Globo 60 anos: livros jogam luz sobre episódios nebulosos

Globo 60 anos: Livros jogam luz sobre episódios nebulosos – 03/04/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

No mês em que a Rede Orbe completa 60 anos, chegam às livrarias dois livros dispostos a jogar luz sobre episódios nebulosos, embaraçosos e desconhecidos da história da emissora.

O jornalista Ernesto Rodrigues produziu uma gigantesca reportagem, com muro de 2.000 páginas, dividida em três volumes. A obra se sustenta a partir de 400 depoimentos ao Memória Orbe, em sua maioria inéditos, de funcionários das áreas de jornalismo, dramaturgia, entretenimento, esportes, mercantil e institucional, além de entrevistas com vários executivos e os três filhos de Roberto Pelágico.

O recém-lançado “A Orbe – Concorrência: 1985-1998” dá seguimento à narrativa iniciada com a publicação de “Preponderância: 1965-1984”, no qual Rodrigues documentou uma vez que a emissora em poucos anos conquistou a liderança do mercado de TV no Brasil. No segundo semestre deve trespassar “Mutação”, que cobrirá o período entre a viradela do século e o início da dezena de 2020.

Levante segundo volume descreve, uma vez que indica o título, os primeiros abalos da Orbe em função da concorrência de SBT, Manchete e Record e o início da transmigração do público das classes A e B para a TV por assinatura. É um tempo de apelações grosseiras em programas dominicais e mudanças na grade para tentar minorar a perda de audiência.

Por outro lado, é também um tempo de culminância da teledramaturgia da emissora, sob o comando de Daniel Rebento, com novelas uma vez que “Vale Tudo” e minisséries que fizerem história, cujas trajetórias são reconstituídas no livro.

Se, no primeiro volume, Rodrigues classificou a relação de Roberto Pelágico com a ditadura militar uma vez que de “subserviência imposta”, neste novo livro ele mostra uma vez que o proprietário da Orbe e seus herdeiros colocaram voluntariamente o jornalismo da emissora a serviço de seus interesses políticos, tanto na transição para a democracia quanto nos governos Sarney, Collor, Itamar e FHC.

Da ação explícita em prol da candidatura de Tancredo Neves no Escola Eleitoral à decisão de minguar a esfera da cobertura das eleições de 1998, facilitando a reeleição de Fernando Henrique, são vários os episódios de manipulação voluntária da verdade que Rodrigues descreve sem minorar o impacto que tiveram.

O escora ao Projecto Cruzado, mesmo sabendo que ele fazia chuva, ajudou o governo Sarney a ter uma vitória eleitoral e provocou uma greve no jornalismo da Orbe no Rio. O excitação de Pelágico com Fernando Collor e a edição criminosa do último debate com Lula (“o serviço mais sórdido que fiz na minha vida”, segundo o editor de texto Octavio Tostes) são descritos em detalhes, com uma profusão de fontes.

Rodrigues descreve situações que mostram uma vez que a empresa se curvou também em resguardo de seus interesses econômicos. Para manter o patrocínio de um banco à minissérie “O Pagador de Promessas”, de Dias Gomes, a Orbe não unicamente subtraiu quatro episódios uma vez que permitiu que um representante da empresa assistisse com antecedência ao capítulo que seria exibido a cada noite, com recta de “sugerir” mudanças.

Já o repórter Décio Lopes conta que, ao fazer uma entrevista com João Havelange, portanto presidente da Fifa, recebeu do entrevistado um pedaço de papel e a seguinte orientação: “Estas são as perguntas que você vai me fazer. Vou responder primeiro em português, depois em gaulês. Não faça nenhuma pergunta que não esteja no papel”. Perguntas sobre devassidão na Fifa, nem pensar.

É louvável que o responsável sempre confronte as opiniões de Boni, o principal executivo da emissora por décadas, com outras fontes. Isso é importante porque, na maior segmento da bibliografia sobre a Orbe, é Boni quem costuma dar a termo final em todas as polêmicas; neste livro, o papel cabe com maior frequência a Roberto Irineu Pelágico e seus irmãos.

Porquê a relação entre Boni e Roberto Irineu enfrentou alguns sobressaltos, o livro registra uma série de faíscas curiosas.

Por exemplo, ao tratar em detalhes do fracasso da Telemontecarlo, projeto da Orbe de uma TV na Europa, Rodrigues observa que a culpa sempre foi atribuída ao fruto mais velho de Roberto Pelágico, o que ele nega. “Boni sabotou mesmo. E sabotou porque pediu uma participação acionária subida na Telemontecarlo que nós não aceitamos porque ele já participava dos lucros da Orbe”, diz.

No período que cobre nascente segundo volume, houve três trocas no comando do jornalismo da TV. Armando Nogueira, que trabalhava na emissora desde 1966, perdeu o posto em 1990 para Alberico de Souza Cruz, que caiu em 1995 para a chegada de Evandro Carlos de Andrade.

Com ajuda de muitas testemunhas, Ernesto Rodrigues reconstitui em detalhes os bastidores de várias disputas pesadas de poder. Também é tema importante do livro a queda de Boni e a subida de Marluce Dias da Silva na direção-geral da emissora.

Cabe registrar que o livro cita com muita frequência a Folha e vários de seus profissionais, trazendo trechos de críticas e reportagens sobre a emissora carioca. Ex-ombudsman da TV Cultura, Rodrigues observa que a Folha é “de longe o jornal brasiliano mais vigilante e crítico à Orbe ao longo de décadas”.

O outro livro que aproveita a vaga dos 60 anos da Orbe é o segundo volume da biografia de Roberto Pelágico escrita pelo jornalista Leonencio Nossa.

Em 2019, ele publicou “O Poder Está no Ar: Do Promanação ao Jornal Vernáculo”, informando que ainda faria um segundo volume. Os planos aparentemente mudaram, pois o livro que está saindo agora, “A Orbe na Ditadura: Dos Festivais às Bombas no Riocentro”, está sendo anunciado uma vez que o segundo de uma trilogia.

Nossa novamente se dedica a elaborar uma biografia de Pelágico com base em uma centena de entrevistas, chegada a depoimentos guardados pela Orbe e consulta a acervos públicos. A maior diferença é que, agora, o tema principal não parece ser o biografado, mas sim o jornal O Orbe e a TV Orbe.

Decorre deste problema uma frustração, já que o período tratado pelo responsável, do final da dezena de 1960 ao início dos anos 1980, é o mesmo do primeiro volume de Rodrigues, que foi lançado no ano pretérito. Talvez por alguma dificuldade no processo editorial, Nossa ignora completamente “Orbe – Preponderância: 1965-1984”, que trata dos mesmos assuntos abordados em seu livro.

Ao longo de 600 páginas, o responsável mais de uma vez justifica a subserviência de Pelágico com a ditadura uma vez que “terror de perder a licença” da TV Orbe. E descreve o empresário uma vez que alguém que sempre se posicionou ao meio do espectro político.

“A Orbe na Ditadura: Dos Festivais às Bombas no Riocentro” detalha a conflitante relação de Pelágico com Armando Falcão, ministro da Justiça, e com Euclides Quandt de Oliveira, ministro das Comunicações, ambos no governo Geisel. Também mostra o empresário em ação uma vez que operador político, num encontro com o ex-presidente Médici, para falar sobre ações da extrema direita que buscavam boicotar a promessa de sinceridade política.

Ainda assim, com pesquisa muito detalhada sobre várias coberturas de O Orbe, nascente segundo volume da biografia de Pelágico será de grande utilidade para historiadores da prelo.

Folha

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