Depois de passar tapume de dois minutos descrevendo cada um dos nove pares de “sushis especiais” enquanto era filmado pela cliente, o garçom anunciou: “agora vem a secção mais instagramável”.
Ele abriu uma caixa que espalhou uma nuvem de gelo sequioso por cima das peças, criando uma bela cascata de fumaça. O vídeo deve ter ficado interessante, e logo deve ter feito sucesso nas redes sociais. E isso deve ter sido a única coisa boa de toda a repasto no famoso Oue Sushi, em São Paulo.
O restaurante de culinária japonesa costuma ser aclamado por influenciadores digitais, faz sucesso e já tem quatro endereços na cidade, mas oferece uma experiência sofrível.
Chamada de omakasseê, em referência ao menu em que o cliente se coloca nas mãos do chef, a repasto custa R$ 192 por pessoa e inclui dezenas de pequenos pratos para manducar à vontade. Mas zero ali é bom. A experiência lembra um rodízio de sushis dos mais medíocres, e tudo o que é servido oscila entre o minimamente tolerável, o sem perdão e até mesmo o incomível.
Apesar de ser descrito uma vez que uma degustação em sequência, a série de erros começa logo pelo serviço. Logo que a repasto é iniciada com uma pequena salada fria, chegam de uma vez à mesa 13 pratos diferentes em uma distribuição confusa de preparos frios e quentes. Para piorar, toda a mesa fica totalmente tomada pelo cheiro de óleo trufado, substância que figura em vários dos pratos.
Nesta primeira leva há um rolinho frito que diz ser de king crab, substância vasqueiro e custoso. A peça tem tamanho pesada e sem crocância, e o recheio mais parece uma mesocarpo de siri de baixa qualidade, desfiada e sem muito sabor. O menu segue com vieiras minúsculas servidas em um molho agridoce que faz o molusco desvanecer. O camarão empanado até chega crocante, mas é resguardado por um molho excessivamente gulodice e sem a picância prometida.
Um pretensioso “ovo perfeito” não tem nenhuma delicadeza e é subjugado pelo cheiro de trufa sintético. A robata de kobe com queijo e teriyaki até tem mesocarpo macia, mas o sabor do mancheia privativo nipónico passa longe. E o salmão com manteiga da Normandia é tão enjoativo que não foi comido totalmente.
A repasto prossegue com um passo ainda pior com os sushis especiais. A plataforma em dois andares desenhada para fotos de redes sociais labareda atenção pelo tom rosado de quase todas as peças. O salmão domina a cena formada por nove pares de baixíssima qualidade.
O peixe é servido em cortes finos, sem textura e sem sensação de frescor, e o arroz é absolutamente sem tempero e sabor. Quase todos recebem qualquer tipo de molho para encapotar os ingredientes duvidosos. O dyo tartufo é o pior exemplo: vem com salmão, gema de ovo de codorna e mais óleo trufado, e tem textura e sabor tão desagradáveis que chega a dar vontade de ir embora.
Mas a sequência prossegue com preparos mais tradicionais, uma vez que temakis à vontade, sushi de atum e sashimis. Mais uma vez, praticamente zero funciona. Os guiozas são mal feitos (o pronto no vapor é molenga, e o frito vem mergulhado em um molho que tira a textura crocante).
Os hossomakis não têm paladar, o niguiri de atum tem a finura de um dedo mindinho e nenhuma estrutura, enquanto as peças de peixe cru parecem recém-descongeladas e não têm consistência ou sabor.
Para completar, são servidas por cima de fatias de limão que acabam passando acidez e um ligeiro amargura. O único prato que chegou perto de ser bom foi o tempurá de legumes, que chegou quente e muito crocante.
Para finalizar a repasto, o Oue oferece ainda sobremesas zero japonesas: crème brûlée e pavlova não chegam a ser ruins, mas não passam de medíocres.
O cardápio parece não ter término em dezenas de opções para serem pedidas à vontade. A cada vez que passam pela mesa, os garçons perguntam se os clientes querem alguma coisa mais. Ao ouvir que não, e que a repasto já tinha muita comida, um deles respondeu: “esse é o nosso potente”. Pelo menos ele foi sincero.
Para não confundir a recusa com a baixa qualidade da comida japonesa do Oue com uma atitude esnobe, decidimos fazer um teste. Depois da repasto passamos em um supermercado de rede para confrontar o que havíamos comido com sushis que ficam horas nas gôndolas e são vendidos por tapume de R$ 30 por 500 g. E, se a experiência também não foi boa, pelo menos o arroz tinha qualquer sabor e já superava o do Oue.