Ymca: Associação Ganhou Nobel Da Paz E Virou Hit Musical

YMCA: associação ganhou Nobel da Paz e virou hit musical – 01/07/2024 – Esporte

Esporte

A Londres pós-Revolução Industrial vivia um alvoroço social. De um lado, a falta de legislação trabalhista fazia com que uma imensa volume de operários, inclusive crianças, fosse submetida a jornadas desumanas nas fábricas. De outro, o capitalismo enfim permitia que o numerário circulasse de uma forma antes nunca vista no meio urbano.

Até para transbordar o estresse da rotina insalubre nas indústrias, muitos encontravam nos cada vez mais presentes atrativos ligados aos prazeres a válvula de escape, o jeito de viver o pouco tempo livre que restava. Bares e bordéis se espalhavam pela cidade. Crianças, jovens e adultos se misturavam.

Foi neste contexto que surgiu a Associação Cristã de Moços (ACM). Ou YMCA, na {sigla} em inglês.

Considerada a mais antiga instituição de filantropia para jovens do mundo, a instituição hoje congrega 65 milhões de associados em 120 países. No Brasil, onde chegou em 1893, conta com 54 milénio associados.

“Globalmente, são mais de 12 milénio unidades, apoiadas por 920 milénio voluntários e 90 milénio profissionais”, diz Eudes Araujo, secretário-geral da ACM/YMCA Brasil. “No Brasil, são 35 unidades, contando com 1.355 voluntários e 1.645 profissionais.”

A primeira unidade brasileira foi no Rio de Janeiro —na estação, não havia nenhuma outra na América Latina. Conforme relata o livro Rio Velho, publicado pelo jornalista e memorialista Charles Jullius Dunlop (1908-1987) em 1963, funcionava “numa pequena sala” no sobrado de um velho prédio no meio.

“Seu termo é educar, seu lema é servir. Não tem intuitos comerciais nem políticos. Não faz, tampouco, propaganda religiosa, posto que tenha ideal religioso —por isso se labareda cristã. Seu emblema é um triângulo equilátero que mostra o estabilidade dos valores básicos do sujeito nos seus aspectos místico, intelectual e físico. Nesta simetria encontra-se o varão integral que é, em síntese, o objetivo da Associação Cristã de Moços”, escreveu ele.

Dunlop elogiava os, para ele, imutáveis “princípios morais e espirituais” da ACM.

“A noção de fraternidade, na Associação Cristã de Moços, é uma coisa real e imaculável. Todos ali se estimam, não há choques de interesse, nem podem prosperar sentimentos egoísticos. É uma instituição ideal e, efetivamente, de uma vantagem extraordinária para os moços”, disse o jornalista. “Zero mais útil, numa grande cidade, onde vivem tantos jovens afastados das suas famílias. Refugiando-se em seu seio, nas horas de suspensão do trabalho, evitam o vício e as seduções malignas.”

Ele ainda notou que empresários cariocas apoiavam a instituição porque nela viam que seus empregados estudavam e trilhavam “o caminho da respeitabilidade e da honestidade”.

‘Cristianismo atlético’

O fundador do projeto foi o inglês George Williams (1821-1905), um rebento de fazendeiros de Somerset que, aos 20 anos, mudou-se para Londres para trabalhar em uma loja de tecidos.

Depois de puerícia e juventude problemáticas —o próprio Williams, mais tarde, se descreveria porquê um “jovem desmanzelado, impulsivo, ímpio e oferecido a xingamentos”— ele se converteu ao cristianismo congregacionalista, frequentando a igreja King’s Weig House.

Aos poucos, o funcionário foi crescendo na empresa. Mais tarde, ele se casaria com a filha do proprietário e, com a morte do sogro, em 1863, se tornaria o proprietário da firma.

Mas, muito antes disso, quando ele ainda era um jovem de 20 e poucos anos e usava seu tempo livre para ler a bíblia, ele passou a refletir sobre aquele mundo industrial urbano que o cercava. Achava que aqueles jovens e crianças estavam fadados à perdição, sem condições dignas.

