World Press Photo: Mostra Exibe Seca Na Amazônia E Guerra

World Press Photo: Mostra exibe seca na Amazônia e guerra – 13/09/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Um varão caminha com um cesto nas costas por uma imensidão de areia, deixando detrás de si um lastro de pegadas secas. No horizonte, algumas árvores parecem ser um oásis em meio ao deserto. O problema é que a foto, na verdade, é um retrato do leito nu do rio Preto, um dos principais afluentes do rio Amazonas.

O clique de Lalo de Almeida, fotógrafo da Folha, foi feito em outubro do ano pretérito, período de seca na região. Mas, devido às mudanças climáticas, seus efeitos foram mais intensos e prolongados do que o generalidade, e até hoje, mesmo posteriormente a estação de chuvas de dezembro e janeiro, a bacia ainda não encheu por completo.

A imagem foi a vencedora regional da América do Sul na categoria foto única na World Press Photo, uma das mais importantes premiações internacionais de fotojornalismo. Depois o pregão dos ganhadores, em abril, agora há um tour mundial por 80 países com a exposição das 129 fotografias contempladas, abrindo em São Paulo neste sábado, na Caixa Cultural.

A edição deste ano é particularmente peculiar para o Brasil. Depois de a mostra retornar ao país pela primeira vez posteriormente a Covid-19, quatro fotógrafos brasileiros foram vencedores, um recorde inédito até agora.

Gabriela Biló, da Folha, teve menção honrosa por retratar os ataques do 8 de janeiro, enquanto Felipe Dana e Renata Brito foram premiados pelo trabalho “À Deriva”, sobre a história de um navio vindo da Mauritânia, pleno de homens mortos, encontrado na costa da ilhota caribenha de Tobago.

A Amazônia, diz Lalo, sempre desperta olhares curiosos e preocupados por onde passa. “As pessoas têm muito mais interesse pelas questões ambientais fora do Brasil. O brasiliano trata a Amazônia porquê um território distante, não sente ela porquê segmento do Brasil, mas outro planeta”, diz o fotógrafo.

Sua foto parece uma premonição do que aconteceria no último mês, quando incêndios se espalharam pela Amazônia e chegaram à região medial do país, queimando animais e floresta em seu caminho, enquanto a fumaça cobre o firmamento de cidades porquê Brasília e São Paulo e eleva a poluição do ar a níveis insalubres.

Se antes a floresta pegava queimação unicamente quando era derrubada, graças a sua umidade, agora, com a seca, as queimadas acontecem com a floresta em pé.

“Quando a fumaça chega cá, as pessoas começam a pensar, ‘é mal as pessoas lá em Porto Velho ficam nessa estação da seca?’ As pessoas começam a ter um pouco mais de empatia. O grande repto do jornalismo ambiental é você engajar as pessoas, e nesse universo de mídias sociais, conseguir prender a atenção da pessoa que tá dando ‘scroll’ por um milhão de coisas.”

As mais impactadas, porém, são as comunidades ribeirinhas, que dependem do rio para a locomoção e aproximação a postos de saúde, mercados e escolas. “Quase não existem estradas na Amazônia. Quando esses rios secam, a vida dessas comunidades fica inviabilizada”, diz Lalo. “Eles [ribeirinhos] estão conectados a esses ciclos naturais, da chuva e da seca, para plantar, colher e pescar. A gente não sabe se essas populações vão conseguir se ajustar, a essa novidade verdade climática que está se impondo muito rapidamente.”

O tema das mudanças climáticas apareceu em todas as regiões abordadas por fotógrafos do concurso. Exemplo são o aumento do nível das águas em Fiji, na Oceania, o aumento de incêndios na Austrália ou, ainda, protestos na Alemanha contra a mineração.

“O fotojornalismo aborda assuntos da atualidade para conscientizar o público, e esse ponto [das mudanças climáticas] é um dos mais relevantes e será uma grande marca para as próximas gerações”, diz Raphael Dias e Silva, curador da mostra na Caixa Cultural.

As guerras Israel-Hamas e da Ucrânia também tiveram destaque no concurso. “Uma Mulher Palestina Abraça o Corpo de Sua Sobrinha”, do fotógrafo palestino Mohammed Salem, venceu na categoria foto do ano. A imagem mostra uma mulher segurando com firmeza e desespero o corpo de uma moça, embalado em um lençol branco, que ela encontrou no hospital posteriormente ataques aéreos israelenses na Fita de Gaza. “É uma imagem que vai permanecer nos livros de história para memorizar esse evento horroroso que está acontecendo”, diz Silva.

Assim porquê a foto do corpo de um menino sírio encontrado em uma praia da Turquia, que chocou o mundo em 2015 e se tornou símbolo da crise migratória, não é provável ver o rosto da garoto palestina, permitindo que o testemunha se projete nesse lugar de dor extrema. “É um momento tão singelo que qualquer pessoa consegue se entender e se relacionar com aquela dor”, afirma o curador.

Outra foto de destaque foi a de Biló, que recebeu menção honrosa ao retratar o 8 de janeiro em Brasília. “O desenvolvimento da extrema-direita é um fenômeno mundial. As pessoas sabem quem é [Jair] Bolsonaro e que o Brasil sofreu uma tentativa de golpe, e conseguem traçar um paralelo com a verdade em outros países”, diz ela.

Naquele dia, relembra, muitos de seus colegas jornalistas foram atacados e tiveram seu equipamento quebrado ou roubado pelos invasores. “O ódio à prelo sempre existiu, mas eu nunca me senti tão claro. Nesse dia, a prelo era claro.”

Enquanto a repressão contra a prelo se alastra pelo mundo, o fotojornalismo parece se tornar cada vez mais necessário frente à avalanche de imagens sem contexto nas redes sociais e às imagens falsas geradas por perceptibilidade sintético.

“A credibilidade que a gente tem no jornalismo é o que nos restou nessa inundação de fake news”, afirma Biló. “Estamos garantindo que a nossa história seja contada, e não por máquinas.”

Folha

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