Maura Lopes Cançado Volta à Tona Com 'hospício É Deus'

Maura Lopes Cançado volta à tona com ‘Hospício É Deus’ – 02/01/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Maura Lopes Cançado não se achava uma garoto normal. “Encaravam-me porquê uma rapariga caprichosa, mas a verdade é que já era uma candidata aos hospícios onde vim parar”, ela escreve em “Sanatório É Deus”, de 1965.

O livro é um misto de memórias de sua vida e quotidiano de uma de suas internações num hospital psiquiátrico. Desde jovem, ela sofreu com transtornos mentais —e a obra é, em segmento, um mergulho nesse vista de sua trajetória.

Mas o redescobrimento recente da autora, que tem sua obra relançada em maior graduação pela Companhia das Letras, traz à tona sobretudo a sofisticação de sua escrita, dimensão que passou décadas eclipsada por sua biografia.

“Não dá para falar da Maura sem falar em loucura, mas também não dá para reduzi-la a esse lugar”, diz Alice Sant’Anna, editora responsável pelo projeto. “O texto é muito muito trabalhado e sofisticado, de uma sinceridade desconcertante.”

Grandes nomes da prensa e da literatura brasileira já notavam a qualidade de sua obra nos anos 1960. Lopes Cançado veio de uma família abastada de Minas Gerais, e as marcas de sua sabedoria estão presentes no quotidiano. Enquanto escrevia o relato do sanatório, lia Sigmund Freud, Hermann Hesse, explorava a literatura indiana. Não era uma escritora desavisada.

Ela se casou jovem, teve uma relação turbulenta, se mudou de São Gonçalo do Abaeté para a capital Belo Horizonte, mas acabou se fixando de vez no Rio de Janeiro, onde conheceu a equipe do Suplemento Dominical do Jornal do Brasil. Por seus textos, ela foi admirada por nomes porquê Ferreira Gullar e Carlos Heitor Cony, que a revelaram literariamente em 1958.

Mas a vida da autora tomou um rumo mais dramático em uma das internações. Ela estrangulou uma mulher em 1972 numa clínica de saúde em Botafogo e, depois, foi considerada inimputável por um juiz.

Os posfácios da novidade edição, feitos pela escritora Natália Timerman e pelo jornalista Maurício Meireles, repórter próprio da Folha, esquadrinham a trajetória da autora e mostram que sua vida foi repleta de mistérios.

Depois de sua morte, em 1993, o rumo da obra parecia o esquecimento. Mas em 2015 a editora Autêntica relançou “Sanatório É Deus” e “O Sofredor do Ver”, seu livro de contos de 1968, e começou a apresentar Lopes Cançado a uma geração que não a conhecia. “O Sofredor do Ver” também será lançado pela Companhia das Letras.

A novidade publicação de “Sanatório É Deus” chega num momento oportuno. Autoficção é um gênero cada vez mais presente nas prateleiras, e saúde mental é um tema que não sai da agenda contemporânea, sobretudo depois a pandemia. É um livro que dialoga com nosso tempo, mas o texto de Lopes Cançado se distingue pela escrita cortante e pelo retrato cruel que apresenta.

A autora reflete com lucidez aterrorizante sobre a requisito do louco na sociedade e sobre porquê as fronteiras entre sanidade e loucura podem ser borradas facilmente.

O relato literário de sua vida é a trajetória de uma mulher vaidosa, buscando realizar desejos ainda sem perímetro. Não há, no entanto, espaço para autopiedade. Os maus-tratos dos funcionários, os quartos e roupas sujas, a comida ensebada, o encolhimento de colegas de trabalho durante os surtos —tudo faz segmento do universo vertiginoso que a autora cria.

“Uma vez que ela não está numa ruptura totalidade com a veras, consegue trazer a situação do manicômio e da instituição psiquiátrica com um oração próprio”, diz a escritora Deborah Brum, que estudou a obra de Lopes Cançado, sobretudo o livro “O Sofredor do Ver”. “Durante muito tempo se romantizou, e se romantiza ainda, a loucura. Mas ela não é isso, e acho que é esse vista que a Maura traz.”

Para Brum, Lopes Cançado é habilidosa em fabricar imagens e sensações enraizados neste universo. É uma requisito que desculpa incômodo, ainda que, segundo Sant’Anna, a autora sempre dê uma piscadela bem-humorada para os seus leitores.

Uma das mais divertidas é quando ela descreve suas sessões de estudo. “Em relação ao sexo a coisa é um sinistro: lápis, caneta, dedo, nariz são símbolos fálicos. É irritante: tenho o puro hábito de estar sempre com um dedo ou lápis na boca. Não compreendo porquê um simples lápis __________. Mas o tal de crítico compreende.”

O que mais incomodava Maria Amélia Mello, editora responsável pelo relançamento de Lopes Cançado na Autêntica, era que ela só fosse lembrada por seus aspectos negativos. Para Mello, isso mudou de 2015 para cá. Em 2018, “Sanatório É Deus” foi tema de uma peça de teatro e, em 2020, inspiração para um novo romance. Sua obra também é, desde portanto, mais estudada na liceu.

“Quando você coloca luz em um pouco, ela sai dessas cavernas onde a obra fica escondida e ninguém sabe recta o que é”, afirma. “Tudo isso vai trazendo a Maura pelo vista da literatura, da autoficção, da termo.”

O esquecimento parece ter sido uma temporada passageira de Lopes Cançado. A própria escritora profetizava esse orientação em “Sanatório É Deus”.

“O que me assombra na loucura é a intervalo —os loucos parecem eternos. Nem as pirâmides do Egito, as múmias milenares, o mausoléu mais gigantesco e velho possuem a marca de evo que ostenta a loucura”, ela escreveu. “O louco é divino, na minha tentativa fraca e angustiante de compreensão. E eterno.”

Folha

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