Reuniu 11 colegas e fundou a YMCA. Seu objetivo era ter um sítio que não levasse os jovens ao perversão. Desde o início uma organização não denominacional, ou seja, não restrita a membros de uma determinada igreja, se tornou uma das principais propagadoras de uma risco filosófica em voga na Inglaterra do século 19, o cristianismo atlético —também chamado de cristianismo musculoso.

Era uma maneira de viver a fé em Jesus com uma poderoso crença nos deveres patrióticos, na disciplina pessoal, no autossacrifício e na venustidade física e moral do atletismo. Defendia que a instrução física era principal para a formação moral do sujeito. Pela ideologia, era preciso exercitar a musculatura das virtudes.

Conforme explica à BBC News Brasil o historiador, teólogo e filósofo Gerson Leite de Moraes, professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie, a ACM é fruto de efervescência social em que religiosos, mormente protestantes, buscavam um “reavivamento” da fé, ao mesmo tempo em que, derivados de uma risco chamada “pietismo”, que valorizava as experiências de cada piedoso, pensavam em novas formas de evangelização.

“Era uma renovação dentro do protestantismo, com o pietismo muito voltado a questões missionárias, a levar a mensagem do evangelho”, contextualiza o professor. “Logo as igrejas acabaram aproveitando o contexto todo, a pobreza resultante do impacto da revolução industrial, e foram se envolvendo em questões sociais.”

“As igrejas passaram a olhar para os ‘pobres que estão cá no meio de nós’, com crianças exploradas e trabalhando 12 horas por dia, não estudando, mulheres sendo estupradas, homens submetidos a condições terríveis nas fábricas, com tristes condições de moradia”, comenta Moraes.

Aliás, o professor lembra que “a valorização dos aspectos físicos, do corpo e dos esportes” era uma marca desse momento histórico que acabou sendo absorvida por cristãos de grupos interdenominacionais. “Esses grupos paraeclesiais perceberam que isso poderia ser uma porta de ingresso para alojar pessoas que estavam precisando ouvir a mensagem do evangelho dentro dos grandes centros urbanos”, diz.

Em 6 de junho de 1844, quando ocorreu a primeira reunião da recém-criada instituição em Londres, Williams declarou que seu objetivo era “melhorar a requisito místico dos jovens” que trabalhavam mormente nas empresas têxteis.

Na YMCA, os jovens passaram a ter chegada a práticas e aulas esportivas, além de uma livraria e assistência social. A evangelização também ocorria, é evidente. Mas a mensagem cristã era focada muito mais nos valores, na retidão e nos princípios de cidadania do que nos textos bíblicos propriamente ditos. A teoria dos envolvidos era alongar a juventude da profusão de álcool, jogatina e prostituição que havia pelas ruas.

Segundo Moraes, a ACM nasceu de um contexto de grupos que buscavam “levar o evangelho e disputar o grande mercado da fé através da pregação, disputando novos convertidos” em meio a uma “demanda social enorme, de um mundo conflagrado”, com “sérios problemas, uma volume enorme de pobres explorados e as questões sociais todas ali pulsando”.

É do mesmo contexto instituições porquê a Escola Dominical —inaugurada em 1802— e o Tropa de Salvação, de 1865.

O secretário Araujo acrescenta que a ACM “teve seu início com reuniões de leitura bíblica no sítio onde Williams trabalhava em Londres” e “desde o princípio” se posicionou porquê “uma organização cristã ecumênica, sem vínculo restrito com uma denominação específica”.

“As primeiras ACMs/YMCAs nasceram com o objetivo de fortalecer os jovens por meio da cultura, com bibliotecas, do espírito, com leituras bíblicas, e do corpo, com ginástica, natação, etc.”, pontua ele.

A partir de 1851, a entidade passou a se espalhar pelo mundo, com sedes sendo criadas nos Estados Unidos, na Austrália, na Bélgica, na França, na Alemanha, no Canadá, em Hong Kong, na Suíça e nos Países Baixos.

O fundador da sede em Genebra, na Suíça, acabaria se tornando o varão que moldou o horizonte da instituição. Empresário e ativista humanitário, de família fortemente calvinista, Henry Dunant (1828-1910) defendeu que o movimento se tornasse global e internacional.

Por sua influência, a YMCA realizou a primeira conferência mundial em Paris, em 1855, reunindo 99 representantes de nove países —foi o marco da chamada Federação Mundial da YMCA, unida sob o lema bíblico “para que todos sejam um”.

