Adonis Revolucionou A Língua árabe Por Seus Versos Livres

Adonis revolucionou a língua árabe por seus versos livres – 05/07/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Quando era juvenil, o poeta sírio Ali Ahmad Said Esber decidiu mudar de nome. Escolheu o pseudônimo Adonis para assinar os poemas que enviava para revistas literárias. Ele se inspirou no personagem mitológico helênico, um amante de Afrodite. Hoje, aos 94 anos, ele próprio é uma espécie de mito, porquê um dos maiores intelectuais árabes do século 20.

Refletindo sobre a curso, Adonis diz nesta entrevista que tudo o que fez foi “terebrar uma porta para mudar porquê pensamos nas palavras”. Mas ele é modesto. Foi um dos protagonistas do verso livre e sem rima em sarraceno, rompendo com a formalidade dos antecessores. Revolucionou a língua.

Apesar da sua preço no mundo de cultura sarraceno, Adonis ainda é pouco espargido no Brasil. Dele havia só um livro em português. Era “Poemas”, que a Companhia das Letras lançou em 2012 com tradução do professor Michel Sleiman, da Universidade de São Paulo. A editora Tabla lança agora um novo trabalho, chamado “Ode à Errância”, vertido também por Sleiman.

Adonis nasceu em 1930 no vilarejo de Al-Qassabin, no oeste da Síria. Começou a curso há 80 anos, ainda rapaz. Foi nesse ano que recitou um poema seu para o presidente Shukri al-Quwatli, que visitava a vila. Foi estudar em Damasco e, em 1956, se exilou em Beirute, onde editou diversas revistas literárias influentes.

O poeta se instalou depois em Paris, cidade onde vive até hoje e de onde falou com a reportagem durante uma chamada de vídeo, em sarraceno.

Foi uma trajetória errante, porquê a do título do novo livro. Sorveu nesse tempo não exclusivamente a tradição sarraceno mas também uma cultura mediterrânea mais ampla — daí seu pseudônimo, renovado da Grécia. São os seus modos de desafiar os limites do tempo e do espaço, no texto.

“Ode à Errância” é de certa maneira uma obra única do mercado brasílio. Reúne três trabalhos recentes que nunca tinham sido publicados juntos. A teoria da reunião foi do tradutor. Percebeu que existia alguma coisa em generalidade entre os três poemas longos. São reflexões sobre três diferentes lugares que Adonis conheceu: Jerusalém, México e China.

Não são relatos de viagem. Adonis não aborda sua errância no sentido literal, até porque o périplo mais importante, segundo ele, é o que fazemos para dentro de nós. “O poeta sempre vive porquê se fosse um viajante, experimentando coisas que não testemunhou”, diz.

O significado dos lugares, aliás, muda com o tempo. Adonis conta que, quando chegou a Paris há algumas décadas, a cidade era porquê um sonho para ele. Pensava no seu rio, em seus bulevares. Hoje, décadas depois, é com Beirute que sonha. É a cidade de sua juventude e das questões sociais e políticas que o marcaram.

O poema sobre Jerusalém se destaca em “Ode à Errância”. Isso porque esse texto chega ao Brasil em meio à guerra e aos bombardeios israelenses na tira de Gaza. É um tema já consolidado na obra de Adonis, que há quase um século milita pela questão palestina. Toda a trova é política, afirma. “Sempre nasce porquê uma revolução.”

Sua política é explícita em alguns trechos. Por exemplo, quando fala da chegada de colonos judeus e sobre a expulsão de palestinos de Alquds, o nome sarraceno de Jerusalém. “Sai o morador, ficam os recém-chegados”, escreve. “Uma vez que nós podemos concordar isso?”, ele emenda, na entrevista.

Apesar da centralidade da justificação palestina na obra de Adonis, sua maior guerra poética é pela laicidade. Isso, outra vez, aparece na sua escolha de pseudônimo, que ele foi buscar muito longe da tradição árabe-islâmica.

Não é uma sátira à fé individual, mas às religiões organizadas. Adonis fala do islã porquê um dos entraves para a geração de novas maneiras de pensar no Oriente Médio. “A força do ser humano reside em sua capacidade de fazer perguntas, mas a religião só oferece respostas”, diz.

Daí a violência com que símbolos religiosos aparecem no poema sobre Jerusalém. A saudação da Via Dolorosa, em que segundo o cristianismo Jesus caminhou rumo à cruz e ao sepulcro, diz: “Zero foi criado, zero se cria na Palestina sem partir dessa via/ O túmulo é um sêmen santo”.

A repudiação da religião é também uma asserção da individualidade. Adonis diz que, no sistema de pensamento islâmico, existe uma ênfase na teoria de comunidade —expressada pelo termo sarraceno “umma”. É, grosso modo, o privilégio do “nós” em detrimento do “eu”.

“Mas um poema não tem sentido se não expressar a originalidade, o corpo e os desejos do poeta”, diz. “Você e seu irmão podem até ser parecidos, só que não sonham os mesmos sonhos.”

Com tudo isso, o responsável afirma que sua avidez é “fabricar um novo ser humano”, capaz de pensar sozinho, para além das tradições, e de destrinchar sua língua em procura de novas conexões entre as palavras. A trova que não procura fabricar alguma coisa novo não tem razão de ser, sentencia.

Para explicar isso, Adonis usa imagens poéticas. Ouvi-lo falar é quase porquê ler sua obra. O poeta não exclusivamente caminha em uma estrada, indo de um tópico a outro, afirma. Ele entende que as palavras estão imersas em um mar e, assim, encostam umas nas outras. “O poeta zero no oceano.”

Folha

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