Mineradoras Querem Impedir Que Municípios Movam Ações No Exterior

Mineradoras querem impedir que municípios movam ações no exterior

Brasil

O Instituto Brasílio de Mineração (Ibram), que representa as maiores mineradoras do país, moveu uma ação onde procura impedir que municípios brasileiros ingressem com ações em tribunais estrangeiros. A entidade alega ser inconstitucional que entes federativos se envolvam em litígios no exterior. O caso foi levado ao Supremo Tribunal Federalista (STF) na semana passada. O ministro Cristiano Zanin foi nomeado relator.

A movimentação inaugurou uma guerra judicial. Dois dias depois, o Consórcio Público de Resguardo e Revitalização do Rio Gula (Coridoce) solicitou para ingressar no processo. Ele é formado pelos prefeitos dos municípios envolvidos em um processo judicial em tramitação no Reino Uno, que discute a reparação dos danos do rompimento da barragem da mineradora Samarco. No incidente ocorrido na cidade de Mariana (MG) em novembro de 2015, uma avalanche de rejeitos foi liberada, causando 19 mortes e afetando centenas de cidades ao longo da bacia do Rio Gula.

Insatisfeitos com o processo reparatório no Brasil, tapume de 700 milénio atingidos e 46 municípios, além de empresas e instituições religiosas acionaram as cortes britânicas visando responsabilizar a BHP Billiton. A mineradora anglo-australiana, com sede em Londres, é uma das acionistas da Samarco. A multinacional brasileira Vale, outra sócia, foi posteriormente incluída no processo. Audiências marcadas para outubro deste ano irão julgar a responsabilidade das duas mineradoras.

De entendimento com nota divulgada pelo Ibram, a ação levada ao STF é uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que tem o objetivo mediano de resguardar a soberania brasileira. A entidade alega que, sem passar pelo crivo da Justiça brasileira, a transparência das ações movidas no exterior fica comprometida. Aliás, sustenta que a participação do Ministério Público nos processos envolvendo entes federativos é obrigatória, o que ficaria inviabilizado em casos que tramitam fora do país.

“Ações ajuizadas no exterior por municípios escapam do controle do Poder Público, não obedecem a princípios constitucionais e a organização do Estado brasílio. Por não passarem pelo crivo do Poder Judiciário brasílio e tramitarem perante jurisdição estrangeira, fica prejudicada a transparência dos processos e a participação do Ministério Público, essenciais para tutorar a ordem jurídica brasileira e promover a pacificação social”, registra o texto.

O Ibram afirma ainda que a judicialização fora do país vem afetando a mineração e gera consequências adversas para o setor. Acrescenta que é conhecimento privativa da União tratar de assuntos internacionais e que é vedado aos municípios se relacionarem diretamente com Estados ou jurisdições estrangeiras. “Dessa forma, qualquer ação judicial proposta no exterior pelos municípios deve racontar com a consentimento da União”, finaliza a entidade.

O escritório Pogust Goodhead, que representa os atingidos e municípios na ação movida no Reino Uno, divulgou nota em que o legista Tom Goodhead classifica a ação do Ibram uma vez que um “movimento aparentemente orquestrado” e uma “cortinado de fumaça” para desviar a atenção do transgressão socioambiental cometido na bacia do Rio Gula.

Ele menciona ainda ações que tramitam em outros países. Sete municípios atingidos pela tragédia de 2015 processaram subsidiárias da Vale e da Samarco sediadas na Holanda. Já na Alemanha, o município de Brumadinho (MG) integra uma ação movida contra a Tüv Süd, consultoria que assinou o laudo de segurança da barragem da Vale que se rompeu em 2019. No incidente, 272 pessoas morreram, incluindo nessa conta os bebês de duas vítimas que estavam grávidas. “Não é uma coincidência que as mineradoras que processamos no exterior sejam associadas ao Ibram”, afirmou.

Reação

A reação dos municípios que integram o Coridoce é assinada pelo legista e ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Eles criticam o Ibram por levantar a questão faltando quatro meses para as audiências marcadas pela cortes britânicas para julgar as responsabilidade da BHP Billiton e da Vale. Alegam se tratar de uma manobra para que municípios brasileiros afetados por tragédias não possam utilizar jurisdições estrangeiras para buscar medidas reparatórias para os danos causados.

O prefeito de São José do Goiabal (MG) e presidente do Coridoce, José Roberto Gariff Guimarães, afirmou em nota se tratar de uma movimentação para impedir que a justiça seja realizada e para retardar a reparação. “A atitude das mineradoras reflete suas ações nos últimos sete anos, ou seja, tentam de todas as maneiras se eximirem do transgressão por elas cometido”.

O Coridoce também considera que o Ibram não tem legitimidade para apresentar a ADPF. Dizem ainda que a entidade quer obrigar os municípios a concordarem com acordos reparatórios nos quais não são ouvidos. No Brasil, o processo reparatório gira em torno do Termo de Transação e Ajuste de Conduta (TTAC) – firmado entre as três mineradoras, a União e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. Com base nele, foi criada a Instauração Renova. Ela assumiu a gestão de mais de 40 programas, cabendo às mineradoras o custeio de todas as medidas.

Porém, passados mais de oito anos, a atuação da entidade é claro de diversos questionamentos judiciais e desde 2022 há uma tentativa de repactuação do processo reparatório, capaz de mostrar solução para mais de 85 milénio processos que tramitam sobre a tragédia. Os município novamente não participa das tratativas, que atualmente registram um impasse porque os valores propostos pelas mineradoras ainda não atenderam às expectativas da União e dos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo.

A movimentação do Ibram também foi criticada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). A entidade anunciou que entregou uma missiva ao STF solicitando audiência com o ministro Cristiano Zanin. “Não pode possuir incerteza de que o Ibram tenta se utilizar da ação para tutorar interesses puramente comerciais das mineradoras que cometeram no Brasil alguns dos maiores crimes ambientais da história, e buscam a qualquer dispêndio se esquivar do responsabilidade de reparação. Inclusive, a ação é assinada pelos advogados que representam a mineradora anglo-australiana BHP nas questões relacionadas à tragédia de Mariana”, diz o documento.

Fonte EBC

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