Mais tarde, Dunant se afastaria da entidade. Em 1863, ele fundaria o Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Em 1901, ele ganhou o Nobel da Sossego, na primeira edição do prêmio.

Entre os princípios da primeira conferência estavam a urgência de respeitar a autonomia sítio de cada sede e a teoria de unir todos os jovens cristãos do sexo masculino “para a extensão e expansão do Reino de Deus” —sim, naquela estação, eram somente “moços” homens os participantes.

Gradualmente, mulheres começaram a reivindicar espaço na instituição. Em 1858, a YMCA de Charleston, na Carolina do Sul, foi pioneira nessa questão: ali foi criada uma unidade facilitar que congregava mulheres em trabalhos de instrução e realizando campanhas beneficentes.

Mais tarde, principalmente na Guerra de Secessão —de 1861 a 1865— e na Primeira Guerra Mundial —de 1914 a 1918— comitês formados por mulheres atuaram de forma voluntária no escora aos combatentes. Só em 1933, mas, as mulheres passaram a ser aceitas de modo pleno na instituição, com mulheres passando a ser consideradas membros do YMCA.

Em 1941 o Parecer Pátrio de YMCAs dos Estados Unidos criou um comitê privativo para debater a inserção feminina na organização —chamava-se Princípios e Padrões de Trabalho da YMCA com Mulheres e Meninas. Unicamente em 1957 as mulheres passaram a ser mencionadas oficialmente em documentos basilares da instituição, incluídas portanto na missão do projeto e também porquê público-alvo dentre os frequentadores, voluntários e profissionais da entidade.

Principalmente entre 1870 e 1930, a entidade mesclava intensamente cultos evangélicos e leituras bíblicas com as práticas esportivas, sendo, portanto, uma utensílio de evangelização.

Ao longo do século 20, a entidade participou de acontecimentos importantes.

Na Primeira Guerra Mundial, a YMCA criou centenas de centros temporários, chamados de cabanas, para estribar tanto soldados quanto civis.

Nos esforços de guerra, eles atuavam motivando e promovendo bem-estar para os que estavam nas linhas de frente.

Na Segunda Guerra, a participação da YMCA foi semelhante. A entidade foi uma das fundadoras, em 1941, da United Service Organizations (USO), uma organização que promove entretenimento e escora social para membros das Forças Armadas dos Estados Unidos e seus familiares. Os “moços cristãos” também tiveram uma atuação na ajuda a refugiados, principalmente judeus, na Europa.

Essa atuação rendeu ao portanto líder mundial da entidade, o pregador metodista americano John Raleigh Mott (1865-1955), o Nobel da Sossego em 1946. Araujo enfatiza que isso foi “em reconhecimento ao trabalho humanitário da YMCA […] pelo escora prestado durante a Segunda Guerra nos campos de concentração”.

A instituição ainda teve um papel importante na luta contra o apartheid, promovendo campanhas contra essa política discriminatória segregacionista. Em 1998, em reunião do juízo mundial, a YMCA definiu que seus desafios para o século 21 seriam promover paridade de gênero, desenvolvimento sustentável, sossego e justiça social, combatendo o racismo e contribuindo para resolver os desafios da globalização.

Segundo informações oficiais da YMCA nos Estados Unidos, essa postura já estava presente desde os anos 1960, quando a luta pelos direitos civis se tornou premente.

“A discriminação racial foi proibida em todas as YMCAs em 1967, quando muitas YMCAs afro-americanas se tornaram locais de encontro e pontos de reunião do Movimento dos Direitos Civis”, enfatiza a instituição.

Porquê em todas as partes do mundo, no Brasil também o viés comunitário sempre foi poderoso. A ACM teve papel na consolidação do Dia das Mães porquê comemoração no país. Embora a data só tenha sido oficializada por cá em 1932, há registros de que a celebração familiar ocorria antes por conta da força dessa associação. Em 12 de maio de 1918, por exemplo, a unidade do Rio Grande do Sul promoveu uma sarau em homenagem às mães.

“Eles se envolveram praticamente em todas as questões importantes do século 20, sempre trabalhando com um olhar social”, diz Moraes.

