Havia mais de milénio pessoas dentro do clube Bataclan na noite de 13 de novembro de 2015, quando terroristas entraram ali com armas Kalashnikov para ceifar o maior número verosímil de vidas. Levaram 89.
São cenas de horror integral —pisoteamentos, execuções a sangue insensível, corpos esfacelados por tiros deixando “buracos do tamanho de pratos”—, pintadas com destreza pelo gaulês Emmanuel Carrère em seu livro mais recente, “V13”. Um boda para quem procura a malvadeza. Mas não só.
A certa fundura Carrère se detém em Bruno, o atendente de uma empresa de trens que protege com seu corpanzil a mirrada Édith, surpreendida porquê ele pelos assassinos enquanto via o show da margem Eagles of Death Metal na boate.
Os dois eram completos desconhecidos. Mesmo assim, quando surge uma oportunidade de evadir e ela responde apavorada que “não consegue se mexer”, ele diz que tudo muito. “Vou permanecer com você.”
Foram essas as cenas que mais mexeram com o responsável —em seguida ele conta de Clarisse, uma mulher que reuniu força sobre-humana para arrombar um teto falso no clube, dando chegada a um esconderijo. Mas em vez de se meter logo por lá, ela fez escadinha com as mãos para que os mais fracos subissem primeiro.
“Estar disposto a morrer para matar, ou estar disposto a morrer para salvar: qual o maior mistério?”, anota o redactor, logo depois de referir a filósofa francesa Simone Weil. “O muito imaginário é enfastiado; o muito real sempre é novo, maravilhoso, inebriante.”
Carrère, um responsável propenso a se impor tarefas desafiadoras e transformá-las em literatura visceral, decidiu escoltar as mais de século sessões do julgamento de subida repercussão midiática dos responsáveis pelo “V13”.
A sentença apelida a sexta-feira 13 —”vendredi”, em gaulês— na qual extremistas do Estado Islâmico mataram mais de 130 pessoas em Paris, num ataque coordenado entre o Bataclan, os periferia do Stade de France e as esplanadas onde jovens costumavam sentar para tomar.
“Normalmente, as pessoas com interesse em julgamentos de homicídios, entre as quais me incluo, estão mais interessadas nos assassinos que nas vítimas, por quem você só sente pena”, afirma o redactor descabelado de 66 anos, em entrevista por vídeo.
Uma de suas obras mais famosas, “O Competidor”, é sobre o morticínio brutal que Jean-Claude Romand cometeu contra sua própria família, e o responsável lembra que tinha muito mais curiosidade pelo protagonista que “pelas pobres pessoas que ele matou”. “Cá foi o exato contrário.”
“Os rapazes que fizeram segmento desse projeto de assassínio, honestamente, eram muito estúpidos. E as pessoas que foram suas vítimas e os familiares delas me impressionaram muito por suas personalidades e pelo que fizeram dessa experiência. Foi o oposto do que eu esperava.”
Portanto, entre os achados de suas crônicas —o livro é a compilação ampliada de uma série de artigos semanais que Carrère escreveu de 2021 a 2022 para a revista Le Nouvel Observateur—, há personagens fascinantes em seu carisma e resiliência.
Há o médico reformado Georges, que decidiu se juntar ao pai de um dos jihadistas que mataram sua filha e redigir um livro a quatro mãos chamado “Il Nous Reste les Mots” —alguma coisa porquê “só nos sobram as palavras”; e a jovem Maia, que se divertia numa “noite gostosa” nas ruas parisienses quando viu seu namorado e seus amigos serem abatidos por balas enquanto planejavam uma sarau conjunta de natalício.
Sobretudo, há a egípcia Nadia, uma mulher imersa na cultura mouro dos quais prova sobre a aperto de deslindar a morte da filha Lamia ganha um número generoso de páginas, eficientes em levar leitores às lágrimas.
“A filha dela podia ser a minha”, diz um redactor consciente de que realiza o melhor de sua literatura quando insere seus próprios sentimentos nas histórias —ainda que, cá, tenha tomado desvelo para não fazer isso em excesso, o que seria “uma obscenidade” por culpa do intensidade do sofrimento com que lidava.
Em vez disso, ele deixa pessoas porquê Nadia tomarem a frente. “É tão difícil de entender”, diz ela sobre a morte da filha de 30 anos. “Pensar que as pessoas que a mataram tinham a idade dela. Que eram levados à escola pela mão”, do jeito que ela fazia com Lamia. “Eram criancinhas a quem se dava a mão.”