo estarei morto, logo não me importo nem um pouco com meu legado, ele não significa zero para mim.

Se, quando eu morrer, pegarem meus filmes e os jogarem no oceano, ou queimarem, não me importa. Estarei morto. Quando você está morto, zero importa. Um legado é uma fantasia que as pessoas têm, é porquê os religiosos que acreditam na vida posteriormente a morte. Mas você não existe, logo quem se importa com meus filmes? Eu não.

Folha

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