O historiador e teólogo acredita, entretanto, que é o indumentária de não ser ligada a nenhuma denominação religiosa que explica sua capacidade de “se espalhar muito rapidamente pelo mundo”. “E conseguiram se manter ativos”, acrescenta.

Basquete, vôlei e futsal

Mas, no contexto atlético, as ACMs não se limitaram a praticar esportes já existentes. A entidade acabou criando modalidades esportivas que se tornaram muito famosas. Um exemplo é o basquete. O professor de instrução física e capelão cristão canadense James Naismitgh (1861-1940) era professor na International Young Men’s Christian Association Training School, depois rebatizada de Springfield College, em Massachusetts, quando teve a teoria do jogo.

O basquete foi inventado porque ele buscava um esporte que pudesse ser praticado indoor durante os meses de inverno. A primeira partida foi realizada em dezembro de 1891 e, conforme manuscrito do próprio Naismith, a globo utilizada foi de futebol, em vez de aros foram utilizadas duas cestas para colher pêssegos, e jogaram nove contra nove.

Outro esporte que foi criado e popularizado pela instituição foi o futebol de salão.

A história mais provável é que a modalidade tenha surgido na unidade de Montevidéu, no Uruguai, quando um educador físico prateado, Juan Carlos Ceriani Gravier (1907-1996) decidiu misturar regras do futebol, do basquete, do handebol e do polo aquático para conceber um outro esporte.

De contrato com informações da ACM de São Paulo, cinco anos mais tarde o jogo passou a ser praticado também na unidade sítio, porque dois professores brasileiros haviam ido para o Uruguai e lá a aprendido. E teria sido na capital paulista que o nome foi inventado: “futebol de salão”.

O vôlei também foi invenção da YMCA. Originalmente, se chamava mintonette, uma derivação de badminton, esporte que inspirou seu idealizador. Foi geração do educador físico americano William George Morgan (1870-1942), que queria um esporte sem contato físico e que, menos exigente fisicamente, pudesse ser praticado também pelos mais velhos.

A primeira partida ocorreu em dezembro de 1895, em Massachusetts.

Araujo acredita que “com essas invenções, o esporte ganhou destaque nas ACMs, mormente nas Américas, atraindo jovens e famílias” para “práticas esportivas, natação, ginástica e musculação”.

Mas ele destaca que, em outras partes do mundo, a entidade também oferece “uma ampla gama de atividades, de centros comunitários até programas universitários e instalações hoteleiras”.

Araujo avalia que a ACM tem “relevância um” em todo o planeta por “capacitar jovens para uma vida melhor, contribuindo nos momentos mais desafiadores da história”.

“Os princípios cristãos permeiam o cotidiano de muitos movimentos da ACM/YMCA, com práticas porquê devocionais diários, encontros de missão cristã e momentos de prece”, diz. “Aliás, existem redes de missão cristã atuantes na América Latina e Caribe, África, Ásia e Europa, variando em intensidade de contrato com as características e necessidades de cada movimento”.

Hit músico

No termo dos anos 1970, a instituição acabou virando tema e emprestando nome a um dos maiores hits musicais de todos os tempos: a música Y.M.C.A. do grupo americano Village People, lançada em outubro de 1978.

Foi um sucesso momentâneo e chegou ao topo das paradas em mais de 15 países.

Literalmente, a letra da música exalta a instituição porquê um sítio “risonho” em que “não é preciso permanecer deprimido” e onde “eles podem te ajudar a voltar ao seu caminho”. Ressalta que é um sítio onde você pode se limpar, “ter uma boa repasto” e “fazer o que quiser”. Ou seja: estaria mesmo alinhada aos valores e aos serviços da entidade, com virtuosismo.

Todavia, naquele contexto de cultura gay, do mundo das discotecas e do auge da filarmónica Village People, o hit acabou sendo interpretado porquê se o YMCA fosse um sítio para homens se encontrarem para outros fins.

Mais tarde, Victor Willis, um dos autores da letra, reconheceu que tudo foi pensado para ter duplo sentido.

Desde 2020, a cantiga é protegida pela Livraria do Congresso americano porquê patrimônio para a posteridade, por ser “cultural, histórica e esteticamente significativa”.

Texto publicado originalmente cá.

Folha

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *