Graciliano Ramos Entra Em Domínio Público E Família Reage

Graciliano Ramos entra em domínio público e família reage – 06/01/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Um belo dia, os compadres gavião e coruja se encontram e começam a conversar. Ele está com rafa e ela, preocupada com a segurança dos filhos. O arremate é trágico e, ao final, o narrador entra para anunciar uma espécie de moral da história.

Parece uma fábula de La Fontaine, mas é Graciliano Ramos —num livro inédito que só vê a luz do dia, agora, porque a obra do responsável acaba de entrar em domínio público.

É provável que, de outro modo, “Os Filhos da Coruja” nunca fosse publicado. Primeiro, porque é um poema. Segundo, porque foi feito sob um pseudônimo, J. Calisto. Cioso de uma vez que sua obra era apresentada ao público, o responsável deixou instruções explícitas proibindo que textos escritos nessas condições fossem editados em seguida sua morte.

“Ele achava ruim, se considerava um mau poeta”, resume Ricardo Ramos Rebento, neto do alagoano, que recebe a notícia dessa edição com “surpresa e tristeza”, tachando-a uma vez que “uma sacanagem enorme”.

“Graciliano deixou com meu pai determinações que sempre respeitamos, e agora que entra em domínio público, a primeira coisa que fazem é desrespeitar um libido dele”, afirma. “Sei que Graciliano não queria isso. Ele fazia revisão riscando palavras porque não queria que ninguém visse, queimava a termo com ponta de cigarro para que não fosse provável ninguém desenredar.”

A questão é que a família não tem mais controle qualquer sobre isso. Segundo a lei brasileira, os herdeiros de um noticiarista detêm plenos direitos sobre sua obra exclusivamente nos 70 anos que se seguem à sua morte.

Porquê o varão que escreveu “Vidas Secas” morreu em 1953, desde o último dia 1º de janeiro qualquer pessoa tem recta de imprimir e vender a sua própria edição de uma das obras-primas da segunda geração do modernismo brasiliano.

Ou qualquer outro texto da lavra de Graciliano. Leste “Os Filhos da Coruja”, de 1923, sai pela primeira vez em livro pela infantojuvenil Baião, braço da editora Todavia, que convidou o pesquisador Thiago Mio Salla para coordenar um projeto de publicações do responsável que inclui romances e uma seleção de cartas com mais material inédito.

“Graciliano é um responsável com representatividade tanto literária quanto mercantil, e do ponto de vista intelectual, o domínio público abre possibilidades para que a obra seja editada de outras perspectivas, que agreguem novas leituras”, afirma o organizador.

A intenção de seu projeto, diz, é investir em edições críticas cotejando diferentes versões dos textos, oferecer em cada livro um quadro sistêmico da obra completa do responsável e selecionar rodapés de autores de ponta uma vez que Antonio Candido, outro nome editado pela vivenda.

E, sim, publicar material que Graciliano rejeitava, por entender que “o interesse pela obra do Graciliano é muito grande”. “Ele queria manter uma imagem uniforme, sim, mas o que se construiu dele em seguida a morte foi maior do que talvez ele mesmo imaginasse. Estamos falando de um dos maiores autores da literatura brasileira.”

Segundo a editora Stéphanie Roque, da Companhia das Letras, as oportunidades abertas pelo domínio público tornam a obra do alagoano democrática e atingível, alguma coisa que agradaria ao próprio responsável.

“Graciliano era um revisor muito rígido da língua, e tinha o mesmo rigor ético com suas personagens tão marcantes socialmente, de fora do eixo sudestino. São livros que vão reviver com novas leituras neste nosso contexto de pensar identidades.”

Por meio do selo Penguin-Companhia, a vivenda publica a trinca de seus principais romances: “Angústia”, “São Bernardo” e “Vidas Secas” —que outras editoras especializadas em trabalhar domínio público, uma vez que a Antofágica e o Clube de Literatura Clássica, também têm no prelo.

A divulgação mais ampla do responsável, que era sucesso de sátira mas tinha público restrito em vida, começou com a editora Martins na dez de 1960 e se consolidou na Record, que o edita desde 1975 e foi responsável pela comercialização de tapume de 2 milhões de cópias de “Vidas Secas” até cá.

Desde portanto o responsável não dá sinais de esfriar, e Thiago Mio Salla está avezado a vasculhar fontes primárias para desenredar novos textos do punho do Velho Perdão desde os dois doutorados sobre sua obra que concluiu na Universidade de São Paulo.

Uma das culminações desse trabalho foi “Garranchos”, reunião de 80 textos —até portanto inéditos, alguns sob pseudônimo— da inexaurível produção de prensa do alagoano. Foi um trabalho feito junto à família do responsável, que Mio Salla saúda uma vez que “sempre ocasião e receptiva”, e publicado há 12 anos pela Record.

A vivenda onde Graciliano fez morada, aliás, não tem planos de parar de editar seus textos —nem de romper seu contrato com a família Ramos, que vigora até 2029. A decisão de fechar um concórdia para além do domínio público, em 2018, foi para honrar a parceria de décadas com os herdeiros, afirma o diretor editorial Cassiano Elek Machado.

“É originário que agora venham dezenas de outras edições e percamos um pouco a performance com o responsável, mas estamos tranquilos com a qualidade e a amplitude do nosso catálogo”, afirma ele.

A Record põe suas fichas, leste ano, “tanto em trunfos premium uma vez que econômicos”, segundo o editor. Primeiro, um box caprichado com os três romances mais consagrados do responsável, depois, uma versão de bolso de “Vidas Secas”. E enfim, o volume “Prefeito Jornalista”, com os relatórios de quando, em sua vida pregressa ao sucesso literário, ele foi eleito para gerir a cidade de Palmeira dos Índios.

A editora continuará pagando direitos autorais à família por mais cinco anos, ao menos, agora com uma diferença relevante. Por iniciativa dos herdeiros, que criaram o Instituto Graciliano Ramos, secção do quantia vai para o Innocence Project Brasil, organização que atua em prol de pessoas encarceradas injustamente —assim uma vez que aconteceu com o responsável durante o Estado Novo, uma vez que sabe quem leu as “Memórias do Cárcere”.

O neto que defende seu legado com tanto esforço, Ricardo Ramos Rebento, nasceu exclusivamente dez meses em seguida a morte do avô e seguiu seus passos tanto nos posicionamentos firmes quanto na profissão —não só abraçou a literatura uma vez que se tornou presidente, recém-reeleito, da União Brasileira de Escritores.

É alguém que entende do riscado e, nos últimos anos, procurou parlamentares de esquerda no Congresso para tentar mudar a lei que rege o domínio público. Não conseguiu.

Ele afirma, de pronto e com serenidade, ser “totalmente favorável” a disponibilizar publicamente a obra de Graciliano de perdão a quem quiser ler. “Isso poderia ter ocorrido até antes. A superfluidade dessa lei é poder possuir a comercialização da obra sem remunerar nenhum recta autoral. E com o agravante de que muitos vão se aproveitar para publicar sem o menor zelo.”

É alguma coisa irônico que “Os Filhos da Coruja”, editado na nascente novidade tempo do responsável, gire em torno do pânico de ter seus descendentes devorados —um sentimento que, segundo a riqueza sátira da obra, tomava àquela profundeza o viúvo Graciliano, responsável sozinho por quatro rebentos. Porquê podemos ver, as leis da natureza são mesmo implacáveis.

Folha

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