“Às vezes eu até tento ir a uma feira de antiguidades, um loja, pensando que não vou comprar zero, mas não consigo. Sempre tem alguma coisa chamando”, diz Maristela Calil, suspirando. “Eu não posso fazer zero, sou uma salvadora de livros.”
Se a enunciação da bibliófila de 63 anos tem alguma coisa de heroica, vem calcada mesmo em um daqueles mitos fundadores. A Livraria Calil, sobre a qual ela reina no nono caminhar de uma galeria no meio de São Paulo, se orgulha de ser a mais antiga em atividade na cidade.
Há mais de 75 anos, compra e vende livros novos e usados, comuns e raros, recentes e quase arcaicos —sempre com predileção pelas últimas opções. A livreira tem um jeito mais lírico de definir seu métier. “Eu tento fazer com que o livro passe de uma mão para outra, vá circulando.”
A função de Maristela, uma vez que foi a de seu pai antes, é impedir que a morte de um grande leitor signifique a morte de seus livros. A loja foi fundada em 1949 por Líbano Calil Atallah, um varão “meio atarracado”, segundo ela, rebento de um par libanês de pendor intelectual que tocava um armarinho na rua 25 de Março.
Começou vendendo livros jurídicos, foi formando um pilha de saudação em torno das ciências humanas e logo passou a se destinar a raridades, fincando raízes entre aquelas ruas da República onde funcionavam tantas editoras e passeavam tantos intelectuais.
Maristela foi a única de seis irmãos picada pela bibliofilia. Trabalha na loja há 42 anos e assumiu de vez com a morte de Líbano, aos 66 anos em dezembro de 1993, só três meses depois do promanação do rebento dela, Murilo —hoje o único outro funcionário da loja além da mãe, com quem zela por um pilha de mais de 300 milénio exemplares.
“O papel da Livraria Calil não é simplesmente comprar e vender livros, é manter o livro no mercado”, diz ele, um jovem tá e de fala rápida, acrescentando que custou a aprender essa prelecção. “Fazemos isso seja guardando os livros, seja comprando, seja restaurando, encadernando.”
Para explicar melhor, mãe e rebento lembram um caso sem reportar nomes —e a frase “não posso manifestar quem foi” se repete à exaustão durante toda a entrevista para proteger clientes.
Certa vez, a dupla se recusou a fazer uma venda para um agente estrangeiro referto de grana quando teve a sensação de que isso levaria uma edição única de um clássico brasiliano a transpor de sua terreno para nunca mais voltar.
São as delicadezas do negócio dos livros raros, que procura o lucro, sim, mas também cuida da memória. Murilo tira do estoque uma edição próprio dos “Poemas da Negra”, escritos por Mário de Andrade em 1929 e acompanhados de desenhos de Di Cavalcanti, marcada com o número 183 —a tiragem teve em torno de 450 exemplares.
“É raríssimo, você não acha outro de jeito nenhum”, se empolga o livreiro de 31 anos. “Está à venda por R$ 10.000, mas se uma pessoa romper para comprar, eu acho que não vendo. Algumas obras valem mais que o quantia. Se eu vender, não vou mais ver essa obra novamente.”
Os Calil folheiam junto com o repórter livros uma vez que um tratado de medicina de 1567, um registro detalhado de alforrias de escravizados datado de março de 1887, primeiras edições de “Dom Casmurro” e “Macunaíma”, um “Morada de Alvenaria” com a assinatura de Carolina Maria de Jesus.
Um empreendimento uma vez que esse, com solidez financeira suficiente para zelar seu imenso pilha ao longo daquele caminhar na rua Barão de Itapetininga, não é simples de gerir.
Às vezes, uma boa venda a um colecionador já adianta muito o mês —uma só edição inicial de “Os Sertões”, por exemplo, está precificada em R$ 18 milénio. E bibliotecas às vezes querem encetar a cultivar um pilha de raridades com compras de baciada, o que pode virar uma negociação de maior graduação.
Portanto os livreiros têm dificuldade para prezar o tíquete médio da loja. “Eu tenho livro de um real e tenho manuscritos em que posso cobrar o preço de um apartamento”, resume Murilo.
Se o colecionador endinheirado é quem abastece os cofres, Maristela fala com paladar dos clientes zero especializados que visitam o espaço sem compromisso, flanando pelos corredores, uma vez que um par de 20 e poucos anos que passeava pela Calil quando a equipe da Folha chegou.
“Muito se fala que jovem não lê, mas não é o que se vê nessa livraria”, diz ela, satisfeita, logo que começa a conversa. Nessas horas brilha o orgulho da herdeira de um grande livreiro, que assumiu o negócio com o rebento a tiracolo e, quando diz que está pensando em se reformar dali, soa muito pouco suasório.